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Aspectos destacados na guarda compartilhada
É costumeiro afirmar que, com a separação do casal, a família não se dissolve, se transforma. São muitas as mudanças nos ciclos de vida familiares. Desde a regulamentação do divórcio no Brasil em 1977, a separação conjugal ficou cada vez mais como um fato presumido nas famílias. Quando não há possibilidade de reconciliação entre o casal, mesmo que tenham filhos, não existe mais aquela necessidade de permanecerem casados, como anteriormente.
Segundo alguns especialistas, um dos motivos que desencadeiam distúrbios emocionais nos filhos é a convivência num lar em conflito permanente. Desta forma, entende-se que a separação conjugal deveria representar uma possível solução, mas infelizmente muitos casais encontram sérias dificuldades na reorganização desse sistema, inclusive na divisão de responsabilidades. Assim, o casal decide procurar um profissional que ajuizará ação competente, prosseguindo o feito até sentença judicial ou homologação de acordo que estabelecerá quem ficará com a guarda dos filhos, visitas, pagamento de alimentos e partilha dos bens.
A questão é que guarda e o direito de visitas existe em função dos menores, com o objetivo de manter contato entre os filhos e os pais após a separação, contribuindo com a "homeostase" emocional dos envolvidos.
Regulamentação de Visitas: um direito da criança
A lei confere ao genitor que não possui a guarda, o direito de visitas, que constitui o direito de personalidade do filho de ser visitado não só pelos pais, como qualquer pessoa que por ele tenha afeto. Cabe salientar que o direito de visitas é extensivo aos avós, sendo muito comum requerer a regulamentação da visita mesmo em procedimento judicial consensual. Afinal, um dos objetivos da visita é o de fortalecer os laços de amizade entre pais, filhos e familiares, já enfraquecidos pelo processo de separação.
Vantagens e Desvantagens da Guarda Compartilhada
A guarda sempre se revelou um ponto delicadíssimo no direito de família, pois dela depende diretamente o futuro do menor. A guarda única ou exclusiva, aquela conferida a um só dos genitores, passou a ser insuficiente para atender as necessidades e interesses dos pais e principalmente dos filhos. Com as mudanças cada vez mais aceleradas na estrutura familiar, procuram-se novas modalidades de guarda capazes de assegurar aos pais uma repartição eqüitativa da autoridade parental, bem como aos filhos, que serve para amenizar os efeitos desastrosos na maioria das separações.
Historicamente, a guarda compartilhada teve sua origem na Inglaterra, na década de 60, onde ocorreu a primeira decisão favorável. Estendeu-se a França e ao Canadá, chegando mais tarde ao Brasil e Estados Unidos. A guarda pode ser definida como o conjunto de deveres que os pais têm em relação à pessoa e aos bens dos filhos. O direito de guarda é antes de tudo um dever de assistência material e moral, devendo sempre ser levado em consideração o interesse do menor. Portanto, não se recomenda a pessoas inidôneas, imaturas ou portadoras de qualquer deficiência de natureza psíquica ou comportamental, podendo ser modificada a qualquer momento.
Foram a partir dessas mudanças nos ciclos de vida familiares, como o surgimento de famílias mono parentais, que o compartilhamento da guarda passou a ser questionado.
Importante destacar a diferença entre guarda alternada e guarda compartilhada ou conjunta. A primeira tem como requisito básico a alternância de residência dos pais, por certos períodos. A segunda baseia-se na residência fixa para o menor, partilham-se somente os direitos e deveres entre os pais.
A guarda compartilhada ou conjunta é um dos meios de exercício da autoridade parental aos pais que desejam continuar a relação com os filhos quando ocorre a fragmentação da família. A justificativa para a adoção desse sistema está na própria realidade social e jurídica, que reforça a necessidade de garantir o melhor interesse da criança e a igualdade entre homens e mulheres na responsabilização dos filhos. A continuidade do convívio da criança com ambos os pais é indispensável para seu desenvolvimento emocional de forma saudável.
No entanto, esta modalidade refere-se a um tipo de guarda onde os pais dividem a responsabilidade legal sobre os filhos, ao mesmo tempo em que compartilham suas obrigações pelas decisões importantes relativas à criança. Desta forma, evita a sobrecarga dos pais e minimiza o conseqüente impacto da ansiedade e do estresse sobre os filhos. Conclui-se que um dos pais pode manter a guarda material ou física do filho, porém ambos possuem os mesmos direitos e deveres para com o menor.
A Guarda compartilhada ou conjunta privilegia a continuidade na relação da criança com seus genitores após a separação destes e ao mesmo tempo mantém ambos responsáveis pelos cuidados cotidianos relativos à educação e à criação do menor. A guarda compartilhada não está prevista nas normas que regem o direito de família, mas tem o apoio constitucional, por força do que prevê o art. 226, § 5º e § 7º da CF/88, ao estabelecer que os direitos e deveres referentes a sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher, além do estabelecido nos princípios da dignidade da pessoa humana.
Também tem o apoio no Estatuto da Criança e do Adolescente e das disposições do novo Código civil no capítulo XI, que trata da proteção da pessoa dos filhos, especificamente no art. 1584, que concede a guarda dos filhos ao cônjuge que tiver melhores condições de exercê-la. Na realidade o maior interesse dos filhos está em conviver o máximo possível com ambos os pais, salvo exceções. Enfim, resta claro que o poder da guarda para a mãe, uma questão cultural, já não mais prevalece. A nítida preferência reconhecida à mãe para a guarda, já vinha sendo criticada como abusiva e contrária a igualdade, como supramencionamos no direito constitucional. No código de 1916, foi criado para acomodar as necessidades de uma sociedade quando a profissão da mulher era do lar, o que já não condiz com a nossa realidade, já que a mulher se tornou independente.
Sem dúvida alguma não se pode deixar de ressaltar que o modelo de guarda compartilhada não deve ser imposto como solução para todos os casos, havendo situações em que o modelo é inadequado e até mesmo contra-indicado, como no exemplo da tenra idade dos filhos. Na prática da guarda compartilhada, obriga a permanência dos pais na mesma cidade, o diálogo entre o casal, e demais fatores específicos da cada caso. Desta forma somente é cabível a guarda compartilhada quando a separação é consensual, haja vista, que na separação litigiosa não há acordo, não há sociedade, então não há o que compartilhar amigavelmente.
As vantagens da guarda compartilhada são maiores que as desvantagens, basicamente em função de uma melhora na auto-estima do filho, melhora no rendimento escolar (enquanto que na guarda mono parental decai), diminuição do sentimento de tristeza, frustração, rejeição e do medo de abandono, já que permite o acesso sem dificuldade a ambos os pais. Também ajuda na inserção da nova vida familiar de cada um dos genitores, além de ter uma convivência igualitária.
Não são muitas as desvantagens neste tipo de guarda. Cabe lembrar que, através de informações fornecidas por psicólogas da teoria sistêmica, puderam constatar em seus consultórios no atendimento dos filhos (crianças e adolescentes) que o maior sintoma é a falta dos pais, o medo do abandono, as conseqüências de uma separação seja consensual ou litigiosa. Na guarda compartilhada o filho não perde o vínculo com os pais, permanecendo certo tempo com o pai e outro período com a mãe.
Um triste exemplo e ao mesmo tempo muito comum de ocorrer é o pai pensar que se não é o guardião, deve manter-se distante da educação do filho, pois considera que a justiça dá plenos poderes a guardiã que detém a guarda. Alguns desses pais acabam por afastar-se de seus filhos provocando, sem dúvida alguma, sentimentos de angústia desnecessários. São os filhos quem acabam por pagar o maior tributo por tais comportamentos, visto que sofrem por viver em meio ao fogo cruzado de seus pais e podem apresentar sérios sintomas, como dificuldades afetivas, sociais e de aprendizado.
Hodiernamente, a possibilidade jurídica da guarda compartilhada como mencionamos, leva em consideração as vantagens tanto para os genitores quanto aos filhos, restando aos operadores do direito ter a consciência do melhor interesse do menor. O promotor de justiça deve favorecer esta modalidade e o magistrado conceder a guarda compartilhada, salvo exceção.
Filhos precisam igualmente do pai e da mãe. É necessário que um permita o direito de existência do outro na vida de seus filhos. A separação conjugal não pode se estender à ruptura parental, pois a criança precisa de ambos para ter um bom desenvolvimento cognitivo, psíquico e emocional. A guarda conjunta é o caminho possível para assegurar aos filhos de pais separados a presença contínua em harmonia de ambos os genitores.
Referências bibliográficas:
1. NEGRÃO, Theotonio. Código Civil Comentado. 22ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.
2. RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, Vol. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
3. SALLES, Karen Ribeiro Pacheco Nioac. Guarda Compartilhada. ed. Lumen Juris.
4. OLIVEIRA, J. M. Leoni Lopes. Guarda, Tutela e Adoção. 5º ed. Lumen Juris.
Raquel Alcântara de Alencar é advogada atuante no direito de família, mediadora familiar, finalizando especialização em Terapia de Casais e Família e em direito civil.
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