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Separação e divórcio no novo Código Civil
1. Introdução.
A separação judicial e o divórcio não sofreram grandes alterações com o advento do novo Código Civil. Inicialmente porque foram preservadas tanto a separação quanto o divórcio como modalidades de dissolução da sociedade conjugal, quando nos parece que a separação deveria ter sido banida .
2. Separação.
Com efeito, prevalecem a separação (i) litigiosa como se conhecia anteriormente, na sua modalidade culposa, baseada na conduta desonrosa ou na grave violação aos deveres matrimoniais por um dos cônjuges, que torne insuportável a vida em comum, e nas modalidades remédio, estribada na grave doença mental que tenha acometido um dos cônjuges, ou falência, em vista da ruptura da vida em comum combinada com a impossibilidade da sua reconstituição, além da (ii) consensual, por mútuo consentimento entre os cônjuges.
De novidade, na separação litigiosa, temos a redução do prazo de duração da doença mental que tiver acometido um dos cônjuges, na hipótese de separação fundada nesta causa objetiva, de 5 (cinco) na Lei do Divórcio, para 2 (dois) anos no novo Código Civil, bem como a extirpação da criticada cláusula de dureza, que se achava prevista no art. 6.º da Lei do Divórcio e não foi repetida, de tal sorte que o julgador não mais poderá recusar a homologação da separação judicial alegando a possibilidade agravar ainda mais a situação do enfermo. E na separação consensual a redução do prazo mínimo de vigência do casamento, que anteriormente só poderia ser dissolvido pela separação consensual após 2 (dois) anos de vigência, enquanto que a teor do art. 1574, caput, do novo Código, pode ser dissolvido após 1 (um) ano.
Agora, a mais significativa inovação na quadra da separação foi sem dúvida a possibilidade da mesma ser requerida sem a invocação de uma causa jurídica (culposa ou objetiva).
De fato, o art. 1573, parágrafo único, ao dispor que “o juiz poderá considerar outros fatos, que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum”, passou a contemplar uma nova modalidade de separação no direito brasileiro, calcada na própria impossibilidade da manutenção da vida em comum, independente de qualquer causa, culposa ou objetiva, de tal sorte que um determinado cônjuge, para se separar, não precisa mais invocar uma causa, como por exemplo a grave violação dos deveres matrimoniais por parte do outro cônjuge, ou mesmo a grave doença mental, bastando simplesmente que alegue o seu desejo de não mais manter o laço matrimonial pelo fim da afeição conjugal, ou mesmo a tão comentada “incompatibilidade de gênios”.
Ressalta-se que a inovação, digna de aplausos e elogios, se não foi involuntária ou acidental, resultando de falha de redação do parágrafo único do art. 1573, por certo que foi inserida no sistema de modo quase que subliminar, porque o normativo em questão é passível de interpretação divergente, de tal modo a não permitir a incoação da separação judicial sem causa jurídica (culposa ou objetiva) mormente por estar inserido no contexto de um dispositivo legal que trata de motivos ditos “culposos” de separação.
Tanto que Luiz Felipe Brasil Santos, em arguta observação, ao comentar a inovadora possibilidade aberta pelo normativo citado, observou justamente que “o parágrafo único do art. 1.573, surpreendentemente, dispõe que o ´juiz poderá considerar outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum´. Ou seja, introduz no sistema, de forma absolutamente incoerente com os dispositivos anteriores, uma hipótese de extremada abertura, ensejando ... a viabilidade de ser decretada a separação judicial com fundamento exclusivo na impossibilidade de continuação da vida em comum, pela ausência da affectio que constitui a própria razão de ser do relacionamento conjugal”. Para ao final concluir: “certamente que por tal senda é que deverá enveredar a jurisprudência” .
E, de fato, surpreendente ou não, incoerente ou não, a inovação parece já ter sido acolhida pela jurisprudência do c. STJ, que cuidou logo de indicar como deverá ser interpretado o dispositivo legal, de modo a contemplar a interpretação mais evolutiva e atual do instituto jurídico da separação.
Realmente, em precedente mais do que recente, o Superior de Justiça decretou que o art. 1573, parágrafo único, “permite a separação quando o juiz verificar a presença de outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum”, ainda que não tenha restado evidenciada a culpa de um ou de ambos os cônjuges ou qualquer outra causa objetiva de separação (separação de fato ou doença mental grave), convolando-se, portanto, a separação calcada na impossibilidade da vida em comum e mais uma modalidade de separação falência existente em nosso ordenamento .
A propósito, esta nos parece a melhor e mais razoável compreensão, porquanto muito embora uma interpretação sistemática do parágrafo único do art. 1.573 possa conduzir à conclusão de que quando o texto legal se refere a outros “fatos” que podem ser considerados pelo juiz para decretar a separação, além daqueles elencados no caput, estaria a se referir a outras causas culposas, além daquelas já expressamente previstas no caput, uma interpretação lógica infirma esta conclusão, já que o texto contempla a expressão “fatos” e não motivos, dando a entender claramente que o julgador poderá e deverá considerar outras circunstâncias, ainda que não culposas, para deferir um determinado pleito de separação, como por exemplo o fim do amor ou até mesmo a já citada “incompatibilidade de gênios”.
Nada mais justo, porque se não é necessário invocar nenhum motivo ou causa jurídica para se casar, de igual sorte não se deve exigir um motivo ou casa para se descasar.
Isto sem considerar as duras e severas críticas, ao nosso sentir fundadas, que os operadores do direito de família vinham fazendo a essa obrigatória invocação de uma causa, principalmente culposa, mas também objetiva, para o acesso à separação .
Salienta-se que não é desarrazoada a afirmação feita algumas linhas atrás, segundo a qual a inovação em testilha foi introduzida por acidente ou no mínimo de maneira velada e disfarçada no novo Código Civil, tanto que os autores que foram pioneiros na sua interpretação não entenderam que o dispositivo legal tenha trazido a inovação vislumbrada pelo c. STJ, que para nós foi a maior produzida pelo novo Código Civil na quadra da separação judicial e do divórcio.
Aliás, Maria Berenice Dias, no comentário pioneiro que fez sobre a separação e o divórcio no novo Código Civil, em que pese toda a sua perspicácia e incomparável domínio sobre o direito de família, se ressentiu justamente da “retrógrada mantença da necessidade de identificação de um culpado para ser concedida a separação”, sem atentar para a abertura dada pelo parágrafo único do art. 1.573 .
Curioso observar que nesta nova modalidade de separação, o requerimento da separação não está condicionado à “inocência” por assim dizer daquele que requer a separação, que não está obrigado a imputar qualquer pecha ao cônjuge do qual quer se separar como justificativa para o desenlace, podendo mesmo alegar que ele, autor do pedido de separação, deixou de nutrir pelo seu consorte afeição conjugal, o que tornou insuportável a preservação do vínculo.
Na separação culposa, todavia, tudo continua como antes, ou seja, a via continua aberta apenas e tão somente para o cônjuge dito “inocente”, vítima da violação aos deveres do casamento ou conduta desonrosa.
Nada impede, todavia, diante da propositura de uma ação de separação judicial calcada simplesmente na insuportabilidade da vida decorrente por exemplo do fim da afeição conjugal, possa o cônjuge demandado deduzir reconvenção pretendendo ver reconhecida e decretada a culpa do autor do pleito, o que poderá ter relevância, ainda que pequena, para efeito de guarda dos filhos, uso do nome e direito a alimentos. Agora, a hipótese de simples resistência ao pedido por parte daquele demandado, no caso da novel modalidade de separação é que parece muito restrita (para não dizer inviável), sendo certo que quase sempre, demonstrada a insuportabilidade da vida em comum pelo autor do pedido, circunstância que parece decorrer da só propositura da ação de separação, nenhuma censura poderá sofrer o pleito.
Neste particular da culpa ou da motivação da separação, que poderá influenciar no estabelecimento da guarda dos filhos, alimentos e uso do nome, parece também que o cônjuge demandado, ao invés de reconvir para inserir no debate a causa e suas conseqüências, eternizando com isto o casamento e o processo de separação, poderá simplesmente concordar com a separação, deixando para discutir em ação ou ações próprias, o nome, o direito a alimentos e a guarda dos filhos.
Também houve ligeira inovação quanto aos efeitos da iniciativa da separação judicial nos casos de falência da sociedade conjugal (= separação de fato e grave doença mental). É que o art. 19 da Lei do Divórcio impunha ao autor do pedido, inclusive na hipótese de separação de fato, a “responsabilidade” pela dissolução do matrimônio, o que por vezes implicava em injustiça, como por exemplo no caso daquele cônjuge abandonado, que depois de 1 (um) ano do abandono, não vislumbrando mais a possibilidade de restabelecimento da sociedade conjugal, tomava a iniciativa então de formalizar a separação judicial, e só por isto era considerado responsável, ficando obrigado a prestar alimentos ao cônjuge que houvera abandonado o lar, dando causa, em primeira gênese, ao rompimento que nesta quadra apenas se formalizava. Isto sem prejuízo da sanção patrimonial determinada pelo art. 5.º, § 3.º, que também afligiria o cônjuge que tomasse a iniciativa da formalização da separação.
Mas houve modificação. Não há mais qualquer influência direta da iniciativa da separação quer nos casos de separação de fato quer nos casos de doença mental grave, não tendo sido repristinada pelo novo Código norma semelhante àquele prevista no art. 19 da Lei do Divórcio. Segundo porque a sanção patrimonial antes citada, que aliás nos parece justa, não como uma maneira de desestimular a separação, mas de garantir ao enfermo melhores condições materiais, agora só terá aplicabilidade na hipótese de separação remédio fundada na grave doença mental do cônjuge demandado.
No pertinente aos alimentos, nestas hipóteses, temos que a regra deverá ser aquela mesma da separação sem culpa, ficando o cônjuge necessitado autorizado a pleitear alimentos daquele que tiver possibilidade de presta-los. Necessidade que na hipótese do cônjuge enfermo seria mais do que presumível, só se admitindo que fosse afastada a presunção diante da manifesta condição econômica do mesmo (ex.: aposentadoria de valor razoável ou vultoso patrimônio).
Relativamente ao rito processual a ser adotado na separação judicial consensual, nenhuma alteração, remanescendo a aplicação do disposto nos arts. 1.120 a 1.124 do CPC.
3. Divórcio.
De igual forma, persistem o divórcio direto e o divórcio por conversão da separação judicial em divórcio. O primeiro sem nenhuma inovação. A distinção fica por conta da desnecessidade de se comprovar o cumprimento das obrigações assumidas por ocasião da separação judicial, isto na hipótese de divórcio indireto ou por conversão, uma vez que o novo Código Civil não repetiu a norma prevista no art. 36, § único, da Lei do Divórcio, que estabelecia como requisito para a conversão, além do prazo da separação judicial, também o regular cumprimento das obrigações assumidas em vista da separação, de sorte que o único pressuposto para a conversão passou a ser, agora, o prazo de separação.
Trata-se de inovação salutar, não só porque põem fim a uma polêmica gerada pela CF 88, que no art. 226 § 6.º, ao dispor sobre o divórcio indireto, impôs como único pressuposto, o decurso de prazo da separação judicial, de sorte que muitos doutrinadores e julgados vinham entendendo que se a Carta Política não exigiu nenhum plus, não poderia faze-lo a Lei do Divórcio, que neste particular teria sido revogada pela norma constitucional. Mas sobretudo porque a impossibilidade de se divorciar não deveria ser usada como instrumento de coerção para forçar o ex-cônjuge a cumprir com as obrigações advindas da separação judicial. O ordenamento jurídico coloca ao dispor dos credores (=ex-consorte e filhos) das obrigações decorrentes da separação, instrumentos bastantes e suficientes para alcançar o adimplemento desejado, sendo certo, de mais a mais, que era muito efêmero o efeito dessa imposição, já que levaria o devedor a cumprir sua obrigação durante lapso de tempo muito curto, que poderia ser de no máximo 1 (um) ano.
Outro ponto que mereceu alteração, na quadra do divórcio, diz com as conseqüências da iniciativa. É que como foi visto, no regime da Lei do Divórcio, o cônjuge autor do pedido era considerado responsável pela dissolução do matrimônio, e como tal ficava obrigado a prestar alimentos ao cônjuge demandado, alem ainda de sofrer sanção patrimonial, na hipótese de casamento pelo regime da comunhão universal de bens, o que não mais se vê no novo Código Civil.
Agora, a simples iniciativa não induz mais à obrigação de prestar alimentos, como aliás já vinha sendo decidido pelos Tribunais, dependendo a fixação dos alimentos da real e efetiva necessidade do cônjuge aspirante, que pode mesmo ser o autor do pedido de divórcio. Também influencia no direito aos alimentos o tempo da separação de fato, quando em tal causa for fundado o pedido, posto que há inúmeros precedentes no sentido de que, depois de longa separação de fato, teria desaparecido o direito a alimentos.
O que nos parece inviável é que o enfermo, no caso da separação fundada na grave doença mental, possa ser obrigado a prestar alimentos ao autor do pedido de divórcio, ainda que necessitado este e dotado de grandes possibilidades aquele.
4. Conclusão.
O NCC não trouxe grandes alterações, nem para a separação nem para o divórcio, destacando-se dentre as mudanças aquela que criou um novo modelo de separação judicial, desvinculado de uma causa subjetiva culposa (§ único do 1.573).
A separação judicial e o divórcio não sofreram grandes alterações com o advento do novo Código Civil. Inicialmente porque foram preservadas tanto a separação quanto o divórcio como modalidades de dissolução da sociedade conjugal, quando nos parece que a separação deveria ter sido banida .
2. Separação.
Com efeito, prevalecem a separação (i) litigiosa como se conhecia anteriormente, na sua modalidade culposa, baseada na conduta desonrosa ou na grave violação aos deveres matrimoniais por um dos cônjuges, que torne insuportável a vida em comum, e nas modalidades remédio, estribada na grave doença mental que tenha acometido um dos cônjuges, ou falência, em vista da ruptura da vida em comum combinada com a impossibilidade da sua reconstituição, além da (ii) consensual, por mútuo consentimento entre os cônjuges.
De novidade, na separação litigiosa, temos a redução do prazo de duração da doença mental que tiver acometido um dos cônjuges, na hipótese de separação fundada nesta causa objetiva, de 5 (cinco) na Lei do Divórcio, para 2 (dois) anos no novo Código Civil, bem como a extirpação da criticada cláusula de dureza, que se achava prevista no art. 6.º da Lei do Divórcio e não foi repetida, de tal sorte que o julgador não mais poderá recusar a homologação da separação judicial alegando a possibilidade agravar ainda mais a situação do enfermo. E na separação consensual a redução do prazo mínimo de vigência do casamento, que anteriormente só poderia ser dissolvido pela separação consensual após 2 (dois) anos de vigência, enquanto que a teor do art. 1574, caput, do novo Código, pode ser dissolvido após 1 (um) ano.
Agora, a mais significativa inovação na quadra da separação foi sem dúvida a possibilidade da mesma ser requerida sem a invocação de uma causa jurídica (culposa ou objetiva).
De fato, o art. 1573, parágrafo único, ao dispor que “o juiz poderá considerar outros fatos, que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum”, passou a contemplar uma nova modalidade de separação no direito brasileiro, calcada na própria impossibilidade da manutenção da vida em comum, independente de qualquer causa, culposa ou objetiva, de tal sorte que um determinado cônjuge, para se separar, não precisa mais invocar uma causa, como por exemplo a grave violação dos deveres matrimoniais por parte do outro cônjuge, ou mesmo a grave doença mental, bastando simplesmente que alegue o seu desejo de não mais manter o laço matrimonial pelo fim da afeição conjugal, ou mesmo a tão comentada “incompatibilidade de gênios”.
Ressalta-se que a inovação, digna de aplausos e elogios, se não foi involuntária ou acidental, resultando de falha de redação do parágrafo único do art. 1573, por certo que foi inserida no sistema de modo quase que subliminar, porque o normativo em questão é passível de interpretação divergente, de tal modo a não permitir a incoação da separação judicial sem causa jurídica (culposa ou objetiva) mormente por estar inserido no contexto de um dispositivo legal que trata de motivos ditos “culposos” de separação.
Tanto que Luiz Felipe Brasil Santos, em arguta observação, ao comentar a inovadora possibilidade aberta pelo normativo citado, observou justamente que “o parágrafo único do art. 1.573, surpreendentemente, dispõe que o ´juiz poderá considerar outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum´. Ou seja, introduz no sistema, de forma absolutamente incoerente com os dispositivos anteriores, uma hipótese de extremada abertura, ensejando ... a viabilidade de ser decretada a separação judicial com fundamento exclusivo na impossibilidade de continuação da vida em comum, pela ausência da affectio que constitui a própria razão de ser do relacionamento conjugal”. Para ao final concluir: “certamente que por tal senda é que deverá enveredar a jurisprudência” .
E, de fato, surpreendente ou não, incoerente ou não, a inovação parece já ter sido acolhida pela jurisprudência do c. STJ, que cuidou logo de indicar como deverá ser interpretado o dispositivo legal, de modo a contemplar a interpretação mais evolutiva e atual do instituto jurídico da separação.
Realmente, em precedente mais do que recente, o Superior de Justiça decretou que o art. 1573, parágrafo único, “permite a separação quando o juiz verificar a presença de outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum”, ainda que não tenha restado evidenciada a culpa de um ou de ambos os cônjuges ou qualquer outra causa objetiva de separação (separação de fato ou doença mental grave), convolando-se, portanto, a separação calcada na impossibilidade da vida em comum e mais uma modalidade de separação falência existente em nosso ordenamento .
A propósito, esta nos parece a melhor e mais razoável compreensão, porquanto muito embora uma interpretação sistemática do parágrafo único do art. 1.573 possa conduzir à conclusão de que quando o texto legal se refere a outros “fatos” que podem ser considerados pelo juiz para decretar a separação, além daqueles elencados no caput, estaria a se referir a outras causas culposas, além daquelas já expressamente previstas no caput, uma interpretação lógica infirma esta conclusão, já que o texto contempla a expressão “fatos” e não motivos, dando a entender claramente que o julgador poderá e deverá considerar outras circunstâncias, ainda que não culposas, para deferir um determinado pleito de separação, como por exemplo o fim do amor ou até mesmo a já citada “incompatibilidade de gênios”.
Nada mais justo, porque se não é necessário invocar nenhum motivo ou causa jurídica para se casar, de igual sorte não se deve exigir um motivo ou casa para se descasar.
Isto sem considerar as duras e severas críticas, ao nosso sentir fundadas, que os operadores do direito de família vinham fazendo a essa obrigatória invocação de uma causa, principalmente culposa, mas também objetiva, para o acesso à separação .
Salienta-se que não é desarrazoada a afirmação feita algumas linhas atrás, segundo a qual a inovação em testilha foi introduzida por acidente ou no mínimo de maneira velada e disfarçada no novo Código Civil, tanto que os autores que foram pioneiros na sua interpretação não entenderam que o dispositivo legal tenha trazido a inovação vislumbrada pelo c. STJ, que para nós foi a maior produzida pelo novo Código Civil na quadra da separação judicial e do divórcio.
Aliás, Maria Berenice Dias, no comentário pioneiro que fez sobre a separação e o divórcio no novo Código Civil, em que pese toda a sua perspicácia e incomparável domínio sobre o direito de família, se ressentiu justamente da “retrógrada mantença da necessidade de identificação de um culpado para ser concedida a separação”, sem atentar para a abertura dada pelo parágrafo único do art. 1.573 .
Curioso observar que nesta nova modalidade de separação, o requerimento da separação não está condicionado à “inocência” por assim dizer daquele que requer a separação, que não está obrigado a imputar qualquer pecha ao cônjuge do qual quer se separar como justificativa para o desenlace, podendo mesmo alegar que ele, autor do pedido de separação, deixou de nutrir pelo seu consorte afeição conjugal, o que tornou insuportável a preservação do vínculo.
Na separação culposa, todavia, tudo continua como antes, ou seja, a via continua aberta apenas e tão somente para o cônjuge dito “inocente”, vítima da violação aos deveres do casamento ou conduta desonrosa.
Nada impede, todavia, diante da propositura de uma ação de separação judicial calcada simplesmente na insuportabilidade da vida decorrente por exemplo do fim da afeição conjugal, possa o cônjuge demandado deduzir reconvenção pretendendo ver reconhecida e decretada a culpa do autor do pleito, o que poderá ter relevância, ainda que pequena, para efeito de guarda dos filhos, uso do nome e direito a alimentos. Agora, a hipótese de simples resistência ao pedido por parte daquele demandado, no caso da novel modalidade de separação é que parece muito restrita (para não dizer inviável), sendo certo que quase sempre, demonstrada a insuportabilidade da vida em comum pelo autor do pedido, circunstância que parece decorrer da só propositura da ação de separação, nenhuma censura poderá sofrer o pleito.
Neste particular da culpa ou da motivação da separação, que poderá influenciar no estabelecimento da guarda dos filhos, alimentos e uso do nome, parece também que o cônjuge demandado, ao invés de reconvir para inserir no debate a causa e suas conseqüências, eternizando com isto o casamento e o processo de separação, poderá simplesmente concordar com a separação, deixando para discutir em ação ou ações próprias, o nome, o direito a alimentos e a guarda dos filhos.
Também houve ligeira inovação quanto aos efeitos da iniciativa da separação judicial nos casos de falência da sociedade conjugal (= separação de fato e grave doença mental). É que o art. 19 da Lei do Divórcio impunha ao autor do pedido, inclusive na hipótese de separação de fato, a “responsabilidade” pela dissolução do matrimônio, o que por vezes implicava em injustiça, como por exemplo no caso daquele cônjuge abandonado, que depois de 1 (um) ano do abandono, não vislumbrando mais a possibilidade de restabelecimento da sociedade conjugal, tomava a iniciativa então de formalizar a separação judicial, e só por isto era considerado responsável, ficando obrigado a prestar alimentos ao cônjuge que houvera abandonado o lar, dando causa, em primeira gênese, ao rompimento que nesta quadra apenas se formalizava. Isto sem prejuízo da sanção patrimonial determinada pelo art. 5.º, § 3.º, que também afligiria o cônjuge que tomasse a iniciativa da formalização da separação.
Mas houve modificação. Não há mais qualquer influência direta da iniciativa da separação quer nos casos de separação de fato quer nos casos de doença mental grave, não tendo sido repristinada pelo novo Código norma semelhante àquele prevista no art. 19 da Lei do Divórcio. Segundo porque a sanção patrimonial antes citada, que aliás nos parece justa, não como uma maneira de desestimular a separação, mas de garantir ao enfermo melhores condições materiais, agora só terá aplicabilidade na hipótese de separação remédio fundada na grave doença mental do cônjuge demandado.
No pertinente aos alimentos, nestas hipóteses, temos que a regra deverá ser aquela mesma da separação sem culpa, ficando o cônjuge necessitado autorizado a pleitear alimentos daquele que tiver possibilidade de presta-los. Necessidade que na hipótese do cônjuge enfermo seria mais do que presumível, só se admitindo que fosse afastada a presunção diante da manifesta condição econômica do mesmo (ex.: aposentadoria de valor razoável ou vultoso patrimônio).
Relativamente ao rito processual a ser adotado na separação judicial consensual, nenhuma alteração, remanescendo a aplicação do disposto nos arts. 1.120 a 1.124 do CPC.
3. Divórcio.
De igual forma, persistem o divórcio direto e o divórcio por conversão da separação judicial em divórcio. O primeiro sem nenhuma inovação. A distinção fica por conta da desnecessidade de se comprovar o cumprimento das obrigações assumidas por ocasião da separação judicial, isto na hipótese de divórcio indireto ou por conversão, uma vez que o novo Código Civil não repetiu a norma prevista no art. 36, § único, da Lei do Divórcio, que estabelecia como requisito para a conversão, além do prazo da separação judicial, também o regular cumprimento das obrigações assumidas em vista da separação, de sorte que o único pressuposto para a conversão passou a ser, agora, o prazo de separação.
Trata-se de inovação salutar, não só porque põem fim a uma polêmica gerada pela CF 88, que no art. 226 § 6.º, ao dispor sobre o divórcio indireto, impôs como único pressuposto, o decurso de prazo da separação judicial, de sorte que muitos doutrinadores e julgados vinham entendendo que se a Carta Política não exigiu nenhum plus, não poderia faze-lo a Lei do Divórcio, que neste particular teria sido revogada pela norma constitucional. Mas sobretudo porque a impossibilidade de se divorciar não deveria ser usada como instrumento de coerção para forçar o ex-cônjuge a cumprir com as obrigações advindas da separação judicial. O ordenamento jurídico coloca ao dispor dos credores (=ex-consorte e filhos) das obrigações decorrentes da separação, instrumentos bastantes e suficientes para alcançar o adimplemento desejado, sendo certo, de mais a mais, que era muito efêmero o efeito dessa imposição, já que levaria o devedor a cumprir sua obrigação durante lapso de tempo muito curto, que poderia ser de no máximo 1 (um) ano.
Outro ponto que mereceu alteração, na quadra do divórcio, diz com as conseqüências da iniciativa. É que como foi visto, no regime da Lei do Divórcio, o cônjuge autor do pedido era considerado responsável pela dissolução do matrimônio, e como tal ficava obrigado a prestar alimentos ao cônjuge demandado, alem ainda de sofrer sanção patrimonial, na hipótese de casamento pelo regime da comunhão universal de bens, o que não mais se vê no novo Código Civil.
Agora, a simples iniciativa não induz mais à obrigação de prestar alimentos, como aliás já vinha sendo decidido pelos Tribunais, dependendo a fixação dos alimentos da real e efetiva necessidade do cônjuge aspirante, que pode mesmo ser o autor do pedido de divórcio. Também influencia no direito aos alimentos o tempo da separação de fato, quando em tal causa for fundado o pedido, posto que há inúmeros precedentes no sentido de que, depois de longa separação de fato, teria desaparecido o direito a alimentos.
O que nos parece inviável é que o enfermo, no caso da separação fundada na grave doença mental, possa ser obrigado a prestar alimentos ao autor do pedido de divórcio, ainda que necessitado este e dotado de grandes possibilidades aquele.
4. Conclusão.
O NCC não trouxe grandes alterações, nem para a separação nem para o divórcio, destacando-se dentre as mudanças aquela que criou um novo modelo de separação judicial, desvinculado de uma causa subjetiva culposa (§ único do 1.573).
Bibliografia:
BRASIL SANTOS, Luiz Felipe. Separação Judicial e Divórcio no Novo Código Civil Brasileiro, in Revista Brasileira de Direito de Família, n. 12, Jan-Fev-Mar 2002, Síntese.
DIAS, Maria Berenice e Rodrigo da Cunha Pereira. Direito de Família e o Novo Código Civil, Del Rey, 2001.
* Advogado em Campo Grande(MS), Diretor Regional do IBDFAM – Centro Oeste
Os artigos assinados aqui publicados são inteiramente de responsabilidade de seus autores e não expressam posicionamento institucional do IBDFAM