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Guarda Compartilhada X Convivência Familiar
RESUMO: A recém-aprovada lei da guarda compartilhada não inova, gera polêmica ao tratar de guarda compartilhada com alusão à guarda alternada, mas favorece a discussão sobre o tema e a possibilidade concreta da convivência familiar para os filhos de pais divorciados.
Sancionada em 22 de dezembro de 2014 pela Presidente Dilma Rousseff, a chamada “nova lei da guarda compartilhada” – Lei 13.058, alterou os artigos 1.583 a 1.585 e 1.634, do Código Civil. O Projeto de Lei nº 1009/2011, convertido no Projeto de Lei da Câmara (PLC) nº 117/2013 foi aprovado sem vetos e entrou em vigor na data de sua publicação.
Especialistas no assunto, como o Juiz de Direito Titular da 2ª Vara da Família e das Sucessões de Jacareí/SP, Fernando Henrique Pinto[1], garantem que a legislação recém-aprovada não trouxe grandes inovações, tendo em vista que a guarda conjunta dos filhos já estava prevista desde 2008, quando a Lei 11.698 expressamente considerou a igualdade de condições entre pais e mães e o termo “pátrio poder” foi substituído por “poder familiar” para considerar, preferencialmente, compartilhada a guarda “sempre que possível”, isto é, sempre que os interesses das crianças e adolescentes estejam assegurados.
Ocorre que, não foram poucas as vezes que advogados ouviram dos próprios conciliadores, nomeados para presidir audiências, que o Juiz desta ou daquela Vara de Família não concordava com a “guarda compartilhada”, ainda que os ex-cônjuges assim pleiteassem na homologação do acordo de Divórcio.
Nesse sentido, a legislação veio, positivamente, trazer, ao menos, a discussão quanto ao verdadeiro significado da guarda compartilhada, mesmo dentre os grupos mais conservadores, que enxergam a nova lei com ressalvas.
Fato incontestável é a polêmica gerada, não só na população como também dentre os especialistas e operadores do Direito, pois o próprio legislador instiga confusão ao tratar, no §2º do artigo 1.583, que “o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e o com o pai”, fazendo alusão, na verdade, à denominada guarda alternada, em que o menor habita determinado período com cada genitor, dividindo-se a guarda física, diferentemente do que a doutrina e a jurisprudência dos nossos Tribunais sempre consideraram como guarda compartilhada.
Na guarda compartilhada o que se divide é a guarda jurídica, ou seja, os genitores participam conjuntamente nas decisões da vida dos filhos, como por exemplo, qual escola as crianças vão estudar, qual será o plano de saúde ou as atividades extracurriculares que vão praticar, até assuntos mais corriqueiros, como se a criança poderá ou não ir a uma excursão escolar. No entanto, neste modelo, permanece a guarda física unilateral, isto é, exclusivamente com aquele que melhor satisfizer as necessidades do menor.
Os psicólogos tendem a afirmar que a guarda alternada faz a criança perder a referência de lar, pois implica em mudanças periódicas do filho para a casa de cada um dos genitores, porém, em alguns casos práticos que observei e acompanhei como advogada, a alternância de residências satisfaz não só os interesses dos genitores como principalmente dos menores, que preferem ter um quarto na casa de cada um dos pais do que perder o convívio com qualquer um deles.
Dessa forma, o que se constata é que em Direito de Família não há como estabelecer regra única, devendo cada caso ser analisado isoladamente, através de um estudo psicossocial, por equipe técnica especializada composta por psicólogos e assistentes sociais, que vão avaliar o que melhor se apresenta para cada família.
Disto decorre que, na disputa pela guarda dos filhos, o Magistrado deverá aplicar a guarda compartilhada, desde que ambos os genitores estejam aptos a exercer o poder familiar, o que será constatado por orientação técnico-profissional ou equipe interdisciplinar que avaliará caso a caso, conforme interpretação dos §§ 2º e 3º do artigo 1.584 do Código Civil, alterados pela Lei 13.058/14.
Para aqueles que realmente pretendem participar ativamente da vida dos filhos após o Divórcio, a lei veio facilitar a convivência familiar, termo defendido pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, como o ideal em substituição à “guarda compartilhada” que pode causar falsa impressão de “disputa” por um objeto, o que não apresenta uma compatibilidade com os avanços sociais, que devem ser orientados sempre pela busca do melhor interesse da criança e do adolescente, pois entendem que ainda que neste modelo a criança tenha uma residência única, poderá ter a convivência ampliada com aquele que não detém a guarda física.
A assessoria de comunicação do IBDFAM afirma que “A manutenção da convivência entre pais e filhos é o que importa: levar e trazer da escola, auxiliar o filho nas tarefas diárias, participar de reuniões pedagógicas e de eventos esportivos, acompanhar o filho nas atividades extracurriculares como natação, estudo de línguas, balé ou futebol, freqüência a teatros, cinemas e museus, idas a médicos, enfim, integrar-se na vida do filho, ensinando-lhe, por suas atitudes, os supremos valores à formação psicossocial”[2].
O que a legislação pretendeu, na verdade, com a aplicação “forçada” da guarda compartilhada, foi assegurar para as crianças a convivência com ambos os pais, ambas as famílias, o que já estava previsto, mas nem sempre foi observado na prática pelos pais que se divorciam.
No entanto, para aqueles que somente esperavam desobrigarem-se das responsabilidades, como deixar de pagar pensão, a interpretação correta da lei impede que isto ocorra.
O modelo ideal da guarda compartilhada, no que se refere aos alimentos dos filhos, sugere que todos os gastos sejam divididos entre os pais de acordo com a possibilidade de cada um. Assim, ao invés de apenas um dos genitores administrar os gastos dos filhos, ambos têm a responsabilidade pelo custeio das despesas, na proporção de seus ganhos.
Deixou de existir, portanto, a ideia que para a guarda ser compartilhada os pais devem se dar bem, pois analisando friamente, os pais que realmente se dão bem dificilmente estariam divorciados, mas, por outro lado, gera a responsabilidade, mesmo entre os que não se entendem que precisarão entrar em acordo na questão mais importante da vida deles: os filhos. Dessa forma, acredito que a lei fará com que as pessoas reflitam sobre os danos irreparáveis aos filhos, quando um genitor pretende excluir o outro do convívio com a criança, por mágoa ou frustração pessoal, em contrassenso ao melhor interesse do menor.
TAGS: nova lei da guarda compartilhada, guarda alternada, convivência familiar.
Tânia Tôrres de Alckmin Lisboa
Advogada especialista em Direito de Família e Sucessões, Mediadora Familiar capacitada pela Escola Paulista da Magistratura - EPM, membro da Diretoria do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, núcleo de São José dos Campos e Presidente da Comissão de Direito de Família da OAB de São José dos Campos (gestão 2010 a 2012).
[1] Extraído do artigo publicado no site do IBDFAM www.ibdfam.org.br: “PLC nº 117/2013 - Guarda compartilhada– O que realmente muda”, publicado em 10/12/2014.
[2] Trecho extraído do artigo publicado em 03/12/2014 no site www.ibdfam.org.br
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