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Encontro de almas entre mãe e filha
A pedagoga Rita de Cássia sempre sonhou ser mãe. Quando nasceu, sua genitora teve problemas durante o parto e por pouco não morreu. O susto, relatado depois à Rita, a desestimulou a dar à luz. Após um relacionamento de vinte anos, cogitou a ideia de adotar. Em 2013, deu entrada no processo de adoção e buscou a documentação na vara responsável. A partir daí, a história da futura mamãe sofreu reviravoltas, exigindo dela muita força de vontade, determinação e fé. Os desdobramentos e o desfecho desta saga são relatados por Rita de Cássia, num depoimento emocionante:
“Na mesma época em que peguei a documentação na vara, o Papa (Francisco) veio ao Rio de Janeiro para a Jornada Mundial da Juventude. Fui vê-lo, e levei os papéis para que ele os abençoasse. Ele não me viu, mas eu o vi, e, com fé, sabia que daria tudo certo. Tempos depois fui promovida no trabalho e precisei protelar o início do processo de adoção. Foi então que, em 2014, dei entrada na habilitação. Meu perfil idealizado era de até duas crianças, saudáveis, de dois a cinco anos, sendo pelo menos uma menina.
Em maio de 2015, já estava na fase das reuniões - em minha segunda reunião no grupo de apoio -, até que uma cegonha me chamou e perguntou se eu gostaria de ir na próxima visita a um abrigo, pois lá havia uma menina de dez anos que ‘era a minha cara’. Me assustei um pouco, pois a idade era exatamente o dobro da que eu idealizava. Porém, fiquei muito curiosa para conhecer a criança que tanto se parecia comigo.
Então, no dia 31 de maio, num sábado de sol, fui ao abrigo para conhecer a menina, junto da equipe do grupo de apoio e de outros pretendentes. Ah! Mas havia um detalhe: a criança tinha uma doença grave na pele, tratável, mas incurável. Tive medo, até porque essas eram as únicas informações que eu possuía, até então. Não sabia exatamente que doença era. Em dado momento, a cegonha chegou até mim e disse: ‘Aquela é a menina’. Ela estava de costas, pulando amarelinha. Dei uma rápida olhada na pele dela, e não vi nada. De repente, ela virou-se de frente. Que susto! Era eu, mais nova! Coração acelerou. Acabava de (re)conhecer minha filha.
Conversamos rapidamente. Coisas supérfluas. E, na hora de tirar uma foto do grupo - não das crianças, pois não é permitido -, ela queria brincar com um celular, e não tinham o emprestado para ela. Foi então que vi sua primeira pirraça. Pensei: ‘É pirracenta, mas eu quero ser mãe dela’. Já não importava qual era a doença, porque eu já estava envolvida. Terminou a visita, conversei com a cegonha sobre meu interesse e fiquei dias esperando uma resposta, rezando. Até que, dias depois, soube que ela já não estava mais disponível, pois havia um casal na minha frente. Chorei muito! Fiquei meses chorando e perguntando por ela.
Um dia, ao chegar do trabalho, entrei no quarto que seria dela, e chorei horas. Naquele momento, pensei em desistir. Não queria outra criança. Conheci crianças lindas, mas ansiava por ela. Reclamei com Deus. Não entendia o motivo. De repente, meu celular tocou. Engoli o choro e li [na tela do aparelho] o nome da cegonha. Atendi soluçando, e falei que estava muito mal. Foi quando ela perguntou: ‘Você sabe quem está disponível para adoção?’ Falei: ‘Não’. Ela respondeu: ‘Sua filha. O casal desistiu’... Enfim, ela seria minha!
Começou então uma saga, até que eu conseguisse a permissão para adotá-la. Foi quando recebi, em outubro de 2015, a autorização e, no dia 19, ela chegou para mim. Naquele dia, eu nasci para a vida. Recebi o verdadeiro e infinito amor na minha casa. Ela chegou aos dez anos de idade, com falta de cabelo de um lado e uma mala de remédios. Tomava uma vacina por semana, tinha suspeita de glaucoma, usava óculos, tomava remédio fortíssimo todos os dias e, toda terça-feira, tomava um outro [medicamento]. Usava colírio, loção e pomada para a cabeça, além de protetor solar fator 70 ou 100, 24 horas por dia, bem como roupas especiais contra os raios UV. Não podia ficar nervosa, tinha alimentação regrada e incontinência urinária. Ufa! Mas, junto com ela, chegou minha garra de mãe, a vontade dela de viver e meu amor infinito. Travamos uma luta!
No primeiro mês, acabou o xixi na cama. Fomos à primeira consulta com a médica que já a acompanhava, e ela retirou as vacinas. No segundo mês, suspendeu o colírio e o remédio da terça-feira, reduzindo também o medicamento diário. Antes do terceiro mês, ela começou a lacrimejar muito, e voltamos na médica. O remédio diário foi retirado, e uma consulta oftalmológica agendada para dali a 15 dias.
Minha filha não tinha problema algum nas vistas. Era tudo efeito colateral do remédio. No quarto mês, ela já tinha cabelo e não tomava nenhum medicamento. Seis meses depois, a médica reduziu o uso do protetor solar - para três vezes ao dia -, e não havia mais a necessidade de passá-lo antes de dormir. Hoje, quase dois anos depois, minha filha usa protetor [fator] 50 na rua, e [fator] 30 em casa, sem exagero. Frequenta o clube de que somos sócias, com a devida proteção, e faz natação no colégio. Ela destaca-se como a melhor aluna de natação. Nada muito! [risos] E, na última consulta, a médica - hoje nossa querida amiga - disse que minha filha está curada, inclusive da doença emocional - gerada pelos maus-tratos sofridos na infância. Minha filha está com doze anos, é maravilhosa e excelente aluna no colégio - quando chegou, só sabia contar até dez. É o meu sonho realizado. Ela é o amor da minha vida e, definitivamente, é a minha cara!”
Rita de Cássia tornou-se mãe por meio de adoção monoparental - uma vez que já se encontrava solteira à época em que deu início ao processo -, tardia e “necessária”, como bem define. Ela conta que ninguém acredita que a menina foi adotada: “Eu sei que ela é minha filha de alma, de outras vidas, de todas as vidas. A ela, toda a minha gratidão por me aceitar como mãe e fazer de mim um ser humano melhor e mais feliz. Ela chegou Vitória, mas decidiu virar Luísa, para deixar a velha vida - de tristezas - para trás. Ela é meu maior amor!”
Rita e sua filha, Luísa
Foto: Divulgação
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