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Previdência Privada não é Partilhável em Caso de Dissolução de União Estável
Sob este título o site do STJ, hoje, 21/06/2017, traz estampada uma decisão na qual o instituto da Previdência Privada é destacado como uma das exceções da comunicação do regime de bens em sede de comunhão parcial em caso de dissolução de União Estável.
A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tomada em julgamento de recurso especial interposto contra acórdão que negou a ex-companheira a partilha de montante investido em previdência privada fechada pelo ex-companheiro.
Em que pese à notícia do Superior Tribunal de Justiça enfatizar que o caso em comento se trata de previdência privada fechada, impende ressaltar que o mesmo entendimento se aplica também ao benefício oriundo de previdência privada aberta, ou seja, ambos os casos devem ser incluídos no rol das exceções do artigo 1.659, VII, do Código Civil de 2002 e, portanto, ser excluídos da partilha em virtude da dissolução de união estável, que observa, em regra, o regime da comunhão parcial dos bens.
Consabido, é de se considerar como sendo planos de previdência privada aberta, aqueles que são comercializados por bancos e seguradoras, e podem ser adquiridos por qualquer pessoa física ou jurídica. O órgão do governo que fiscaliza e dita as regras dos planos de previdência privada é a SUSEP- (Superintendência de Seguros Privados).
Já os planos de previdência fechada, também conhecida como fundos de pensão, são planos criados por empresas e voltados exclusivamente aos seus funcionários, não podendo ser comercializados para quem não é funcionário daquela empresa. A Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC) é uma autarquia vinculada ao Ministério da Previdência Social, responsável por fiscalizar as atividades das entidades fechadas de previdência complementar.
No caso em tela, de acordo com as alegações da recorrente, a previdência privada é um contrato optativo e de investimento futuro, sendo uma das formas de acumulação de patrimônio. Por isso, segundo ela (recorrente), não haveria impedimento de resgate do dinheiro a qualquer momento pelo contratante, até mesmo em razão da natureza de ativo financeiro.
O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, não acolheu os argumentos. Para ele, a verba destinada à previdência privada fechada faz parte do rol de rendas excluídas da comunhão de bens previsto no artigo 1.659, VII, do CC/02, diz o sobredito site.
De acordo com o dispositivo, excluem-se da comunhão as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes. Para o ministro, a previdência privada fechada se enquadra no conceito de renda semelhante por tratar-se de uma espécie de pecúlio, bem personalíssimo.
Neste sentido, também é o entendimento da professora Maria Helena Diniz, que ao comentar o inciso VII do artigo 1.659 do CC/02, concluiu: “Assim, se alguém, sendo beneficiário de montepio, vier a casar-se, essa vantagem pecuniária não se comunicará ao seu cônjuge, por ser uma renda pessoal.”[1]
In casu, o relator salientou ainda que o benefício não poderia ter sido desfrutado no interregno da relação, considerando que o requerido nem sequer estava aposentado durante a relação.
O ministro destacou também a importância do equilíbrio financeiro e atuarial do plano de previdência, pois admitir a possibilidade de resgate antecipado de renda capitalizada, em desfavor de uma massa de participantes e beneficiários de um fundo, significaria lesionar terceiros de boa-fé que assinaram previamente o contrato sem tal previsão.
Explicou que “tal verba não pode ser levantada ou resgatada ao bel prazer do participante, que deve perder o vínculo empregatício com a patrocinadora ou completar os requisitos para tanto, sob pena de violação de normas previdenciárias e estatutárias”.
Villas Bôas Cueva consignou ainda que, caso o regime de casamento fosse acrescentado ao cálculo, haveria um desequilíbrio do sistema como um todo, “criando a exigência de que os regulamentos e estatutos das entidades previdenciárias passassem a considerar o regime de bens de união estável ou casamento dos participantes no cálculo atuarial, o que não faz o menor sentido por não se estar tratando de uma verba tipicamente trabalhista, mas, sim, de pensão, cuja natureza é distinta”.
Todavia, de forma totalmente diversa, é o pensamento da ilustre doutrinadora Maria Berenice Dias, ao comentar a parte excludente da comunhão de bens: “Absolutamente desarrazoado excluir da universalidade dos bens comuns os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge (art. 1.659, Inciso VI do CC/02) e rendas semelhantes (art. 1.659, Inciso VII do CC/02). Injusto que o cônjuge que trabalha por contraprestação pecuniária, mas não converte suas economias em patrimônio, seja privilegiado e suas reservas consideradas crédito pessoal e incomunicável.”[2]
No nosso juízo, é que tanto no contrato de seguro de vida, quanto na previdência privada, no caso morte, denominado pecúlio, o terceiro na condição que tiver com o segurador ou o participante, não tem qualquer direito sobre o valor aportado para esta modalidade contratual.
É por isto que o inciso VII do artigo 1659 do Código Civil excepciona da comunhão “montepios e outras rendas semelhantes”, assim como determina sua impenhorabilidade nos incisos IV e VI do artigo 833 do Código de Processo Civil.
Ambos têm a mesma natureza jurídica, pecúlio e seguro de vida. Os pagamentos são realizados aos beneficiários designados tanto pelo participante no caso da previdência privada como pelo segurado na hipótese de seguro de vida.
A diferença existe quando na previdência privada se fala em renda, que é aquele valor pago ao beneficiário mensalmente, se constituindo uma obrigação de trato sucessivo. Neste caso, o benefício legado ao terceiro embora também não entre no rol sucessório sua natureza jurídica difere do pecúlio e do seguro de vida.
Estas são ligeiras considerações ao azo do tema ventilado na decisão acima comentada.
Brasília-DF, 21 de julho de 2017.
Voltaire Marensi.
Advogado e Professor.
César Peixoto
Advogado
[1] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, 22. Ed. Saraiva, v. 5, p.165/166, 2007.
[2] DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 11 edição, revista, atualizada e ampliada, Revista dos Tribunais, p. 317, 2016.
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