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Direito de Família em alta
Embora o Direito de Família sempre tenha feito parte do nosso ordenamento jurídico, podemos dizer que, somente agora, com as mudanças ocorridas no âmbito da família, ele vem adquirindo prestígio. Não raramente os operadores do direito que militavam nesta área eram tratados com certo desprezo por parte dos seus colegas.
No Brasil, até bem pouco tempo, Direito de Família era o complexo das normas que regulavam a celebração do casamento, sua validade e os efeitos dele resultantes; as relações pessoais e econômicas da sociedade conjugal, assim como a dissolução desta; as relações entre pais e filhos; o vínculo do parentesco; e os institutos complementares da tutela e da curatela.
Ocorre que o modelo de família entrou em mutação vertiginosa a partir da década de 60. E, de lá para cá, as sociedades mudaram de forma surpreendente. Milênios de tradição, usos e costumes, assistem à queda do tabu da virgindade, à amizade colorida, à produção independente de filho, ao casamento aberto, à inseminação artificial, à popularização dos exames de DNA para a comprovação da paternidade, dentre outras transmutações de paradigmas no comportamento da sociedade.
A inexistência do divórcio até final de dezembro de 1977, por exemplo, obrigava os egressos de um casamento falido a buscar nova oportunidade de serem felizes numa convivência meramente de fato.
Considerando que as leis consagram as práticas sociais, ao longo dos anos diversas modificações no âmbito da família foram sendo introduzidas por leis esparsas, citando-se entre outras, a possibilidade de reconhecimento dos filhos adulterinos (Lei n° 883/49); a alteração do instituto da adoção (Lei n° 3.135/57); o Estatuto da Mulher Casada (Lei n° 4.121/62); a Lei Especial de Alimentos (n° 5.478/68) e Lei do Divórcio (Lei n° 6.515/77).
Porém, foi com o advento da promulgação da Constituição Federal de 1988, que houve uma profunda alteração nos conceitos de família e na própria realidade social. A regulamentação do § 3° do art. 226 - que reconhece a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar - feita por intermédio da Lei n° 8.971/94 e, posteriormente, da Lei n° 9.278/96, estendeu o conceito de família à união estável protegendo-a sob o manto legal. Assim, foram introduzidas algumas outras modificações no Direito de Família: a equiparação dos cônjuges, a não-discriminação entre filhos e o regime da comunhão parcial de bens. A estas leis somaram-se o Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990 (Lei n° 8.009) e a lei de investigação de paternidade em 1992 (Lei n° 8.560).
Foi sendo criado, portanto, um arcabouço jurídico peculiar ao Direito de Família, originando e sugerindo uma especialização por parte dos operadores do direito que nele desejam militar. Concomitantemente, surge o IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família, coroando o esforço de reconhecimento que há muito lhe vinha sendo negado.
Tal situação poderia estar melhor, não fosse o fato do novo Código Civil de 2002, se originar de um anteprojeto encaminhado ao Congresso em junho de 1975, por iniciativa do então presidente Ernesto Geisel e refletindo a sociedade daquela época. O moroso processo legislativo fez com que seu texto esteja superado em face da Constituição de 1988, em virtude da doutrina e pela jurisprudência dos nossos Tribunais, de forma irreversível. A resultante é uma diferença abissal entre o Brasil real e o Brasil legal.
Contudo, alguns avanços podem ser registrados, tais como: a igualdade de direitos entre homem e mulher; a nova abrangência do conceito de família; a igualdade dos filhos; o reconhecimento da união estável e do concubinato; a paternidade/maternidade socioafetiva; questões referentes à meação e alimentos; direito do cônjuge em matéria sucessória; limitação ao parentesco colateral e simplificação do testamento.
Outras mudanças não podem ser consideradas avançadas num primeiro momento, como a redução da maioridade, que passou a ensejar inúmeros pedidos de exoneração de pensões por parte dos genitores que não detêm a guarda dos filhos, além de abrir o perigoso debate de nova redução na área penal. As alterações no regime de bens e aqüestos carecem de tempo para melhor compreensão e aceitação por parte da nossa sociedade.
Também nos países do chamado primeiro mundo o Direito de Família vem sofrendo no presente momento diversas e profundas atualizações, notadamente na Europa e nos Estados Unidos. Observando-se as transformações lá ocorridas, podemos crer que muito brevemente estaremos tendo que discutir outros aspectos do Direito de Família não abordados pelo nosso Código Civil, tais como: a união civil entre homossexuais, a fecundação in vitro, a inseminação artificial, dentre outros.
O Direito de Família tem contado com a colaboração de outras áreas do conhecimento, como a Psicanálise, Sociologia e Psicologia, a fim de repensar algumas questões relacionadas à família, que começam a ser discutidas no mundo jurídico.
Assim, caminha o Direito de Família para o seu definitivo reconhecimento como importante ramo do direito, isento do preconceito e do menosprezo de tempos passados.
Fonte: A Tarde de 02/01/2004 - Coluna Judiciárias
(*) Advogado/OAB – Ba 16.684
sergio.bc@uol.com.br
No Brasil, até bem pouco tempo, Direito de Família era o complexo das normas que regulavam a celebração do casamento, sua validade e os efeitos dele resultantes; as relações pessoais e econômicas da sociedade conjugal, assim como a dissolução desta; as relações entre pais e filhos; o vínculo do parentesco; e os institutos complementares da tutela e da curatela.
Ocorre que o modelo de família entrou em mutação vertiginosa a partir da década de 60. E, de lá para cá, as sociedades mudaram de forma surpreendente. Milênios de tradição, usos e costumes, assistem à queda do tabu da virgindade, à amizade colorida, à produção independente de filho, ao casamento aberto, à inseminação artificial, à popularização dos exames de DNA para a comprovação da paternidade, dentre outras transmutações de paradigmas no comportamento da sociedade.
A inexistência do divórcio até final de dezembro de 1977, por exemplo, obrigava os egressos de um casamento falido a buscar nova oportunidade de serem felizes numa convivência meramente de fato.
Considerando que as leis consagram as práticas sociais, ao longo dos anos diversas modificações no âmbito da família foram sendo introduzidas por leis esparsas, citando-se entre outras, a possibilidade de reconhecimento dos filhos adulterinos (Lei n° 883/49); a alteração do instituto da adoção (Lei n° 3.135/57); o Estatuto da Mulher Casada (Lei n° 4.121/62); a Lei Especial de Alimentos (n° 5.478/68) e Lei do Divórcio (Lei n° 6.515/77).
Porém, foi com o advento da promulgação da Constituição Federal de 1988, que houve uma profunda alteração nos conceitos de família e na própria realidade social. A regulamentação do § 3° do art. 226 - que reconhece a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar - feita por intermédio da Lei n° 8.971/94 e, posteriormente, da Lei n° 9.278/96, estendeu o conceito de família à união estável protegendo-a sob o manto legal. Assim, foram introduzidas algumas outras modificações no Direito de Família: a equiparação dos cônjuges, a não-discriminação entre filhos e o regime da comunhão parcial de bens. A estas leis somaram-se o Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990 (Lei n° 8.009) e a lei de investigação de paternidade em 1992 (Lei n° 8.560).
Foi sendo criado, portanto, um arcabouço jurídico peculiar ao Direito de Família, originando e sugerindo uma especialização por parte dos operadores do direito que nele desejam militar. Concomitantemente, surge o IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família, coroando o esforço de reconhecimento que há muito lhe vinha sendo negado.
Tal situação poderia estar melhor, não fosse o fato do novo Código Civil de 2002, se originar de um anteprojeto encaminhado ao Congresso em junho de 1975, por iniciativa do então presidente Ernesto Geisel e refletindo a sociedade daquela época. O moroso processo legislativo fez com que seu texto esteja superado em face da Constituição de 1988, em virtude da doutrina e pela jurisprudência dos nossos Tribunais, de forma irreversível. A resultante é uma diferença abissal entre o Brasil real e o Brasil legal.
Contudo, alguns avanços podem ser registrados, tais como: a igualdade de direitos entre homem e mulher; a nova abrangência do conceito de família; a igualdade dos filhos; o reconhecimento da união estável e do concubinato; a paternidade/maternidade socioafetiva; questões referentes à meação e alimentos; direito do cônjuge em matéria sucessória; limitação ao parentesco colateral e simplificação do testamento.
Outras mudanças não podem ser consideradas avançadas num primeiro momento, como a redução da maioridade, que passou a ensejar inúmeros pedidos de exoneração de pensões por parte dos genitores que não detêm a guarda dos filhos, além de abrir o perigoso debate de nova redução na área penal. As alterações no regime de bens e aqüestos carecem de tempo para melhor compreensão e aceitação por parte da nossa sociedade.
Também nos países do chamado primeiro mundo o Direito de Família vem sofrendo no presente momento diversas e profundas atualizações, notadamente na Europa e nos Estados Unidos. Observando-se as transformações lá ocorridas, podemos crer que muito brevemente estaremos tendo que discutir outros aspectos do Direito de Família não abordados pelo nosso Código Civil, tais como: a união civil entre homossexuais, a fecundação in vitro, a inseminação artificial, dentre outros.
O Direito de Família tem contado com a colaboração de outras áreas do conhecimento, como a Psicanálise, Sociologia e Psicologia, a fim de repensar algumas questões relacionadas à família, que começam a ser discutidas no mundo jurídico.
Assim, caminha o Direito de Família para o seu definitivo reconhecimento como importante ramo do direito, isento do preconceito e do menosprezo de tempos passados.
Fonte: A Tarde de 02/01/2004 - Coluna Judiciárias
(*) Advogado/OAB – Ba 16.684
sergio.bc@uol.com.br
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