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A judicialização do afeto na família narcisista sob a perspectiva do Direito brasileiro
A judicialização do afeto na família narcisista sob a perspectiva do Direito brasileiro
Ticiane Viana Costa[1]
Rita Simões Bonelli[2]
Resumo: A presente monografia visa analisar as consequências jurídicas do ambiente familiar narcísico sobre crianças e adolescentes, especificamente em relação à alienação parental e ao abandono afetivo, a fim de investigar os possíveis efeitos psicológicos que interferem na formação da personalidade do infante. Por entender, em uma perspectiva interdisciplinar, que os atos praticados no seio da família narcisista geram danos imateriais ao filho, ainda que não exista solução efetiva para tais práticas, têm-se no direito brasileiro a possibilidade de indenização por danos extrapatrimoniais como medida reparatória ao descendente, trazendo a este uma breve sensação de justiça. Entende-se como família narcisista aquela que oferece um ambiente disfuncional para o desenvolvimento da criança e do adolescente que dele sejam frutos, pelo fato do genitor narcisista ter a constante necessidade em colocar suas vontades e pensamentos acima do pessoal e íntimo dos demais integrantes da família, desvalorizando a prole como ser detentor de direitos, enxergando-o como uma breve extensão de si.
Palavras-Chave: Família Narcisista. Abandono Afetivo. Psicologia Jurídica.
Abstract: This monograph aims to analyze the legal consequences of the narcissistic family environment on children and adolescents, specifically in relation to parental alienation and affective abandonment, in order to investigate the possible psychological effects that interfere in the formation of the infant's personality. By understanding, in an interdisciplinary perspective, that the acts practiced within the narcissistic family generate immaterial damages to the child, although there is no effective solution for such practices, Brazilian law has the possibility of compensation for off-balance-sheet damages as a remedial measure to descendant, bringing him a brief sense of justice. A narcissistic family is understood to be one that offers a dysfunctional environment for the development of the child and adolescent that results from it, due to the fact that the narcissistic parent has a constant need to place his / her wishes and thoughts above the personal and intimate of the other members of the family, devaluing the offspring as a rights holder, seeing it as a brief extension of themselves.
Keywords: Narcissistic Family. Affective Abandonment. Juridical Psychology.
Sumário: 1.Considerações iniciais; 2. Família narcisista; 2.1 A família narcisista e a alienação parental; 2.2 A família narcisista e o abandono afetivo; 2.3 A alienação parental e o abandono afetivo como consequências da família narcisista; 3. A contribuição da psicologia no que tange a família narcisista; 3.1 O transtorno de personalidade Borderline como uma possibilidade psicológica à família narcisista; 3.2 A possibilidade de reparação ao dano causado pelo exercício narcisista do poder familiar abusivo; 4. A proteção jurídica da criança e do adolescente; 4.1 O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente; 5. A judicialização do afeto e aindenização por danos morais como medida reparadora ao aabndono afetivo; 6. Análise de julgados sobre alienação parental correlacionados à família narcisista; 7. Considerações finais; Referências.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Nas relações familiares, pondera-se que os pais adotem atitudes maduras e possuam discernimento para que a suas respectivas funções sociais ocorram de modo que assegurem sempre o bem-estar do menor.
Por assumir a responsabilidade de cuidar e proteger sua prole, os pais mantêm igual nível de importância entre os membros da entidade familiar, através de uma disciplina positiva, objetivando sempre o melhor preparo de seus filhos para o amadurecimento da vida adulta.
Contudo, no campo da psicologia jurídica sabe-se que este dever parental nem sempre ocorrerá como se pretende, o que poderá acarretar em novos tipos de danos, sendo neste caso de espécie psicológica, ao infante que sofra com este tipo de negligência, comprometendo assim o desenvolvimento da personalidade em formação do filho, motivado tão somente pela idiossincrasia do genitor narcisista em ter seu desejo realizado.
A discussão acerca da família narcisista ainda é obscura aos olhos do Direito, visto que identificar este ambiente e as consequências nele existentes requer o auxílio de um grupo técnico especializado na área de Direito de Família e da Psicologia Jurídica.
Outrossim, a pergunta orientadora para todo o desenvolvimento desta redação monográfica se acende do seguinte modo: De que forma o dever de cuidado a crianças e adolescentes pode ser negligenciado por pais narcisista e quais as prováveis espécies de danos causados?
Deste modo, a celeuma acerca da pergunta orientadora far-se-á de modo a elucidar, ainda que brevemente, quanto as prováveis possibilidades jurídicas resultantes desta nova configuração disfuncional familiar.
Sobre o tema, sumariamente deve-se conhecer a história mitológica que advém do termo Narcisismo a fim de obter uma melhor compreensão desta nova configuração familiar e o modo como seus agentes se comportam nesta.
Considera-se família narcisista aquela que, apesar de preservar uma imagem de ambiente harmônico e saudável a quem vê de fora, mantém seus membros presos às frequentes condutas de sofrimento emocional por parte de um de seus pais, aqui identificado com narcisista, que pratica o exercício do poder familiar de modo abusivo, podendo ter a ocorrência do abandono afetivo e da alienação parental como ferramentas para a manipulação psicológica que assegure ao narcisista a concretização de seus objetivos.
A alienação parental é a manipulação de um dos pais para com a prole face o momento de divórcio com seu ex-cônjuge com o objetivo de vingança, alimentando no infante sentimentos negativos pelo seu genitor.
O abandono afetivo exposto mais à frente no texto abordará sobre a omissão de cuidados e participação do genitor na vida de sua prole. Geralmente, este ato ocorre já no processo após a ruptura afetiva dos pais, podendo ocorrer também com os filhos advindos de relações extraconjugais.
A alienação parental se percebe neste ambiente disfuncional pela perspectiva de que o ente narcisista tenderá a alienar a criança de modo com que ela pratique os atos cujo genitor tenha interesse, sem levar em consideração o interesse do infante, sob o risco de sofrer qualquer tipo de punição sempre que não realizar aos ensejos a ele comandados. Por consequência, poderá existir então o abandono afetivo como ação reflexiva a esta alienação punitiva.
A psicologia assume então o papel de abordar os preceitos que auxiliem na compreensão do que é e como funciona um ambiente familiar narcisista. Aqui, a figura principal do meio disfuncional parental narcisista é caracterizada por um dos pais que, a fim de ofender a imagem e interferir diretamente na privacidade do filho acabam interferindo na formação da personalidade do ser, aferindo sérios danos psicológicos ao infante, como a Síndrome de Borderline.
A ausência proposital de afeto e presença do pai no convívio de seu descendente, entendida como abandono afetivo, é comum pelo fato do genitor entender não é obrigado a manter uma rotina afetuosa e saudável com seu filho. Esta omissão voluntária fere princípios fundamentais garantidos à criança e ao adolescente.
Deste modo, a proteção jurídica da criança e do adolescente aplicados à problemática do modelo de família narcisista, deve ser analisado em conformidade às conquistas de direito do menor do período colonial brasileiro até o tempo vigente, para então exercitar a melhor compreensão acerca do princípio do melhor interesse do infante, visto a vulnerabilidade da formação de seu desenvolvimento cognitivo, estando assim mais suscetíveis à manipulação que uma personalidade narcísica pode causar.
Os danos extrapatrimoniais, de espécie psíquica os quais o filho alienado sobre a incidência do comportamento narcísico de um dos pais sofrerá – visto ser parte do foro íntimo da pessoa –começam a ter visibilidade em 2012, configurando a si relevância à partir de 2012, quando surgem jurisprudências que aceitem a indenização punitiva dos pais (ao entender que seus atos narcísicos reduzam as condições de segurança e estabilidade da prole), restaurando ao filho além da sensação de justiça, mas um sentimento de reparação.
Por ser regida sob coordenadas singulares e egocêntricas, os filhos frutos de famílias narcisistas convivem frequentemente com a alienação parental por parte de um dos seus pais, como se natural fosse. Deste modo, a identificação e denuncia da ocorrência de tais práticas direcionaram o judiciário brasileiro a compreender que esta ação como uma responsabilidade civil, modificando então o entendimento e decisões dos julgados nas varas de família.
Por fim, a presente monografia utiliza de pesquisa bibliográfica e documental apoiada em jurisprudência, para a melhor alocação de ideias que possibilitassem a contribuição da construção textual deste trabalho acadêmico.
2. FAMÍLIA NARCISISTA
Ainda que para o antigo entendimento Direito brasileiro família seja o grupo social elementar, matrimonial e hierarquizada (tese esta que já fora superada face os novos paradigmas jurídicos de família far-se-á necessário entender que esta configuração social pode ser hospedeira de um ambiente disfuncional como o narcisista, onde pode haver existência da alienação parental, tendo como consequência o abandono afetivo aos integrantes desta configuração familiar.
A origem do termo narcisista advém do período pré-helênico, da mitologia Greco-Romana, cujo personagem, Narciso, creditava ter a necessidade em assumir o papel de centro do universo, e, por tal, era insensível ao sentimentos e dons alheios. Sua epifania advém da necessidade em assumir o papel de centro do universo.
Marquetti (2008, p11) então traz o entendimento do sacrifício de Narciso como um ato de renovação, uma vez que o modo distorcido como o personagem enxergava a realidade acabava por ofender a imagem das pessoas ao seu redor, visto que a ausência exacerbada de sentimentalismo do personagem afetou a todos aqueles que dele se aproximava.
Há um canal de Youtube, de apresentação da psicoterapeuta Anahy D’Amico, que explica sobre a forma como a mãe narcisista inverte a responsabilidade de seus atos disfuncionais à prole como justificativa para exercer agressões psicológicas como ações putativas pelo comportamento aferido: “Ela projeta os traços ruins dela em você para negá-los nela e, assim, punir você”.
A agressão psicológica supracitada é um tipo de violência subjetiva por ser emocional, caracterizada pela ameaça, rejeição ou até humilhação por parte do despotismo do agressor para com a vítima.
Viegas (2010, p.17) diz que para estes casos é necessário observar as brechas educacionais existentes que levaram o agressor a assumir este comportamento, muitas vezes evidenciado pelo abandono psicológico que sofrera no passado. Logo, entende-se que o ambiente parental narcísico é cíclico e hereditário, havendo repetição dos atos nas gerações seguintes.
McBride (2011b) expõe sobre as evoluções acadêmicas acerca dos galhos da família narcisista, de modo a listar as dinâmicas de ocorrência deste relacionamento em conformidade a influência sobre a construção personalíssima do filho, aqui fruto do transtorno de uma infância insegura e infetuosa.
O narcisismo é entendido então como uma patologia (Transtorno da Personalidade Narcísica) sendo explicado pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais Nº5 da Associação Americana de Psiquiatria da seguinte forma:
Critérios Diagnósticos 301 81 {F6G.81}
Um padrão difuso de grandiosidade (em fantasia ou comportamento), necessidade de admiração e falta de empatia que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos, conforme indicado por cinco (ou mais) dos seguintes:
- Tem uma sensação grandiosa da própria importância (p. ex., exagera conquistas e talentos, espera ser reconhecido como superior sem que tenha as conquistas correspondentes).
- É preocupado com fantasias de sucesso ilimitado, poder, brilho, beleza ou amor ideal.
- Acredita ser “especial” e único e que pode ser somente compreendido por, ou associado a outras pessoas (ou instituições) especiais ou com condição elevada.
- Demanda admiração excessiva.
- Apresenta um sentimento de possuir direitos (i.e., expectativas irracionais de tratamento especialmente favorável ou que estejam automaticamente de acordo com as próprias expectativas).
- É explorador em relações interpessoais (i.e., tira vantagem de outros para atingir os próprios fins).
- Carece de empatia: reluta em reconhecer ou identificar-se com os sentimentos e as necessidades dos outros.
(2014, P. 669-670)
O texto extraído acima reafirma sobre o entendimento que as pessoas narcisistas carregam em si um sentimento de auto valoração, com a depreciação das contribuições, pensamentos, vontades e desejos de terceiros.
Como já explicado anteriormente, a pessoa narcísica tem dificuldade em perceber o outro como ser distinto, portador de necessidades e idiossincrasias e, por este motivo, atribui-lhes uma realidade que não lhes convêm para suprir a própria angústia, de modo a projetar sua rejeição e frustação na criança e no adolescente tutelado por ele.
2.1 A FAMÍLIA NARCISISTA E A ALIENAÇÃO PARENTAL
Superada a fase inicial de identificação prévia dos personagens narcisistas e de uma breve referência doutrinária, inicia-se então um novo ponto neste texto: Identificar de que modo a família narcisista poderá desencadear a alienação parental.
A Síndrome de Alienação Parental (SAP) é a tentativa de um dos pais em desqualificar o outro e a prática costuma se iniciar no momento de ruptura da vida conjugal quando um dos cônjuges não consegue digerir adequadamente o processo da separação.
Surge o desejo de vingança que desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex – parceiro. [...] A criança, que ama o seu genitor, é levada a afastar-se dele, que também a ama. Isso gera contradição de sentimentos e destruição do vínculo entre ambos. Restando órfão do genitor alienado, acaba identificando-se com o genitor patológico, passando a aceitar como verdadeiro tudo que lhe é informado. O detentor da guarda, ao destruir a relação do filho com o outro, assume o controle total. Tornam-se unos, inseparáveis. (DIAS, 2016, P. 907-908)
A partir dessa perspectiva torna-se mais claro a forma como um narcisista agirá dentro do ambiente familiar: o filho alienado passará a viver conforme as regras e decisões do genitor narcisista, vivendo sob um ambiente hostil e disfuncional, visto que o narcisista é incapaz de conviver com os estímulos externos. Deste modo, é seguro afirmar que as feridas narcísicas tendem a reviver de modo hereditário o comportamento de seus pais, com a possibilidade de reproduzir aos seus descendentes o mesmo comportamento alienador.
Em visão jurídica, em uma família narcisista é frequente observar a ocorrência de alienação parental, abandono afetivo e abando inverso, conforme defendem alguns doutrinadores, a exemplo de Flávio Tartuce (2016, p. 19 – 20). A partir do momento em que os pais enxergam a prole como uma breve extensão de si e não como indivíduos diferentes, acabam por dirigir a este infante todas as suas frustações, retirando deste o direito a sentimentos, pensamentos e vontades.
No direito brasileiro, a Alienação Parental é prevista na Lei 12 318/2010, tendo por objetivo a garantia da não ocorrência de prejuízos no desenvolvimento psicossocial do infante, sendo passível de responsabilidade civil dos infratores com sua prole. O Artigo 2º da referida Lei diz:
Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos pais, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. (BRASIL, 2010)
GARDNER (1977) em seu estudo à época percebeu a Alienação Parental em três níveis: leve, moderado e severo, sendo que no primeiro o menor ainda possui total contato com o genitor enquanto no último nível há o comportamento excludente, onde o infante renega o contato total de seu genitor, tendo sua ocorrência mais frequente em ambientes narcisistas.
2.2 A FAMÍLIA NARCISISTA E O ABANDONO AFETIVO
No ambiente disfuncional em estudo, é comum que o genitor narcisista utilize do medo como uma ferramenta para controle das ações dos filhos desde a sua infância, indo contrário ao que rege o sentido de um lar familiar.
A família não deve mais ser entendida como uma relação de poder, ou de dominação, mas como uma relação afetiva, o que significa dar a devida atenção às necessidades manifestas pelos filhos em termos, justamente, de afeto e proteção. Os laços de afeto e de solidariedade derivam da convivência e não somente do sangue. (TARTUCE, 2017, p. 20)
O abandono afetivo ocorre pelo fato de que o genitor narcisista, por repetir um comportamento hereditário e cíclico, escolhe um dos seus filhos para ser seu reflexo absoluto, concedendo-o privilégios sempre que este acate a tudo o que ela almeja.
Em contrapartida, o outro filho é tido como um bode expiatório, que sofrerá a parentalização, sofrendo punições sempre que qualquer tentativa de exercício de autonomia deste filho for frustrada. Deste modo, o narcisista acaba criando disputa entre os irmãos e rejeição entre o filho e o outro genitor, destruindo assim as relações familiares, pois penetra nos sentimentos negativos de seus filhos para que possa dominá-los e constrange-los a todo momento, como se natural fosse.
Assim, a convivência dos pais com os filhos não é um direito, é um dever. Não há o direito de visitá-lo, há a obrigação de conviver com eles. O distanciamento entre pais e filhos produz sequelas de ordem emocional e pode comprometer o seu sadio desenvolvimento. O sentimento de dor e de abandono pode deixar reflexos permanentes em sua vida. (DIAS, 2016, p. 164)
Tendo ciência da importância do afeto como elemento fundamental do conceito contemporâneo de família, o estudo acerca do abandono afetivo abrange duas asserções de destaque, sendo que a primeira asserção versa sobre a responsabilidade civil no Direito de Família, cuja qual Flávio Tartuce (2017, P. 174) defende a tese de relação paralela entre o Direito das Obrigações e o Direito de Família.
A segunda premissa advém do conceito de culpa pela responsabilidade civil, visto que, em conformidade ao Art. 186 do Código Civil de 2002, está inserida no ato ilícito em sentido lato sensu e, deste modo, acaba violando um direito, causando danos a outrem.
A consagração da dignidade humana como valor fundamental nas constituições do último século, associada à aplicação direta das normas constitucionais às relações privadas, veio exigir com força irresistível a ressarcibilidade, até então discutida, do dano extrapatrimonial. Embora de forma diferenciada, cada sistema jurídico passou, gradativa ou subitamente, a conceder reparação a lesões de interesses existenciais, antes considerados de forma meramente programática, como escopo de comandos dirigidos tão-somente ao legislador, inaptos a deflagrar direta proteção contra violações perpetradas pelo Estado ou por outros particulares (SCHREIBER, 2009, p. 87).
Em outras palavras, o abandono afetivo (ou abandono paterno-filial) diz respeito à responsabilidade civil por ferir o princípio da solidariedade familiar (Art. 3, I da Constituição Federal de 1988), por incidir de forma direta na dignidade da pessoa humana.
Não subestimo a força da convivência. Família é feita de presença mais do que de registro. Há pais ausentes que nunca serão pais, há padrastos atentos que sempre serão pais. Não existem pai e mãe por decreto, representam conquistas sucessivas. Não existem pai e mãe vitalícios. A paternidade e maternidade significam favoritismo, só que não se ganha uma partida por antecipação. É preciso jogar dia por dia, rodada por rodada. Já perdi os meus filhos por distração, já os reconquistei por insistência e esforço. (CARPINEJAR apud DIAS, 2016, P.10)
O afeto é entendido como elemento agregador ao Direito de Família, visto que se exige dos pais a não omissão do carinho e atenção como elementos necessariamente fundamentais para a formação da personalidade do filho.
Logo, a convivência de pais e filhos é uma obrigação:
O distanciamento entre pais e filhos produz sequelas de ordem emocional e pode comprometer o seu sadio desenvolvimento. O sentimento de dor e de abandono pode deixar reflexos permanentes em sua vida (DIAS, 2015, p. 164).
Em outras palavras, a não participação do genitor na vida do filho enseja consequências psicológicas que poderão interferir no desenvolvimento personalíssimo do filho.
2.3 A ALIENAÇÃO PARENTAL E O ABANDONO AFETIVO COMO CONSEQUÊNCIAS DA FAMÍLIA NARCISISTA
Ainda que para o Direito Brasileiro família seja definida como o grupo social elementar matrimonial e hierarquizado, far-se-á necessário entender que esta configuração social pode ser hospedeira de um ambiente disfuncional como o narcisista, onde poderá haver a predominância da alienação parental, tendo como consequência o abandono afetivo aos integrantes desta configuração familiar.
O abandono afetivo, como já visto, é a omissão de cuidado de um dos pais para com sua prole, que no caso do ambiente parental narcísico a conduta omissiva é compreendida pelo fato do narcisista se omitir e negligenciar qualquer tipo de convívio e afeto na vida de sua prole, por entender que estes não são sujeitos detentores de direitos, mas sim uma breve extensão de si.
Outro modo operante do genitor que tenha atitude narcisista com seus filhos se observa pela privação da criança ou adolescente do convívio com seu outro genitor. Por este motivo, sua prática está diretamente relacionada como consequência da alienação parental.
A forma como estes dois atos se relaciona com a família narcisista se dá ao fato de que a alienação parental tende a ocorrer como forma de vingança de um genitor para com o outro, de forma vexatória, em que o filho é usado como instrumento para o ato, não sendo levado em conta o sentimento ou pensamento do menor, face a toda a situação.
O artigo 1 634, inciso I do Código Civil Brasileiro de 2002 versa sobre a competência de ambos os pais, independentemente de sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar de modo saudável com o intuito do melhor desenvolvimento dos filhos.
Em outras palavras, o sentimento singular da mãe ou do pai narcisista prevalecerá sobre os desejos do filho, ainda que isto lhe cause algum transtorno psicológico, apenas com o objetivo de atingir ao então ex-cônjuge, praticando todos os atos necessários para que a comunicação e contato entre pai – filho seja de vez cessado.
Assim, atingido o objetivo de ruptura de contato afetivo, ver-se-á a desvalorização do afeto, de modo que a não convivência entre genitor e descente implicará em barreiras emocionais afetando o desenvolvimento psicossocial do infante.
Observada esta desconstrução afetiva, o ente narcisista irá manipular os pensamentos e ações de seu filho para garantir que este comece a agir como uma breve extensão de si, suprindo agora com as suas necessidades internas frustradas.
Devido à instabilidade emocional do ambiente em que vive, a criança e/ou adolescente alienado viverá constantemente com o abandono afetivo pelo dano psicológico que lhe é causado, não conseguindo assim construir a maturidade racional necessária para seu desenvolvimento.
A criança alienada então crescerá com o entendimento de que funcionalizar suas ações conforme a intenção de seus pais lhe trará por benefício a atenção destes, ainda que este comportamento lhe custe a autoestima e formação de uma personalidade singular.
3. A CONTRIBUIÇÃO DA PSICOLOGIA NO QUE TANGE A FAMÍLIA NARCISISTA
Freud (1914a, p. 85 - 119) aborda o narcisismo sob o aspecto libidinal do ego como fruto de auto valoração, resguardando o sujeito narcisista das consequências reais do mundo, atribuindo-lhe a capacidade de alienação aos demais.
O ambiente parental narcisista tem por personagem principal a figura de um dos pais que repete um comportamento cíclico e hereditário de auto valoração exacerbada, ocasionando um ambiente disfuncional aos seus filhos, por desvalorização de sua personalidade frente aos demais.
O filho aqui alienado tem suas opiniões e angustias minimizados pela falta de proteção de um dos seus pais, o que ocasiona uma distorção emocional devido a esta manipulação dos sentimentos, prejudicando assim na formação da personalidade do filho.
A pessoa narcísica tem dificuldade em perceber o outro como ser distinto, portador de necessidades e idiossincrasias e, por este motivo, atribui-lhes uma realidade que não lhes convêm para suprir a própria angústia, de modo a projetar sua rejeição e frustação na criança e no adolescente tutelado por ele, excluindo-o assim de convívio afetivo.
3.1 O TRANSTORNO DE PERSONALIDADE BORDERLINE COMO UMA POSSIBILIDADE PSICOLÓGICA À FAMÍLIA NARCISISTA.
Na imaturidade de um ambiente parental narcísico é possível encontrar a inversão da carga sentimental, onde os pais encontram em seus filhos refúgio para não enxergar a concretude das consequências de seus atos, deturpando - lhes a visão do mundo real, uma vez que projetam na prole uma forma de serem aquilo que não conseguiram ser, usando-os como medida para preencher seus próprios vazios.
Assim, os filhos têm dificuldade em confiar nas pessoas, criando um perfil complexo de transtorno de personalidade, já que cresceram sobre uma figura intimidadora, baseada na desvalorização e no controle, tornando-se refém dos próprios pais, conforme expõe Dalgalarrondo (2000, p.269) ao caracterizar a pessoa Borderline com o grupo da impulsividade e da manipulação que, por sua instabilidade psíquica, apresentam acentuados problemas de identidade associados à intensas crises de vazios existenciais.
Este comportamento pode ter como uma das consequências psicológicas a desenvolvimento do Transtorno de Personalidade de Borderline no filho alienado, visto que o infante realizará esforços exacerbados que evitem o abandono por parte de seus pais, repetindo assim um padrão de relacionamento instável caracterizado pela desvalorização própria, fruto da percepção deturpada da autoimagem, como diz Dalgalarrondo (2000, p.198): “o ambiente familiar é considerado como um dos possíveis fatores predisponentes à patologia Borderline”.
O Transtorno da Personalidade Borderline é um padrão de instabilidade emocional caracterizado pela distorção da autoimagem, tendo os seguintes fatos como ocorrência:
Critérios Diagnósticos 301 83 {F60.3}
- Esforços desesperados para evitar abandono real ou imaginado. (Nota: Não incluir comportamento suicida ou de automutilação coberto pelo Critério 5.)
- Um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos caracterizado pela alternância entre extremos de idealização e desvalorização.
- Perturbação da identidade: instabilidade acentuada e persistente da autoimagem ou da percepção de si mesmo.
- Impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente autodestrutivas (p. ex., gastos, sexo, abuso de substância, direção irresponsável, compulsão alimentar). (Nota: Não incluir comportamento suicida ou de automutilação coberto pelo Critério 5.)
- Recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de comportamento automutilante.
- Instabilidade afetiva devida a uma acentuada reatividade de humor (p. ex., disforia episódica, irritabilidade ou ansiedade intensa com duração geralmente de poucas horas e apenas raramente de mais de alguns dias).
- Sentimentos crônicos de vazio.
- Raiva intensa e inapropriada ou dificuldade em controlá-la (p. ex., mostras frequentes de irritação, raiva constante, brigas físicas recorrentes).
- Ideação paranoide transitória associada a estresse ou sintomas dissociativos intensos. Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade Borderline é um padrão difuso de instabilidade das relações interpessoais, da autoimagem e de afetos e de impulsividade acentuada que surge no começo da vida adulta e está presente em vários contextos.
Indivíduos com o transtorno da personalidade Borderline tentam de tudo para evitar abandono real ou imaginado (Critério 1). A percepção de uma separação ou rejeição iminente ou a perda de estrutura externa podem levar a mudanças profundas na autoimagem, no afeto, na cognição e no comportamento. Esses indivíduos são muito sensíveis às circunstâncias ambientais. Vivenciam medos intensos de abandono e experimentam raiva inadequada mesmo diante de uma separação de curto prazo realística ou quando ocorrem mudanças inevitáveis de planos. (2014, P. 663)
Ou seja, o indivíduo que tem o transtorno Borderline acredita que sempre será rejeitado, experimentando o frequente sentimento de abandono e rejeição e, por este motivo, tomam atitudes impulsivas à qualquer momento para evitar reviver esta sensação. Em outras palavras, o processo de estruturação da personalidade do ser é fruto do ambiente em que cresce e das relações que mantém, onde o seu estado flutuante de humor e percepção do mundo existentes no filho portador de Borderline é reflexo do ambiente em que se encontra, em que a negligência de um de seus pais gera estresse durante a primeira infância, tendo como consequência futura a própria sabotagem na vida adulta.
3.2 A POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO AO DANO CAUSADO PELO EXERCÍCIO NARCISISTA DO PODER FAMILIAR ABUSIVO
O poder familiar é um direito subjetivo que se firma pela premissa do dever de cumprir com as obrigações do âmbito patrimonial de forma responsável e dentro daquilo que regem as diretrizes constitucionais. Ao momento em que o exercício de poder parental é exercido de forma disfuncional pelo genitor, há o abuso de direito face a personalidade jurídica e os direitos fundamentais de seus descendentes.
Outrossim, este desvio de finalidade ocasionado pela conduta do ente narcisista é considerado como ato ilícito pelo artigo 187 do Código Civil de 2002 por, além dos atos praticados produzirem um dano ao filho alienado, também ultrapassam a tenuidade da normalidade.
Desta forma, é seguro afirmar que aqueles que detém o poder familiar, quando sujeitos ativos em situações que excedam as práticas parentais socialmente esperadas – como a oferta do afeto, respeito mútuo e de ambiente seguro e tranquilo que possibilite a construção de personalidade do ser, no caso em tela, personificado pelo filho –, estarão sujeitos a sanções civis (conforme aquilo que rege o artigo 187 e o artigo 1.630 do Código Civil), por comprometerem o bem-estar psicossocial do menor.
Ou seja, ao momento em que um dos pais não proporciona a oportunidade de desenvolvimento dos seus filhos, inviabilizando a edificação da liberdade singular do ser, por decorrência de práticas narcísicas como o abandono afetivo, este genitor poderá responder judicialmente sobre a negligência de sua responsabilidade civil.
Logo, em paridade ao entendimento de que as práticas narcisistas no ambiente parental ocasionam danos psíquicos que, se não tratados poderão suceder em cadeia nas novas conjunções familiares, a disciplina positiva surge como uma abordagem humanizada desenvolvida a partir dos estudos do psicólogo Alfred Adler e do psiquiatra Rudolf Dreikus, que tem por objetivo melhorar a relação entre pais e filhos através do diálogo e do respeito entre as partes, sem manipulações ou comportamentos violentos que tivessem por finalidade a repreensão das crianças sobre suas próprias liberdades, respeitando os limites saudáveis dos envolvidos, devolvendo ao infante sua posição de sujeito detentor de direitos.
4. A PROTEÇÃO JURÍDICA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
No período colonial brasileiro, crianças e adolescentes não eram entendidos como seres detentores de direito, mas sim como uma extensão objetificada dos direitos do pai.
Quando não, estes eram vistos como um estorvilho a ser resolvido, seguindo os mesmos regimentos de torturas e correções físicas que eram destinados aos adultos infratores.
À época, a maioridade cívica e penal era atingida aos 14 anos no caso dos meninos e aos 12 para as meninas. Por este motivo, as crianças e adolescentes eram vistos como adultos para práticas matrimoniais e laborais, o que explica a frequência do trabalho infantil à época. Assim, como já dito, aqueles considerados menores de idade não eram vistos como sujeitos de direito.
Aqueles filhos que estivessem inseridos na parte mais alta da sociedade tinham a possibilidade de reconhecimento indenitário enquanto os demais viviam sob a estigma de delinquentes. Esta situação só foi modificada em período posterior ao Código Civil Brasileiro de 1916 (por este ainda não compreender os infantes como detentores de direito), com a vigência da atual Carta Magna, que inaugurou a Doutrina da Proteção Integral.
Em 1927 o Código de Menores foi criado como o primeiro documento legal que versasse sobre os menores de idade à época. Todavia, este código tutelava apenas sobre uma parcela das crianças e dos adolescentes, sendo aqueles em situação jurídica irregular, colocando-os sob o mesmo regimento, independentemente das condições privativas em que se encontravam.
Em 1942 fora criado o Serviço de Assistência ao Menor para tratar, de forma putativa, os menores infratores. Com o advento da Constituição Federal de 1967, o regime militar criou a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor como uma instituição de assistência à infância e juventude, que ainda assim, tinha suas deficiências políticas para resolução dos problemas envoltos na marginalização do menor, que resultou na formulação do Novo Código de Menores em 1979, cujas modificações serviram unicamente para a assistência do menor em situação irregular.
A criação da Constituição Federal de 1988 trouxe aos olhos do direito brasileiro a Doutrina de Proteção Integral, influenciada pela Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959 e pela Convenção dos Direitos da Criança e trazia agora os artigos 227 ao 230 como emendas do infante, apresentando então o Princípio da Proteção Integral que entendia que toda a criança e adolescente seriam pessoas de direitos em fase de desenvolvimento, detentoras de garantias fundamentais.
A regulamentação dos dispositivos fundamentais constitucionais do menor foi concretizada pela criação da Lei Nº 8 069 de 1990 que versava agora sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e, conforme o exposto no Artigo 1º do referido Código: “dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente”.
O Artigo 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente é o dispositivo mais importante de todo o Código por dispor que:
Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, artigo 5, 1990)
No seio familiar, a omissão é percebida por negligência (quando os pais não suprem com as necessidades dos filhos) ou abandono (ausência da presença dos pais na vida dos filhos). O Código Civil de 2002 traz agora o exercício do poder familiar como meio garantidor dos direitos das crianças e dos adolescentes.
O artigo 227 da Constituição Federal de 1988 versa sobre a criança e ao adolescente como sujeitos de direito e garantias, independentemente de serem frutos ou não do casamento, devendo estes estarem em conformidade com os preceitos do princípio da proteção integral, que proíbe toda e qualquer forma de negligência, cabendo a família e a sociedade o dever de cumprimento das garantias constitucionais, refirmando o princípio da dignidade humana no Artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente.
É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, Artigo 227, caput, 1988)
De mesmo modo, o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 20 diz que todos os filhos, independentes de serem ou não frutos da conjunção matrimonial, não podem sofrer atos discriminatórios quanto aos demais irmãos.
4.1 PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
O direito de desenvolvimento sadio e harmonioso, assim como a segurança familiar são previstos nos artigos 7º e 19º do Estatuto da Criança e do Adolescente, assim como o artigo 1.566, IV do Código Civil e o artigo 4º do ECA reafirmam à família (os pais) a obrigação quanto ao sustento, guarda e educação dos filhos.
O direito à convivência familiar saudável se enquadra na proteção integral por entender a criança e ao adolescente como sujeitos detentores da dignidade da pessoa, sendo estes, pessoas de direito que não podem sofrer qualquer tipo de discriminação quanto a sua filiação, como observado no artigo 15º do Estatuto da Criança e do Adolescente:
A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito, e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas Leis. (Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 15º, 1990)
O filho que sofrerá a parentalização, acabará sofrendo punições sempre que este tentar qualquer exercício de autonomia, como a expressão de pensamentos e tomada de decisões próprias. Deste modo, o narcisista acaba criando disputa entre os irmãos e rejeição entre o filho e o outro genitor, destruindo assim as relações familiares, pois penetra nos sentimentos negativos de seus filhos para que possa dominá-los e constrange-los a todo momento, como se natural fosse.
Afirma-se então que a convivência de pais e filhos é uma obrigação, como diz DIAS (2016, P.164): “O distanciamento entre pais e filhos produz sequelas de ordem emocional e pode comprometer o seu sadio desenvolvimento. O sentimento de dor e de abandono pode deixar reflexos permanentes em sua vida”.
Em outras palavras, a não participação do genitor na vida do filho enseja consequências psicológicas que poderão interferir no desenvolvimento personalíssimo do filho.
O ônus da responsabilidade civil de participação ativa na vida dos filhos é de ambos os pais, não sendo este divisível, visto que a ausência ou falta de um dos pais no processo de formação de personalidade da criança e do adolescente implica diretamente na prática do delito de abandono imaterial.
Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Adoção. Intimação do Ministério Público para audiência. Art. 166 da Lei 8.069/1990. Fim social da lei. Interesse do menor preservado. Direito ao convívio familiar. Ausência de prejuízo. Nulidade inexistente. Não se declara nulidade por falta de audiência do Ministério Público se – a teor do acórdão recorrido – o interesse do menor foi preservado e o fim social do ECA foi atingido. O art. 166 da Lei 8.069/1990 deve ser interpretado à luz do art. 6.º da mesma lei (STJ. RECURSO ESPECIAL. REsp 847 597-SC, Relator: Ministro
Humberto Gomes de Barros. Terceira Turma. Data do julgamento: 06.03.2008).
Como visto no julgado do STJ, o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente é, portanto, uma proteção assegurada conforme vista no Artigo 3º do ECA, no momento em que se reconhece o menor como detentor de direitos fundamentais à pessoa humana, sob perfeitas condições de resguardo da liberdade e da dignidade.
O Artigo 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente versa sobre o direito ao respeito do menor, conforme exposto abaixo:
O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais. (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 1990)
Contudo, apesar do que tange o artigo 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o ente narcisista, de modo frequente e duradouro, irá violar de forma abusiva a integridade psíquica e moral do filho, cujas consequências se assemelham, em gravidade, às sequelas de agressões físicas, qualificando assim os danos psicológicos.
Em suma, o abuso psicológico narcisista advém do genitor que deveria cumprir com a obrigação de proteção integral e garantir a efetivação de todos os direitos de sua prole, mas que, e que na realidade, é quem manipula os sentimentos e memórias do menor em questão.
5. A JUDICIALIZAÇÃO DO AFETO E A INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COMO MEDIDA REPARADORA AO ABANDONO AFETIVO
Por mais que não se exista a obrigação do amor, o convívio e a participação do genitor na vida do filho é obrigação jurídica e, o não cumprimento deste vínculo possibilita o pedido da reparação pecuniária pelo novo dano, neste caso o abandono afetivo.
O abandono afetivo, ou abandono paterno-filial caracteriza um novo paradigma jurídico da responsabilidade civil, assumindo o perfil de um novo tipo de dano, visto que o ato fere o princípio da solidariedade social e familiar, prevista no art. 3º, inc. I, da Constituição Federal.
A Responsabilidade Civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal (DINIZ, 2007, P.35).
Logo, a responsabilidade civil é o modo de reparação que alguém tenha causado a outrem. No caso do exposto nesta monografia, a responsabilidade civil será subjetiva, acerca a omissão do agente que causará um dano psicológico.
Em 2009, a Quarta Turma do STJ negou possibilidade de indenização por abandono afetivo por entender que o Poder Judiciário não poderia impor relação afetuosa tampouco existiria validação positiva de relacionamento com o ajuizamento da ação, não existindo assim possibilidade de reparação, conforme se vê abaixo:
ABANDONO MORAL. REPARAÇÃO. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. Trata-se de ação de investigação de paternidade em que o ora recorrente teve o reconhecimento da filiação, mas o Tribunal a quo excluiu os danos morais resultantes do abandono moral e afetivo obtidos no primeiro grau. A Turma entendeu que não pode o Judiciário compelir alguém a um relacionamento afetivo e nenhuma finalidade positiva seria alcançada com a indenização pleiteada. Assim, por não haver nenhuma possibilidade de reparação a que alude o art. 159 do CC/1916 (pressupõe prática de ato ilícito), não há como reconhecer o abandono afetivo como dano passível de reparação. Logo a Turma não conheceu do recurso especial (STJ. RECURSO ESPECIAL. Precedente citado: REsp 757 411-MG. Data de julgamento: 27.03.2006. REsp 514 350- SP. Quarta Turma. Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior. Data do Julgamento: 28.04.2009).
Sendo este o caso pioneiro deste tipo de pedido no STJ, o entendimento do abandono afetivo como um dano a ser reparado ainda era quase inexistente, devido ao fato da Quarta Turma do STJ entender que afeto não se era passível de obrigação jurisdicional. Por tal, o pedido foi indeferido por não reconhecer qualquer tipo de responsabilidade pecuniária quanto ao afeto, conforme supracitado, uma vez que, este tipo de causalidade ainda não era compreendido como objeto de estudo para fins jurídicos e, por tal, não se existia uma relação da falta de afeto como um tipo de dano causado a outrem.
A tese do abandono afetivo como responsabilidade civil é defendida pelo jurista Rodrigo da Cunha Pereira (2017), que explicita sobre a gravidade das consequências psíquicas fruto do abandono afetivo, jurisdicionalizando assim o assunto como tema a ser abordado no Direito de Família contemporâneo.
Aqui, não se objetiva a monetarização do afeto, mas do reconhecimento de que o sentimento afetivo é um bem jurídico de valor irreparável. A família narcisista, ao restringir ou excluir a criança e/ou o adolescente de seu convívio social familiar, caracteriza um dano psicológico, conforme previsto no artigo 952, parágrafo único do Código Civil de 2002.
O objetivo da indenização por abandono afetivo em uma família narcisista não é obrigar os pais a ter afeto com o filho, mas sim reparar as consequências morais que o abandono traz, devolvendo ao filho uma breve sensação de justiça.
Assim, o Direito de Família permite a releitura das relações parentais além do material para os vínculos afetivos, além dos laços consanguíneos. A abordagem das questões afetivas nas varas de família tem por objetivo buscar meios que possam moderar o desamparo moral sofrido. O prazo para esta reparação moral através de uma ação indenizatória é a partir do momento em que o adolescente atinge 18 anos completos até os três anos sequentes.
O Ministro Fernando Gonçalves, no Recurso Especial Nº 757411, deu por conhecido e provido a decisão:
EMENTA RESPONSABILIDADE CIVIL. ABANDONO MORAL. REPARAÇÃO. DANOS MORAIS. IMPOSSIBILIDADE. 1. A indenização por dano moral pressupõe a prática de ato ilícito, não rendendo ensejo à aplicabilidade da norma do art. 159 do Código Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz de reparação pecuniária. 2. Recurso especial conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, conhecer do recurso e lhe dar provimento. Votou vencido o Ministro Barros Monteiro, que dele não conhecia. Os Ministros Aldir Passarinho Junior, Jorge Scartezzini e Cesar Asfor Rocha votaram com o Ministro Relator. Brasília, 29 de novembro de 2005 (data de julgamento). MINISTRO FERNANDO GONÇALVES, Relator. (STJ. RECURSO ESPECIAL 757 411- MG 2005/0085464-3, Relator: Ministro Fernando Gonçalves. Quarta Turma. Data de Julgamento: 29 nov.2005).
Ainda no mesmo Recurso Especial supracitado, o voto do Sr. Ministro Barros Monteiro deu seu parecer de modo favorável a indenização por dano moral no caso:
Sr. Presidente, rogo vênia para dissentir do entendimento manifestado por V. Exa. e pelos eminentes Ministros Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini. O Tribunal de Alçada de Minas Gerais condenou o réu a pagar 44 mil reais por entender configurado nos autos o dano sofrido pelo autor em sua dignidade, bem como por reconhecer a conduta ilícita do genitor ao deixar de cumprir seu dever familiar de convívio e afeto com o filho, deixando assim de preservar os laços da paternidade. Esses fatos são incontroversos. Penso que daí decorre uma conduta ilícita da parte do genitor que, ao lado do dever de assistência material, tem o dever de dar assistência moral ao filho, de conviver com ele, de acompanhá-lo e de dar- lhe o necessário afeto. Como se sabe, na norma do art. 159 do Código Civil de 1916, está subentendido o prejuízo de cunho moral, que agora está explícito no Código novo. (STJ. RECURSO ESPECIAL 757 411- MG 2005/0085464-3, Relator: Ministro Fernando Gonçalves. Quarta Turma. Data de Julgamento: 29 nov.2005).
Assim, conforme exposto acima nos votos dos ministros no Recurso Especial 757 411 – MG, é seguro afirmar que a necessidade de provimento reparatório sobre o abandono afetivo está além da associação pecuniária, mas sim de uma retratação fidedigna à moral do filho, por este ter tido seu direito de convivência com seu genitor invalidado.
A indenização por abandono afetivo ainda é muito controversa no âmbito do Direito de Família Brasileiro, uma vez que o entendimento do STJ (Recurso Especial 757 411/MG, em 29 de novembro de 2005) diz que a situação não é vista como capaz de gerir algum tipo de reparação pecuniária, visto a ausência de ato ilícito, pois a condição do amor ao filho não é uma obrigação. Do mesmo modo, não é passível de reparação por danos morais por abandono afetivo o genitor que não possuía conhecimento prévio da existência do filho.
Daí a tendência jurisprudencial em reconhecer a responsabilidade civil do genitor por abandono afetivo, em face do descumprimento do dever inerente à autoridade parental de conviver com o filho, gerando obrigação indenizatória por dano afetivo. A omissão de garantir-lhe a sobrevivência, deixando imotivadamente de pagar os alimentos, configura o delito de abandono material (CP 244) (DIAS, 2016, P.788).
Ainda que não aceito por todos os juízes, dando margem a livre interpretação em julgado, a prática de abandono afetivo é passível de indenização por aferir danos extrapatrimoniais, sob julgamento da esfera cível, uma vez que o ato de indenizar não supre a afetividade, servindo somente como uma forma de compensação indenizatória ao filho abandonado efetivamente.
Por outro lado, o Art. 1.634 do Código Civil/ 2002 é claro quanto a obrigação do poder familiar em ter os filhos em seu convívio, com observância ao que tange a Constituição Federal Brasileira sobre o dever dos pais “ Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores” (Art. 229 da Constituição Federal de 1988). Deste modo, comprovado o abandono afetivo ao filho menor, configura-se ato ilícito, sob previsão legal do Art. 186 do Código Civil Brasileiro.
Para DIAS (2016, P.164): “A omissão do genitor em cumprir os encargos decorrentes do poder familiar, deixando de atender ao dever de ter o filho em sua companhia, produz danos emocionais merecedores de reparação”.
É seguro afirmar que a não presença do genitor no convívio do filho, participando ativamente de suas escolhas e vivências acarretam consequências psicológicas que interferem no desenvolvimento da personalidade do ser e, por tal, são dignas de reparação pecuniária.
Shcreiber (2009, P.81) reafirma que a falta da demonstração de culpa, restava à vítima o abandono jurídico pelo não reconhecimento de compensação pecuniária pelo dano. Todavia, o avanço da interpretação jurídica no Direito de Família, possibilitou uma jurisdição favorável dos Tribunais para reparação por abandono afetivo, por entender este como um novo tipo de dano.
Assim, a tutela da dignidade humana como norma regente constitucional, passou então a assumir papel reparatório sempre que ferisse a integridade psicofísica (dano não patrimonial) da vítima, neste caso, o filho.
Ou seja, a ação pecuniária de danos morais por abandono afetivo, se deve pela formação de dano à personalidade, princípio assegurado constitucionalmente.
Em outras palavras, o abandono afetivo (ou abandono paterno-filial) diz respeito à responsabilidade civil por ferir o princípio da solidariedade familiar (Art. 3, I da Constituição Federal de 1988), por incidir de forma direta na dignidade da pessoa humana.
No Recurso Especial 514 350 – SP da Quarta Turma do STJ anteriormente citado observa-se que o abandono afetivo ainda não era entendido como um dano (tese que passou a ser defendida por doutrinadores somente a partir de 2010), mas sim como uma tentativa de atenção para o pai por parte do filho.
O caso mais conhecido no cenário jurídico brasileiro de indenização por danos morais em caso de abandono afetivo ocorreu em Minas Gerais, quando o analista de sistemas Alexandre Batista Fortes, provocou pela primeira vez o Supremo Tribunal Federal (STF) em 2000 face ao seu genitor, pedindo à época o valor de R$52 mil (200 salários mínimos).
Após este caso, abriu-se então jurisprudência para que outros pudessem surgir, restando esperança aos filhos que sofreram abandono afetivo por parte de seus pais. Todavia, após o ano de 2002 é que o abandono afetivo é entendido como novo tipo de dano, sendo assim, passível de indenização. Por tal, os julgados analisados aqui estão no intervalo de tempo do ano de 2002 a 2020.
Entretanto, em 2005, o STJ reformulou a decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais ao negar obrigação de indenizar por abandono afetivo, sob perspectiva de ausência de ato ilícito, uma vez que o genitor não tem a obrigação de amar o filho, ainda que o artigo 229 da Constituição Federal seja claro no que diz sobre o dever dos pais em assistir e criar os filhos, reafirmando assim o dano causado ao filho, estando em conformidade com o artigo 186 do Código Civil.
Em notório avanço da percepção sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça admitiu a reparação civil pelo abandono afetivo em 2012, conforme ementa publicada:
Civil e Processual Civil. Família. Abandono afetivo. Compensação por dano moral. Possibilidade. 1. Inexistem restrições legais à aplicação das regras concernentes à responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar no Direito de Família. 2. O cuidado como valor jurídico objetivo está incorporado no ordenamento jurídico brasileiro não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227 da CF/1988. 3. Comprovar que a imposição legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão. Isso porque o non facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e companhia – de cuidado –, importa em vulneração da imposição legal, exsurgindo, daí, a possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico. 4. Apesar das inúmeras hipóteses que minimizam a possibilidade de pleno cuidado de um dos pais em relação à sua prole, existe um núcleo mínimo de cuidados parentais que, para além do mero cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto à afetividade, condições para uma adequada formação psicológica e inserção social. 5. A caracterização do abandono afetivo, a existência de excludentes ou, ainda, fatores atenuantes
– por demandarem revolvimento de matéria fática – não podem ser objeto de reavaliação na estreita via do recurso especial. 6. A alteração do valor fixado a título de compensação por danos morais é possível, em recurso especial, nas hipóteses em que a quantia estipulada pelo Tribunal de origem revela-se irrisória ou exagerada. 7. Recurso especial parcialmente provido (STJ. RECURSO ESPECIAL. REsp 1 159 242/-SP. Relator: Ministra Nancy Andrighi. Terceira Turma. Data de Julgamento:24 abr.2012).
Deste modo, é seguro afirmar que após o julgamento do REsp. 1 159 242/SP em 2012 o STJ assumiu em julgados a admissão da reparação imaterial por abandono afetivo, visto que agora este é entendido como novo paradigma de dano na Responsabilidade Civil do Direito de Família, permitindo assim uma maior segurança jurídica para esta consequência de um ambiente parental narcísico.
O julgado mais recente sobre danos morais por abandono afetivo aconteceu em Brasília, no presente ano de 2020, estando o julgado em trânsito até a data de conclusão desta monografia, conforme ementa abaixo:
Apelação cível. Investigação de paternidade C/C alimentos e danos morais por abandono afetivo – sentença de parcial procedência. Insurgência da autora. Alimentos ficados em 107% do salário mínimo nacional – necessidade superior ao valor arbitrado demonstrada – necessidade de distribuição do encargo entre os pais segundo as suas possibilidades – fixação de alimentos em 130% do salário mínimo nacional – valor que atende aos critérios da proporcionalidade e razoabilidade. Pretensão de arbitramento de indenização de danos morais pelo abandono afetivo – acolhimento – genitor que, embora ciente da paternidade, não registrou a filha e se limitou a prestar alimentos – tratamento dispensado à autora que não condizia com aquele ofertado ao restante da prole – distinção decorrente da relação concubinária mantida com sua genitora – abandono afetivo configurado no caso concreto – violação aos direitos da personalidade da autora – reparação devida. Indenização arbitrada em R$ 150.000,00. Recurso parcialmente provido. Ônus de sucumbência redistribuídos (STJ Agravo em Recurso Especial. AREsp: 1.430.05-PR 2019/0010072-4, Relatora: Ministra Maria Isabel Gallotti. Data Julgamento: 25 mar.2020).
A decisão monocrática da relatora do caso acima exposto, a Ministra Maria Isabel Gallotti, apesar da ofensa alegada pela parte autora, a ausência afetiva não pode ser reparada de forma pecuniária. Contudo, a mesma redireciona os autos sob a alegação de que o caso em questão deve ser melhor analisado pela Corte Superior.
O caso com maior visibilidade da indenização por danos morais por abandono afetivo surgiu na 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que condenou um pai a pagar o valor de R$49,9 mil (50 salários mínimos) de indenização ao seu filho fruto de uma relação extraconjugal. Esta decisão recente evidência ainda mais a importância da reparação pecuniária face as consequências emocionais do abandono afetivo.
Para o relator do caso, o Desembargador Evandro Lopes da Costa Teixeira, não convívio do genitor com seu filho de modo intencional violou o direito de convivência familiar previsto no Art. 227 da Constituição Federal de 1988, sendo que a omissão da convivência na vida filho é característica marcante de um lar narcisista. Neste caso, a prática narcísica surge do pai pelo fato deste recursar-se a registrar a filha para que o fato não prejudicasse a sua imagem pessoal.
Assim, o abandono afetivo surge na alienação narcisista ao infante pelo dano de natureza psicológica que lhe é causado, passível de indenização para reparação deste dano, configurando assim a responsabilidade civil do genitor, por entender que, embora o narcisismo seja considerado um transtorno psíquico de auto valoração em detrimento aos sentimentos dos demais envolvidos nesta teia familiar disfuncional, não há excludente de ilicitude, não podendo então romper com o papel de indenizar.
6. ANÁLISE DE JULGADOS SOBRE ALIENAÇÃO PARENTAL CORRELACIONADOS À FAMÍLIA NARCISISTA
Tendo em vista que o indivíduo narcísico age sob forte egoísmo, após a separação este sujeito passará a conviver sob uma forte frustração por não ter conseguindo manter de forma sustentável seu matrimônio, a fim de preservar a postura social que almejava. Deste modo, o ato do divórcio servirá como gatilho para que o narcisista, em ato de auto valoração, comece a enxergar o antigo cônjuge e a criança como breves extensões de si, negando a estes sujeito as suas individualidades.
Por entender a criança como fruto de seu próprio ensejo, o ente narcisista, através de manipulação de contato e informações sobre o genitor, passará a reproduzir em sua prole seus sentimentos narcísicos primitivos, violando os direitos deste infante, negligenciando assim o sofrimento parental do filho.
Dispõe o artigo 2º da Lei Nº 12 318 de 2010 sobre a alienação parental:
Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos pais, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. (BRASIL, 2010)
Em outras palavras, é a conduta que dificulta a convivência da criança ou do adolescente com seu genitor, utilizando o filho como objeto, visando ter a finalidade de atingir o ex cônjuge.
Frequentemente, nas disputas de custódia, especialmente quando não existe a adoção consensual do sistema de guarda compartilhada, essa nefasta síndrome se faz presente, marcando um verdadeiro fosso de afastamento e frieza entre o filho, vítima da captação dolosa de vontade do alienador, e o seu outro genitor. (GAGLIANO, 2019, P.657)
De igual modo, os artigos 6º, inciso V e 7º da referida Lei ainda asseguram sobre a possibilidade de guarda compartilhada a fim de garantir uma parentalidade equilibrada.
Civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Recurso manejado sob a égide do NCPC. Família. Direito de visitação de filho menor. Direito assegurado pela justiça. Dificultação injustificada da visitação. Aplicação de multa. Alegação de aplicação indevida, pois não praticou ato de alienação parental. Indispensável reexame do conjunto fático-probatório dos autos. Incidência da Súmula Nº7 do STJ. Tese de aplicação antecedente de advertência antes da multa. Deficiência na fundamentação. Incidência, por analogia, da Súmula Nº 284 do STF. Agravo interno não provido.
- Aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos no Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
- O Tribunal local, com base no conjunto fático-probatório dos autos, concluiu pela necessidade de fixação de astreintes para o caso de descumprimento da ordem judicial. A revisão desse entendimento esbarra na Súmula nº 7 do STJ.
- Ausente o prequestionamento do preceito legal dito violado, sem que a parte tenha oposto embargos de declaração, tem aplicação a Súmula nº 282 do STF.
- Caracterizada a deficiência da fundamentação recursal, pois apresentada de forma genérica e inconsistente e apenas no capítulo do pedido final do recurso especial, é de rigor a aplicação da Súmula nº 284 do STF.
- Agravo interno não provido.
(AgInt no AREsp 898.302/RJ, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA
TURMA, julgado em 07/03/2017, DJe 20/03/2017)
O recurso supracitado refere-se ao pedido de tutela antecipada do genitor em desfavor à sua ex-cônjuge, por afirmar este que teve o contato e convívio com sua prole dificultados pela ex companheira como forma de vingança por não ter aceitado com facilidade a fase processual do divórcio. Este comportamento configura perfeitamente a ação de uma pessoa narcisista, visto que esta utiliza de seu filho como objeto para atingir o seu objetivo de atingir o ex companheiro, sem considerar os sentimentos do menor.
Analisa-se também o Embargo de Declaração abaixo que versa sobre a mudança de domicílio da detentora da guarda com o objetivo de dificultar ainda mais o convívio do genitor com seu filho.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. OMISSÃO. CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. AÇÃO DE MODIFICAÇÃO DE GUARDA. AÇÃO PROPOSTA ONDE O DETENTOR DA GUARDA NÃO MAIS TEM DOMICÍLIO. ENVIO DOS AUTOS PARA O JUÍZO COMPETENTE. INEXISTÊNCIA DE CONFLITO.
- Consoante se verifica das informações prestadas pelos Juízos suscitados, não há discrepância de entendimento acerca da competência para julgamento da ação de modificação de guarda, não restando configurada qualquer das hipóteses do art. 115 do Código de Processo Civil.
- No caso, tendo a detentora da guarda se mudado para outra comarca, a propositura da ação de modificação de guarda, ajuizada pelo pai nesse mesmo período, lá deveria ter se dado, consoante entenderam os Juízos suscitados. Não se trata de mudança de endereço depois de proposta a ação e efetivada a citação. Incidência do art.147, I, do Estatuto da Criança e do Adolescente.
- Os conflitos de competência apontados pelo embargante como representativos da jurisprudência desta egrégia Corte, tratam, na realidade, de hipóteses excepcionais, em que fica clara a existência de alienação parental em razão de sucessivas mudanças de endereço da mãe com o intuito exclusivo de deslocar artificialmente o feito, o que não ocorre nos autos.
- Desta forma, ausente qualquer equívoco manifesto no julgado, tampouco se subsumindo a irresignação em análise a alguma das hipóteses do art. 535 do CPC, não merece ressonância a insurgência em questão.
- Embargos de declaração rejeitados.
(STJ. EMBARGO DE DECLARAÇÃO NO CONCFLITO DE COMPETÊNCIA.
EDcl no CC 108 689-PE. Relator: Ministro Raul Araújo. Segunda seção. Data de Julgamento: 10 nov.2010)
Por entender que o filho é parte de sua posse e não detentor de direitos, o ente narcisista coisifica então a relação paterno-filial de modo a dificultar o semeio do relacionamento dos pais com seus descendentes.
Este fato é melhor entendido pelo Artigo 6º da Lei de Alienação Parental:
Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso:
- - Declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;
- - Ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; III - estipular multa ao alienador;
- - Determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
- - Determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão;
- - Determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; VII - declarar a suspensão da autoridade parental.
Parágrafo único. Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar.
É seguro afirmar então que, frustradas condições familiares seguras de desenvolvimento e convívio da criança e do adolescente com seu genitor, pode implicar na suspensão do poder familiar, que tem seu tempo de ação enquanto julgar-se necessário, podendo inclusive, estender-se à maioridade cívica do filho.
A prática da alienação parental pode implicar no estabelecimento de uma sanção pecuniária que garantisse a não realização deste comportamento nocivo por parte de um ente narcisista por entender que o ato deste acaba por gerar atos nocivos à saúde mental do infante.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O narcisismo patológico usado como tema central deste trabalho acadêmico enseja atenção de equipe multidisciplinar para reconhecimento das causas e consequências que este indivíduo pode oferecer em um lar.
Por manter a própria imagem distorcida, a figura narcísica não entende as outras pessoas como detentoras de direito e portadoras da dignidade humana. Por este motivo, torna-se comum que use de meios psicológicos para manipular a prole garantindo a efetivação de seus próprios desejos e vontade.
Sendo o narcisismo entendido com um distúrbio de personalidade, a família narcisista carrega marcas ocultas sobre os traumas psicológicos sob os quais todos os envolvidos nesta teia familiar estão passíveis de sofrer.
Se os filhos, por manipulação desproporcional de um dos seus pais, reagem dentro de um conjunto de regras veladas que almejem o bloqueio ao convívio com seu outro genitor, passarão então a sobreviver à sombra da existência do ente narcisista, despindo-se então de sua personalidade singular para coexistir em função da auto valoração de seu manipulador.
A dificuldade em transpor afeto aos demais, proporciona um ambiente disfuncional e degradante aos integrantes desta configuração familiar, onde o exercício da valoração singular do ente narcisista é obrigatório a todos os envoltos.
Desta forma, fica evidenciada o modo como a prática egoísta e narcísica dos pais acaba por negligenciar seus descendentes, visto que estes não serão vistos como sujeitos detentores de direitos, sendo então obrigados ao convívio em um ambiente parental disfuncional que em nada agregará à formação de personalidade do ser em questão.
Por manter seus interesses acima dos sentimentos e vontades dos demais, o narcisista provoca a alienação parental em seus filhos face seu ex-cônjuge, resultante o abandono afetivo como final desta relação.
Este comportamento acarreta em transtorno psicológicos, como a síndrome de Borderline, que configura um novo tipo de dano aos olhos do direito civil: o dano imaterial subjetivo.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, assim como a Constituição Federal e o Código Civil Brasileiro versam sobre medidas protetivas à integridade física e moral do infante, a fim de garantir-lhes um melhor desenvolvimento psicossocial, com a doutrina da proteção integrada.
Alguns doutrinadores já dissertam acerca dos prejuízos oferecidos em um ambiente narcisista. Todavia, essa nova configuração familiar ainda é muito nova e pouco abordada aos olhos do direito, com escassez de julgados que garantam melhor segurança jurídica às crianças e adolescentes crescidos nestes ambientes.
Outrossim, a jurisprudência brasileira avança quanto aos novos entendimentos sobre os danos decorrentes desta nova configuração familiar disfuncional, com novos entendimentos de doutrinadores acerca da afetividade e da possibilidade de indenização pela prática narcísica, por compreender que esta acarreta um novo tipo de dano: o psicológico, que poderá interferir com sequelas no desenvolvimento do infante, ferindo princípios constitucionais.
Por fim, conclui-se que a família narcisista deve ser tratada além do que rege o direito de família, mas sim com políticas públicas que atendam às múltiplas necessidades e realidades desta comum, mas não debatida, nova formação parental, a fim de garantir um ambiente seguro, saudável e respeitoso para o desenvolvimento do infante no seio familiar, tendo a disciplina positiva como possibilidade de compensação do dano extrapatrimonial psicológico como forma alternativa àquela da judicialização do afeto, ainda que para o direito brasileiro, conforme analisado nos julgados expostos, a readaptação positiva de conduta não seja percebida como uma possibilidade às questões transcorridas desta nova configuração familiar narcísica.
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BRASIL. Supremo Tribunal de Justiça. (3. Turma) RECURSO ESPECIAL 847 597/SC. Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Adoção. Intimação do Ministério Público para audiência. Art. 166 da Lei 8.069/1990. Fim social da lei. Interesse do menor preservado. Direito ao convívio familiar. Ausência de prejuízo. Nulidade inexistente. Recorrente: Ministério Público do Estado de Santa Catarina. Recorrido: A G E e Cônjuge. Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros, 06 de março de 2008. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/8685530/recurso-especial-resp-847597-sc- 2006-0112925-5/inteiro-teor-13724595?ref=juris-tabs. Acesso em: 11 abr.2020.
BRASIL. Supremo Tribunal de Justiça. (4. Turma). RECURSO ESPECIAL 757411/MG. Responsabilidade Civil. Abandono moral. Reparação. Danos morais. Impossibilidade. 1. A indenização por dano moral pressupõe a prática de ato ilícito, não rendendo ensejo à aplicabilidade da norma do art. 159 do Código Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz de reparação pecuniária. 2. Recurso especial conhecido e provido. Recorrente: V DE P F DE O F. Recorrido: A B F (menor) assistido por V B F. Relator: Ministro Fernando Gonçalves. 29 de novembro de 2005. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/52168/recurso-especial-resp-757411-mg- 2005-0085464-3. Acesso em: 11 abr.2020.STJ.
BRASIL. Supremo Tribunal de Justiça. (4. Turma). RECURSO ESPECIAL 514 350/SP. Precedente citado: RECURSO ESPECIAL 757 411/MG. Civil e Processual. Ação de investigação de paternidade e reconhecimento. Danos Morais rejeitados. Ato ilícito não configurado. I. Firmou o Superior Tribunal Federal de Justiça que “A indenização por dano moral pressupõe a prática de ato ilícito, não rendendo ensejo à aplicabilidade da norma do art. 159 do Código Civil de 1916 o abandono afetivo, incapaz de reparação pecuniária”. (REsp n. 757.411/MG, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, unânime, DJU de 29.11.2005). II. Recurso especial não conhecido. Recorrente: R A D A S. Recorrido: J L N DE B. Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior. 28 de abril de 2009. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/4138163/recurso-especial-resp-514350-sp- 2003-0020955-3/inteiro-teor-12209310?ref=juris-tabs. Acesso em: Acesso em: 11 abr.2020
BRASIL. Supremo Tribunal de Justiça. (3. Turma). RECURSO ESPECIAL 1.159 242/SP. Civil e processual civil. Família. Abandono afetivo. Compensação por dano moral. Possibilidade. 1. Inexistem restrições legais à aplicação das regras concernentes à responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar no Direito de Família. 2. O cuidado como valor jurídico objetivo está incorporado no ordenamento jurídico brasileiro não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227 da CF/88. 3. Comprovar que a imposição legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão. Isso porque o non facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia- se, o necessário dever de criação, educação e companhia – de cuidado – importa em vulneração da imposição legal, exsurgindo, daí, a possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico. 4. Apesar das inúmeras hipóteses que minimizam a possibilidade de pleno cuidado de um dos pais em relação à sua prole, existe um núcleo mínimo de cuidados parentais que, para além do mero cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto à afetividade, condições para uma adequada formação psicológica e inserção social. 5. A caracterização do abandono afetivo, a existência de excludentes ou, ainda, fatores atenuantes – por demandarem revolvimento de matéria fática – não podem ser objeto de reavaliação na estreita via do recurso especial. 6. A alteração do valor fixado a título de compensação por danos morais é possível, em recurso especial, nas hipóteses em que a quantia estipulada pelo Tribunal de origem revela-se irrisória ou exagerada. 7. Recurso especial parcialmente provido. Recorrente: Antônio Carlos Jamas dos Santos. Recorrido: Luciane Nunes de Oliveira Souza. Relatora: Ministra Nancy Andrigh, 24 de abril de 2012. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp. 11 abr.2020
BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1 430.058 – PR (2019/0010072-4). Trata-se de agravo contra decisão que negou seguimento a recurso especial interposto de acórdão assim ementado: Apelação cível. Investigação de paternidade c/c alimentos e danos morais por abandono afetivo – sentença de parcial procedência. Insurgência da autora. Alimentos fixados em 107% do salário mínimo nacional – necessidade superior ao valor arbitrado demonstrada – necessidade de distribuição do encargo entre os pais segundo as suas possibilidades – fixação de alimentos em 130% do salário mínimo nacional – valor que atende aos critérios da proporcionalidade e razoabilidade. Pretensão de arbitramento de indenização de danos morais pelo abandono afetivo – acolhimento – genitor que, embora ciente da paternidade, não registrou a filha e se limitou a prestar alimentos – tratamento dispensado à autora que não condizia com aquele ofertado ao restante da prole – distinção decorrente da relação concubinária mantida com sua genitora – abandono afetivo configurado no caso concreto – violação aos direitos da personalidade da autora – reparação devida. Indenização arbitrada em R$ 150.000,00. Recurso parcialmente provido. Ônus de sucumbência redistribuídos. AGRAVANTE: A F DE B. AGRAVADO: B S. RELATORA: Ministra Maria Isabel Gallotti. 25 de março de 2020. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/decisoes/doc.jsp#DOC1. Acesso em: 13 abr. 2020
BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. (3. Turma). AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 898.302 – RJ. Civil. Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial. Recurso manejado sob a égide no NCPC. Família. Direito de visitação de filho menor. Direito assegurado pela justiça. Dificultação injustificada da visitação aplicada de multa alegação de aplicação indevida, pois não praticou ato de alienação parental. Indispensável reexame do conjunto fático- probatório dos autos. Incidência da súmula nº 7 do STJ. Tese de aplicação antecedente de advertência antes da multa. Ausência do indispensável prequestionamento da matéria. Incidência da Súmula nº 282 do STF. Pretensão de redução da multa. Deficiência na fundamentação. Incidência, por analogia, da súmula nº 284 do STF. Agravo interno não provido. 1. Aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos no Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.2. O Tribunal local, com base no conjunto fático-probatório dos autos, concluiu pela necessidade de fixação de astreintes para ocaso de descumprimento da ordem judicial. A revisão desse entendimento esbarra na Súmula nº 7 do STJ. 3. Ausente o prequestionamento do preceito legal dito violado, sem que a parte tenha oposto embargos de declaração, tem aplicação a Súmula nº 282 do STF. 4. Caracterizada a deficiência da fundamentação recursal, pois apresentada de forma genérica e inconsistente e apenas no capítulo do pedido final do recurso especial, é de rigor a aplicação da Súmula nº 284 do STF. 5. Agravo interno não provido. Recorrente: P M C. Recorrido: E D DE A M. Relator: Ministro Moura Ribeiro, 07 mar. 2017. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp. Acesso em: 11 abr.2020.
BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. (2. Seção). EMBARGO DE DECLARAÇÃO NO CONCFLITO DE COMPETÊNCIA 108 689-PE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. Conflito de competência. Omissão. Contradição. Inexistência. Ação de modificação de guarda. Ação proposta onde o detentor da guarda não mais tem domicílio. Envio dos autos para o juízo competente. Inexistência de conflito. 1. Consoante se verifica das informações prestadas pelos Juízos suscitados, não há discrepância de entendimento acerca da competência para julgamento da ação de modificação de guarda, não restando configurada qualquer das hipóteses do art. 115 do Código de Processo Civil. 2. No caso, tendo a detentora da guarda se mudado para outra comarca, a propositura da ação de modificação de guarda, ajuizada pelo pai nesse mesmo período, lá deveria ter se dado, consoante entenderam os Juízos suscitados. Não se trata de mudança de endereço depois de proposta a ação e efetivada a citação. Incidência do art. 147, I, do Estatuto da Criança e do Adolescente. 3. Os conflitos de competência apontados pelo embargante como representativos da jurisprudência desta egrégia Corte, tratam, na realidade, de hipóteses excepcionais, em que fica clara a existência de alienação parental em razão de sucessivas mudanças de endereço da mãe com o intuito exclusivo de deslocar artificialmente o feito, o que não ocorre nos autos. 4. Desta forma, ausente qualquer equívoco manifesto no julgado, tampouco se subsumindo a irresignação em análise a alguma das hipóteses do art. 535 do CPC, não merece ressonância a insurgência em questão. 5. Embargos de declaração rejeitados. Recorrente: L DE BN. RECORRIDO: A DE A M. Relator: Ministro Raul Araújo, 10 nov. 2010. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp. Acesso em: 11 abr.2020.
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[1] Graduanda em Direito pela UCSAL. E-mail: ticiane.costa@ucsal.edu.br
[2] Doutora em Família na Sociedade Contemporânea (UCSAL), Mestre em Direito Econômico (UFBA), bacharel em Direito (UCSAL) e em Comunicação (UFBA), coordenadora da Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Médico, Biodireito e Bioética (UCSAL), coordenadora de TCC Curso de direito UCSAL. Email: ritasimoesbonelli@uol.com.br
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