Artigos
Família: direito de todos, sonho de muitos
Família: direito de todos, sonho de muitos[1].
Fernando Moreira Freitas da Silva*
Construir uma família, ter um porto seguro, viver um projeto de vida em comum, possuir um locus onde prevaleça o amor constitui o sonho de muitos, além de ser um direito conferido expressamente pela Constituição Federal[2]. Para alcançar tal objetivo, um dos caminhos a trilhar é a adoção: a união de duas ou mais histórias a partir do afeto, o verdadeiro vetor das relações familiares contemporâneas[3]. Nessa senda, o pretendente à adoção abre mão dos métodos naturais e artificiais de procriação para dar vez aos vínculos afetivos, que unem pais e filhos, à margem de qualquer discussão acerca da origem biológico-genética[4].
Ao se falar da adoção como um instituto jurídico capaz de promover o direito e o sonho de constituir uma família, é preciso ter em mente duas possibilidades: direito e sonho caminham no mesmo sentido ou em trajetórias diametralmente opostas. Quando direito e sonho caminham juntos, o resultado é inevitável: a plena realização. Entretanto, quando direito e sonho seguem em sentidos opostos à realidade, a sensação é de frustração.
Todos que trabalhamos com a adoção sabemos que, nessa delicada seara, há muitas frustrações. A principal delas, vivenciada por pretendentes, grupos de apoio, promotores de justiça, equipes técnicas e juízes, é a ausência de correspondência entre a realidade das crianças e dos adolescentes em abrigo e o perfil idealizado para a adoção.
Para se ter ideia dessa cruel realidade, verifica-se que existem 37.681 pretendentes habilitados para adotar no país, sendo que o número de crianças e adolescentes totaliza 4.775. Ocorre que, dentre aqueles aptos à adoção, 2.938 possuem idades iguais ou superiores a 13 anos, existindo, para elas, apenas 40 interessados no Cadastro Nacional de Adoção. Em uma análise mais pormenorizada desses 40 pretendentes, verificando caso a caso, constata-se que todos eles já adotaram ou não mais possuem interesse na adoção, concluindo-se, dessa forma, que a esmagadora maioria de crianças e adolescentes dos abrigos brasileiros não possuem qualquer perspectiva de adoção[5].
A quem se pode atribuir a responsabilidade por essas crianças institucionalizadas? Ora, é preciso falar de responsabilidade, assunto indigesto e doloroso para nós, que trabalhamos com adoção, mas não nos esqueçamos de que a “afetividade não está isenta de responsabilidades”[6] e que a dor da convivência, oriunda dos “desencontros entre as formas diferentes de interpretar as atitudes e ações alheias”[7], é necessária para repensarmos as nossas velhas práticas. Mais que buscar identificar os culpados e querer crucificá-los, objetivamos conhecer os responsáveis, suas práticas e envidar ações para inibir novas situações lesivas[8].
Poder-se-ia imputar a responsabilidade pelas crianças acolhidas aos pretendentes à adoção, tão rigorosos na seleção do perfil de seus filhos, permitindo que muitos deles cresçam dentro dos acolhimentos. Contudo, mesmo na situação da escolha do perfil, decisão de foro íntimo dos habilitantes, penso que a culpa não lhes pode ser atribuída.
É muito difícil para mim, porém preciso cortar na própria carne e reconhecer que a culpa maior é do próprio Poder Judiciário, órgão responsável por evitar condutas lesivas à criança e ao adolescente, porém, algumas vezes, desastrosamente, é a instituição que mais permite a sua revitimização.
Ao atribuir responsabilidade ao Judiciário quanto às crianças e aos adolescentes acolhidos, posso apontar, ao menos, as seguintes práticas, por nós realizadas, que merecem urgentes debates e reflexões, seja por desestimular os pretendentes à adoção, seja por burocratizar excessivamente o processo de adoção.
1. As crianças invisíveis
A primeira delas é o enclausuramento de nossas crianças. Elas estão trancadas na “Casa dos Meninos Invisíveis”[9], privadas da convivência familiar e comunitária, provavelmente com maior cerceamento de sua liberdade que aqueles que, com a mesma idade, praticaram atos infracionais graves.
No Brasil, há muitos juízes que vedam a visita da comunidade aos acolhimentos. Há situações ainda piores, quando os próprios habilitados são privados de conhecerem o acolhimento, sob o esdrúxulo pretexto de que o pretendente vai se apaixonar pelos bebês, impedindo a adoção de crianças de maior idade.
Em vez de explicar aos pretendentes que os bebês não estão, momentaneamente, disponíveis à adoção, tolhe-se o direito de adotandos e pretendentes se conhecerem, subtraindo-lhes as últimas chances de terem uma família.
Vejam que não precisamos de uma nova lei sobre o assunto, já que o Estatuto da Criança e do Adolescente, expressamente, consigna, em seu artigo 197-C, “Sempre que possível e recomendável, a etapa obrigatória da preparação referida no § 1° deste artigo incluirá o contato com crianças e adolescentes em regime de acolhimento familiar ou institucional em condições de serem adotados, a ser realizado sob a orientação, supervisão e avaliação da equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude, com o apoio dos técnicos responsáveis pelo programa de acolhimento familiar ou institucional e pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar”.
Quando não se veda a visitação, criam-se normas internas que acabam por cumprir a mesma finalidade. A título de exemplo, em data recente, recebi uma comunicação da Secretaria de Assistência Social do Município de Sidrolândia informando que foi alterado o horário de visitação, no acolhimento local, passando a ocorrer de segunda a sexta-feira, das 09h às 10h e das 15h às 16h, a pretexto de facilitar a logística da casa, valendo a regra também para pretendentes e padrinhos afetivos[10]. Ora, permitir visita apenas nos horários em que qualquer cidadão brasileiro trabalha é o mesmo que a proibir. Por certo, indeferi o pedido sumariamente.
Cabe enfatizar que louváveis são as iniciativas que não apenas autorizam as idas aos abrigos, como também as estimulam, citando-se, a título de exemplo, a exigência de visitação ao acolhimento como uma das etapas do próprio processo de habilitação à adoção.
Ainda merecem destaque as iniciativas do Tribunais de Justiça de Pernambuco[11] e do Espírito Santo[12], que, em inovadoras estratégias, promovem a chamada Busca Ativa, tentando sensibilizar os habilitados à adoção ou eventuais interessados na habilitação por meio da rede mundial de computadores, divulgando fotos e a história das crianças. Na mesma linha, porém com um acesso mais restrito, mediante o fornecimento de senha, tem-se o Projeto Quero uma Família, do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro[13], que disponibiliza as crianças aptas à adoção no Estado com consulta pelos habilitados.
2. Profissionais sem habilidade
Certamente, não é qualquer pessoa que está apta a trabalhar em uma Vara da Infância e da Juventude, pois se exige de juízes, servidores e equipe técnica um maior trato com o público, habilidade no impulso de processos, já que se trata de área sob absoluta prioridade, além de uma maior sensibilidade para fazer cumprir o princípio da intervenção precoce, que impõe às autoridades o dever de agir imediatamente, evitando maiores danos diante de uma situação de risco[14].
Infelizmente, é muito comum ver, na prática forense, equipes sem preencher quaisquer desses requisitos, comandando varas especializadas da infância país afora, cujas reclamações são denunciadas por grupos de apoio à adoção.
Para se ter uma ideia do que já presenciei nesses anos de magistratura, cito dois exemplos. O primeiro foi o caso de uma psicóloga, lotada em uma vara da infância, que desestimulava os pretendentes a adotarem adolescentes, sob o pretexto de que dariam mais trabalho. Em vez de motivá-los à adoção, com o devido e imprescindível acompanhamento psicológico na fase pós-adoção, simplesmente uma servidora do próprio Judiciário tolhia o direito de uma de nossas crianças ser adotada. Ainda, pode-se citar o caso da assistente social, que aconselhava casais homoafetivos a adotarem apenas crianças do sexo oposto ao seu. Por um pré-conceito, desconhecendo que o direito à livre orientação sexual e à identidade de gênero é um direito fundamental[15], outro grupo de crianças e adolescentes perdia a chance de ter uma família.
Além desses casos mencionados, nos quais se verifica que os profissionais sequer acreditam naquilo que fazem ou partem de falsos conceitos, influenciando negativamente na história de vida alheia, outra reclamação é recorrente entre os habilitantes à adoção – o mau atendimento em cartórios das varas da infância e da juventude. Muitos reclamam que se sentem como se o Judiciário estivesse lhes fazendo um favor. Essa é uma reclamação que se espraia por todos os setores do serviço público, e o Judiciário não foge à regra. Faltam bons líderes. Nós, sobretudo magistrados, somos preparados com o conhecimento técnico para o julgamento de processos, mas não para liderar. A equipe é reflexo de seus líderes, que devem conhecer muito bem os seus liderados para alcançar os objetivos pretendidos. E não basta apenas liderança, também é preciso motivação da equipe, ou seja, que façam com satisfação aquilo que precisa ser feito[16].
Para muitos, porém, falta apenas boa vontade. As crianças e os adolescentes acolhidos não são tratados com prioridade e acabam esquecidos nos acolhimentos. Afinal, “como não fazem rebelião, não queimam colchão, não têm voz. Ninguém atenta a eles”[17]. O CNJ, por sua vez, prioriza os processos de presos, aqueles que cometeram crimes, deixando de lado ações efetivas em prol dessas crianças e adolescentes, que são as vítimas. Tanto é verdade que não se vê mutirão em favor de crianças e adolescentes encarcerados nos abrigos brasileiros. Ademais, os tribunais não cumprem o disposto no Provimento 36/CNJ, que assegura a instalação de varas especializadas da infância e da juventude em cidades com mais de 100.000 habitantes, porém nenhuma providência concreta contra eles é tomada.
Para superar o estereótipo de que os pretendentes à adoção e as famílias adotivas não são bem-vindas no Poder Judiciário, ao menos em nossa área de atuação, decidimos implementar, na 2ª Vara de Sidrolândia, uma pequena festa em comemoração ao final de todas as audiências de adoção. Além disso, toda vez que entrar um padrinho afetivo ou um pretendente à adoção para se habilitar, os servidores do cartório judicial, rapidamente, pegam um violão, já estrategicamente posicionado, abrem um bolo, acendem uma vela de festa, pegam refrigerantes e sucos em uma geladeira devidamente montada para tal finalidade, cantando os parabéns. Trata-se de uma atitude adotiva apta a demonstrar que todos estamos comungando da mesma causa. Penso que não preciso falar da emoção das famílias e da minha equipe...
3. Cadastro Nacional de Adoção
O CNA-Cadastro Nacional de Adoção, desenvolvido pelo Conselho Nacional de Justiça, deveria consolidar os dados de todas as crianças, adolescentes e pretendentes disponíveis para adoção no país[18].
A ideia é fantástica, porém de pouca efetividade. Trata-se de um cadastro desatualizado em que, a cada consulta, aparecem os nomes de pretendentes que já adotaram ou que não mais possuem interesse na adoção. Essa atualização, que deveria ser o primeiro passo de todas as varas da infância para iniciar um dia de trabalho, parece um obstáculo intransponível.
Ademais, o sistema não realiza busca por aproximação de idades, o que torna a pesquisa por pretendentes manual e tediosa. Também não permite buscar crianças e adolescentes com o poder familiar suspenso, o que permitiria ao magistrado já deferir tutela de urgência para conceder a guarda provisória para fins de adoção aos habilitados.
Ainda, o CNA é trancado a sete chaves, sem qualquer participação dos pretendentes à adoção, seja para atuar na fiscalização das adoções, seja para permitir uma possível ampliação do seu próprio perfil, ao verificar o descompasso entre sonho e realidade.
Em reuniões do FONAJUP – Fórum Nacional da Justiça Protetiva, realizadas nos dias 25 e 26 de maio de 2017, na cidade do Rio de Janeiro, o Conselho Nacional de Justiça apresentou aos presentes uma proposta de modificação do cadastro[19], o que solucionaria tais problemas. Aguardemos os próximos passos!
4. Perda de oportunidades
Alguns Tribunais, novamente com o propósito de evitarem uma possível burla à fila do Cadastro Nacional de Adoção, não permitem que o padrinho afetivo adote uma criança, devendo fazer uma escolha prévia a qualquer contato com o infante.
A meu juízo, essa regra precisa existir para os bebês ou para aquelas crianças passíveis de serem adotadas, mas jamais para as adoções necessárias. Ora, a prática forense nos apresenta inúmeros exemplos de crianças e adolescentes adotados a partir do vínculo de afeto construído por meio do apadrinhamento afetivo.
Lamentavelmente, em situação análoga, o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente veda, expressamente, a adoção por família acolhedora, ao dispor que tais famílias serão selecionadas entre aquelas que não estejam no Cadastro Nacional de Adoção, conforme art. 34, §3º, do ECA[20]. A meu juízo, trata-se de uma norma-regra flagrantemente inconstitucional, pois contraria a norma-princípio da Prioridade Absoluta, prevista no art. 227 da CF[21]. Se há vínculo de afeto surgido durante a convivência familiar, no seio de uma família acolhedora, a adoção deve ser estimulada, e não repelida. Não é por outra razão que Maria Berenice Dias afirma, com absoluto acerto, que parece que “em matéria de adoção, é proibido amar”[22].
Retirar dos padrinhos afetivos e das famílias acolhedoras a possibilidade de uma adoção necessária é subtrair dessas crianças e desses adolescentes, que estão crescendo nos acolhimentos, uma das últimas chances de terem uma família, o que não podemos admitir.
5. Sucessivas fases e os entraves processuais
Sempre digo que, se algum magistrado não se interessar pela adoção e não quiser enfrentar os desafios da matéria, o campo processual é terreno fértil para mantê-lo em uma zona de conforto.
As etapas de preparação dos pretendentes à adoção, quando realizadas pelo próprio Judiciário, apresentam-se, muitas vezes, desanimadoras. Os cursos preparatórios são oferecidos com longas etapas, demasiadamente espaçadas, parecendo, aos olhos dos pretendentes, infindáveis. Em outros momentos, somente faltam construir uma “sessão de desistência”, desestimulando os pretendentes, ao invés de motivá-los. Aliás, essa é uma das reclamações que mais ouço dos habilitandos.
Curioso verificar que o Judiciário, que deveria ter interesse em providenciar o maior número de adoções possíveis, entregando famílias às nossas crianças acolhidas, sequer possui a iniciativa de fornecer aos pretendentes as certidões cíveis e criminais, exigidas pelo artigo 197-A do ECA, transferindo tal ônus aos habilitandos.
Além dos cursos longos e sem qualquer periodicidade, verifica-se uma carência de profissionais na equipe psicossocial dos fóruns. Aliás, muitas comarcas sequer possuem assistentes sociais e psicólogos na estrutura da vara, necessitando dos bons préstimos de servidores dos municípios, muitos sem qualquer especialidade em adoção. Já se pode imaginar o longo tempo passível de tramitar um processo de habilitação, mero procedimento de jurisdição voluntária.
No tocante à criança e ao adolescente, as etapas processuais parecem infinitas. O Ministério Público ajuíza uma medida de proteção, passando o juiz a determinar inúmeras tentativas de reinserção familiar. Diversos ofícios são expedidos para encaminhamento dos genitores a programas sociais, enquanto o tempo de acolhimento do infante transcorre. Mesmo sem qualquer perspectiva de reinserção, a formalidade é cumprida e a criança cresce no acolhimento.
Quando se percebe que a reinserção será inócua, passa-se à busca pela família extensa. Na maioria das vezes, sem observar que o Estatuto da Criança e do Adolescente conceitua família extensa como aquela com a qual a criança ou o adolescente possua vínculo de afinidade e afetividade (art. 25, parágrafo único, do ECA)[23], inicia-se uma desastrosa fase de busca por parentes que não possuem qualquer contato com a criança. Nessa linha, cartas precatórias são expedidas país afora na busca por tais familiares, tolhendo, ainda mais, a chance da adoção.
Na sequência, ao se verificar que a colocação na família extensa não se realizará, passa-se à fase do ajuizamento da ação de destituição do poder familiar. Novas citações são concretizadas, novos laudos produzidos, instrução processual desencadeada, recursos etc. O pior de tudo é realizar esse procedimento sem a análise da concessão de liminar para colocação da criança em família substituta para fins de adoção, em total inobservância ao disposto no artigo 101, §1º, ECA[24] e artigo 300 do CPC[25]. Em nome da segurança jurídica, na espera do trânsito em julgado da sentença, aguarda-se um longo processo de destituição do poder familiar, mantendo-se as crianças e os adolescentes enclausurados nos acolhimentos.
O que justifica a prática forense admitir, por um lado, com muita naturalidade, a concessão liminar de guarda provisória, nos processos de guarda, e, por outro lado, negar ou fazer vistas grossas à guarda provisória para fins de adoção, no curso do processo de destituição do poder familiar? A meu juízo, a única resposta é a ausência de prioridade absoluta em relação às crianças acolhidas.
6. Pós-adoção
Ao finalizar um processo de adoção, com a entrega da sentença, o Judiciário deixa de acompanhar o caso. Aqui está uma de nossas maiores falhas: a fase pós-adoção. A ausência do desenvolvimento dessa fase, com um correto acompanhamento psicológico, é responsável pelas inúmeras adoções malsucedidas e pela devolução das crianças e dos adolescentes.
Poder-se-ia afirmar que tal fase não mais compete ao Judiciário, sendo responsabilidade dos adotantes e dos grupos de apoio à adoção? Será mesmo? Em uma país onde os serviços públicos de assistência social não funcionam com a qualidade necessária, entendo que o Poder Judiciário não pode deixar a nova família à própria sorte, sem fiscalizar o cumprimento dessa importante fase, quer pela família, quer pelo Executivo.
Nesse sentido, tenho muita dificuldade em aceitar a tese de responsabilidade civil da família adotante pela devolução da criança e do adolescente, após proferida a sentença de adoção, quando os próprios poderes constituídos não oferecem o devido apoio à fase de adaptação da criança no seio da nova família. Punir sem oferecer prévia assistência parece-me um claro exemplo de violação ao Princípio Venire contra factum proprium non potest.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao fim e ao cabo, concluo que as nossas crianças crescem nos acolhimentos e que muito pouco se tem feito para mudar essa desoladora realidade.
Precisamos rever as nossas antigas práticas; dar visibilidade às crianças institucionalizadas; tratar com humanidade crianças e adolescentes acolhidos, bem como pretendentes à adoção, padrinhos e famílias acolhedoras, sobretudo no ambiente frio do fórum; alterar, com urgência, o Cadastro Nacional de Adoção, tornando-o mais efetivo; defender a inconstitucionalidade de dispositivos do ECA que representam retrocesso aos direitos já conquistados; desburocratizar o processo de habilitação e de destituição do poder familiar; voltar os olhos para a fase de pós-adoção.
Enfim, é preciso que nós, membros do Poder Judiciário, tenhamos uma postura proativa, fazendo cumprir o Princípio Constitucional da Absoluta Prioridade das Crianças e dos Adolescentes em situação de acolhimento institucional.
Conforme nos adverte Giselda Hironaka, “cerrar os olhos, talvez seja mais um dos inúmeros momentos de hipocrisia que a sociedade, o Legislativo e o Judiciário têm deixados, às vezes, acontecer, numa era em que já não mais se coaduna com as histórias guardadas a sete chaves”[26].
Tirar as vendas da Justiça talvez seja o primeiro passo para mudarmos essa cruel realidade, garantindo a milhares de crianças e de adolescentes abrigados o direito e o sonho de terem uma família.
BIBLIOGRAFIA
BITENCOURT, Sávio. Nino e a Casa dos Meninos Invisíveis. Rio de Janeiro: SRB Estudos, 2014.
CALDERÓN, Ricardo Lucas. Princípio da afetividade no Direito de Família. Rio de Janeiro: Renovar, 2013.
DIAS, Maria Berenice. Filhos do afeto. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.
____. Homoafetividade e os direitos LGBTI. 6ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.
FIGUEIREDO, Luiza Sá de. Gestão em Poder Judiciário: administração pública e gestão de pessoas. Curitiba: CRV, 2014.
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. O conceito de família e sua organização jurídica. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). Tratado de Direito das Famílias. Belo Horizonte: IBDFAM, 2015.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores do Direito de Família. 3ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE; Paulo Eduardo; CUNHA, Rogério Sanches. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado artigo por artigo. 8ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
SCHETTINI FILHO, Luiz. Pedagogia da convivência: prática das relações interpessoais. Curitiba: Juruá, 2015.
SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2013.
[1] Palestra proferida na abertura do XXII ENAPA - Encontro Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção, no Auditório da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará.
* Juiz de Direito do Estado de Mato Grosso do Sul. Professor de Direito da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB/MS) e da Escola Superior da Magistratura de Mato Grosso do Sul (ESMAGIS/MS). Mestre em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Especialista em Controle de Constitucionalidade e Direitos Fundamentais (PUC/RJ), Direito Empresarial (UFMT) e Gestão Pública (UNIC/MT). Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).
[2] Art. 226, CF: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”.
[3] CALDERÓN, Ricardo Lucas. Princípio da afetividade no Direito de Família. Rio de Janeiro: Renovar, 2013, p. 226.
[4] DIAS, Maria Berenice. Filhos do afeto. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 45.
[5] Disponível em:
[6] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios fundamentais norteadores do Direito de Família. 3ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 226.
[7] SCHETTINI FILHO, Luiz. Pedagogia da convivência: prática das relações interpessoais. Curitiba: Juruá, 2015, p. 13.
[8] SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2013, p. 229.
[9] BITENCOURT, Sávio. Nino e a Casa dos Meninos Invisíveis. Rio de Janeiro: SRB Estudos, 2014, p. 18.
[10] Ofício nº 262/2017/SEAS, de 23 de maio de 2017.
[11] Projeto Família: Um direito de toda criança e adolescente. Disponível em:
[12] Campanha Esperando por Você. Disponível em:
[13] Projeto Quero uma Família. Disponível em
[14] ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE; Paulo Eduardo; CUNHA, Rogério Sanches. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado artigo por artigo. 8ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 69.
[15] DIAS, Maria Berenice. Homoafetividade e os direitos LGBTI. 6ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 170.
[16] FIGUEIREDO, Luiza Sá de. Gestão em Poder Judiciário: administração pública e gestão de pessoas. Curitiba: CRV, 2014, p. 151-159.
[17] DIAS, Maria Berenice. Filhos do afeto. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 116.
[18] Disponível em:
[19] Disponível em:
[20] Art. 34, §3º, ECA. A União apoiará a implementação de serviços de acolhimento em família acolhedora como política pública, os quais deverão dispor de equipe que organize o acolhimento temporário de crianças e de adolescentes em residências de famílias selecionadas, capacitadas e acompanhadas que não estejam no cadastro de adoção.
[21] Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
[22] DIAS, Maria Berenice. Filhos do afeto. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, p. 112.
[23] Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou o adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade.
[24] Art. 101, § 1º, ECA. O acolhimento institucional e o acolhimento familiar são medidas provisórias e excepcionais, utilizáveis como forma de transição para reintegração familiar ou, não sendo esta possível, para colocação em família substituta, não implicando privação de liberdade.
[25] Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
[26] HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. O conceito de família e sua organização jurídica. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). Tratado de Direito das Famílias. Belo Horizonte: IBDFAM, 2015, p. 92.
Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM