Data de publicação: 30/01/2025
Tribunal: TJ-GO
Relator: Des(a). Wilton Muller Salomão
(...) “A convivência dos filhos com ambos os pais é necessária e deve ser observada desde a mais tenra idade, no limite das possibilidades, observando sempre os interesses do menor.” (...)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE ALIMENTOS C/C AÇÃO DE GUARDA UNILATERAL. TUTELA PROVISÓRIA. DEFERIMENTO DE VISITAÇÃO SUPERVISIONADA. SUSPENSÃO PERNOITE. CRIANÇA PORTADORA DE AUTISMO. MELHOR INTERESSE DA MENOR. 1. Em demandas como a presente, o magistrado deve primar pela proteção integral do menor, considerando sua integridade física e psicológica, visando proporcionar-lhe um desenvolvimento saudável e equilibrado, em condições dignas de vida, em respeito à sua condição de pessoa em formação. 2. A convivência dos filhos com ambos os pais é necessária e deve ser observada desde a mais tenra idade, no limite das possibilidades, observando sempre os interesses do menor. 3. A visitação supervisionada mostra-se adequada e necessária ao bem-estar da menor, que dispensa cuidados especiais por ser portadora de autismo. AGRAVO CONHECIDO E PROVIDO.
(TJ-GO - Agravo de Instrumento: 5083017-62.2024.8.09.0006 GOIÂNIA, Relator: Des(a). Wilton Muller Salomão, 11ª Câmara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ)
Inteiro Teor
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Gabinete do Desembargador Wilton Müller Salomão
11a Câmara Cível
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5083017-62.2024.8.09.0006
COMARCA DE ANÁPOLIS
AGRAVANTE: D.L.F.C.
AGRAVADO: E.P.C.
RELATOR: DES. WILTON MÜLLER SALOMÃO
VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Conforme relatado, cuida-se de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo interposto por D.L.F.C., menor impúbere, representado por sua genitora, Valéria de Jesus Fiuza em face da decisão interlocutória exarada na movimentação nº 39, nos autos da ação de alimentos c/c ação de guarda unilateral ajuizada em desproveito de Eudes Pereira Celestino.
Pelo ato decisório em questão, a magistrada de primeira instância, Dra. Heloísa Silva Matos, deferiu o pedido de tutela de urgência formulado em sede de contestação para regulamentar provisoriamente a convivência paterna com o filho menor e autorizar o genitor a ficar com a criança no 1º e 3º finais de semana do mês, iniciando ao sábado às 10h e terminando no domingo às 18h, ficando responsável em buscar a criança e entregá-la à mãe.
Em suas razões (movimentação n. 01), o agravante requer: a) a suspensão do pernoite e, b) que as visitas do genitor sejam assistidas.
Antes de adentrar ao mérito, cumpre-me ressaltar que o agravo de instrumento deve limitar-se ao exame do acerto ou desacerto do que foi decidido pelo Juiz monocrático, não sendo lícito, destarte, ao Juízo ad quem antecipar-se incontinenti ao julgamento do mérito da demanda, sob pena de supressão de um grau de jurisdição.
Logo, a análise é apenas perfunctória, porquanto restrita ao acerto ou desacerto da decisão prolatada. Tratando-se de recurso de decisão que deferiu pedido de antecipação de tutela, cumpre averiguar se foram ou não preenchidos os requisitos ensejadores da concessão da medida.
Segundo o art. 300 do CPC, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Fixadas essas premissas iniciais, no caso em comento, ao reanalisar a decisão judicial singular atacada, entendo que razão assiste em parte ao agravante. Explico.
Como é sabido, a convivência dos filhos com ambos os pais é necessária e deve ser observada desde a mais tenra idade, no limite das possibilidades, observando sempre os interesses do menor.
A criança tem direito de ser criada e educada no seio da família, sendo certo que eventual desinteligência entre os genitores não pode e não deve servir como forma de afastar os filhos da convivência paterna ou materna, devendo ser assegurada, a preservação de um vínculo afetivo saudável entre os pais e os filhos, sempre no limite das possibilidades.
Porém, deve se ressaltar que a convivência do menor com os genitores deve sempre ser condicionada ao melhor interesse da criança e, no caso, verifica-se que o menor faz terapia multidisciplinar, em razão de diagnóstico de sinais de transtorno do espectro autista (movimentação n. 01).
Nesse sentido, não pode passar despercebido que essa condição de saúde do menor impõe-se um segmento de rotina regrada, sem mudanças repentinas, uma vez que precisar se sentir seguro, visto que alterações bruscas ou feitas de forma equivocada, trazem sérios riscos emocionais, psicológicos e sociais.
Assim, entendo que, por ora, a visita do menor, com pernoite, antes de estabelecido um convívio regular ou antes do estudo psicossocial, não se mostra adequado no caso.
É nesse sentido a jurisprudência:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REGULAMENTAÇÃO DE CONVIVÊNCIA PATERNA. CRIANÇA COM NECESSIDADES ESPECIAIS. IRRESIGNAÇÃO COM A RESTRIÇÃO DOS ENCONTROS. A DECISÃO RECORRIDA ESTABELECEU NOVO ARRANJO NA CONVIVÊNCIA ENTRE PAI E FILHO, MANTENDO AS INTERAÇÕES VIRTUAIS AOS SÁBADOS, COM DURAÇÃO APROXIMADA DE 1 HORA, E, NO QUE DIZ COM OS ENCONTROS PRESENCIAIS, DETERMINOU QUE OCORRAM DE FORMA ASSISTIDA, JUNTO AO ESPAÇO BEABÁ. CONSIDERANDO QUE A CRIANÇA, QUE ESTÁ COM CINCO ANOS DE IDADE, SOFRE DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA DE NÍVEL 3), ISSO É, AUTISMO SEVERO, ASSOCIADO À DEFICIÊNCIA INTELECTUAL E TRANSTORNO DO SONO, DEVE SER MANTIDA A DECISÃO, UMA VEZ QUE A APROXIMAÇÃO COM O GENITOR/AGRAVANTE DEVE SER CONSOLIDADA AOS POUCOS, E COM A TRANQUILIDADE QUE A CONDIÇÃO ESPECIAL DO INFANTE EXIGE, HAVENDO ELEMENTOS NOS AUTOS A CORROBORAR QUE O AJUSTE ANTERIOR, QUE PREVIA A CONVIVÊNCIA QUINZENAL DE SÁBADO ATÉ DOMINGO, COM PERNOITE NA CIDADE DO INFANTE, NÃO ESTAVA SENDO PROFÍCUA. A DECISÃO RECORRIDA PRIORIZA O BEM-ESTAR DA CRIANÇA, EM ATENÇÃO À SUA CONDIÇÃO PESSOAL, E ASSIM DEVE SER, SEMPRE E POR TODOS.NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME.
(TJ- RS - AI: 51318680620238217000 RIO PARDO, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Data de Julgamento: 17/08/2023, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: 17/08/2023)
Por outro lado, não se desconhece que é necessário ampliar a convivência do menor com o agravado, de forma objetiva e favorável ao fortalecimento saudável dos vínculos afetivos e emocionais entre pai e filho.
Porém, entendo que o vínculo entre pai e filho deve ser estabelecido gradativamente, com supervisão de pessoas aptas a avaliarem se o menor se adaptará a uma nova rotina, com pessoas e ambientes diferentes, e se o agravante, possui, de fato, condições de assistir, criar e educar seu filho, principalmente, em razão da necessidade de cuidados especiais por ser portador de autismo, que se caracteriza, essencialmente, pela dificuldade de comunicação e convívio social.
Assim, a visitação supervisionada permitirá que a criança de idade tão tenra adquira segurança e intimidade com seu genitor, estreitando os laços entre ambos gradualmente e dentro das limitações que as necessidades especiais do menor impõem.
Em casos semelhantes, confira-se o entendimento deste Tribunal de Justiça:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REVOGAÇÃO DE SUSPENSÃO DE PODER FAMILIAR. TUTELA PROVISÓRIA. DEFERIMENTO DE VISITAÇÃO SUPERVISIONADA. CRIANÇA PORTADORA DE AUTISMO. MELHOR INTERESSE DA MENOR.
1. O deferimento de tutela de urgência apenas será concedida se observados, concomitantemente, os requisitos do artigo 300, caput, do CPC, quais sejam, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, bem como não se vislumbre a possibilidade de irreversibilidade do provimento antecipado.
2. A regulamentação do direito de visitas, assim como todas as questões que envolvem menores, devem prestigiar sempre e primordialmente o melhor interesse da criança (art. 227, caput, da Constituição Federal).
3. O regime de visitação permite a necessária e efetiva aproximação entre a genitora, cujo pátrio poder foi revogado, e a filha menor, a fim de desenvolver e fortalecer o vínculo afetivo entre elas, imprescindível para o desenvolvimento saudável da criança, apresentando- se, sem dúvida, como fator de contribuição para a estabilidade emocional desta e da família.
4. Contudo, neste momento, a visitação supervisionada mostra-se adequada e necessária ao bem-estar da menor, que dispensa cuidados especiais por ser portadora de autismo e reside e convive com sua avó materna há mais de 06 (seis) anos. AGRAVO DESPROVIDO.
(TJ-GO - AI: 00749019520188090000, Relator: CARLOS HIPOLITO ESCHER, Data de Julgamento: 02/07/2018, 4a Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 02/07/2018)
APELAÇÃO. AÇÃO DE GUARDA COMPARTILHADA C/C REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS COM PEDIDO LIMINAR. PODER FAMILIAR. DIREITO DE VISITAS. PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO INTEGRAL E MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. TUTELA EFETIVA.
1. A tutela constitucional da criança e do adolescente é norteada pelo princípio da proteção integral e pelo vetor do melhor interesse da menor, logo deve-se analisar a situação da visita assistida pelo princípio da afetividade, que sugere um convívio entre o genitor e sua prole, não se desconsiderando as nuances do caso sob a ótica do melhor interesse da menor.
2. É inerente ao poder familiar, que compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores, tê-los em sua companhia, nos termos do art. 1.634, II, do CC/02, ainda que essa companhia tenha que ser regulada pelo direito de visitas explicitado no art. 1.589 do CC/02.
3. Considerando as balizas do caso concreto, mister estabelecer diretrizes temporárias (visitação assistida) com vistas o melhor interesse da criança. APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJGO, Apelação Cível 71359-80.2016.8.09.0112, Rel. Dr. Wilson Safatle Faiad, 6a Câmara Cível, DJe 2279 de 01/06/2017)
Assim, considero que a visitação assistida auxiliará na rotina da criança e o seu bem-estar físico e psicológico, permitindo-se, outrossim, a inserção do genitor na vida do menor, gradualmente.
Ante o exposto, conheço do recurso interposto e dou-lhe provimento para, em reforma do ato hostilizado, estabelecer que a visitação do agravado ao menor se dê de forma assistida, sem pernoite, devendo a regulamentação das visitas ser realizada pelo juízo de origem, com a fixação de horários, dias e pessoa responsável para acompanhar a visitação, conforme indicarem as partes.
É como voto.
Publique-se. Intimem-se.
Goiânia, datado e assinado digitalmente.
DES. WILTON MÜLLER SALOMÃO
Relator
ACÓRDÃO
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5083017-62.2024.8.09.0006, acordam os integrantes da 1a Turma Julgadora da 11a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás, por unanimidade de votos, EM CONHECER DO AGRAVO DE INSTRUMENTO E DAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do RELATOR.
VOTARAM com o RELATOR, o Desembargador BRENO BOSS CACHAPUZ CAIADO e o Desembargador JOSÉ CARLOS DUARTE.
PRESIDIU a sessão o Desembargador WILTON MÜLLER SALOMÃO.
PARTICIPOU da sessão a Procuradora de Justiça Dra. MARTA MAIA DE MENEZES.
Custas de lei.
Goiânia, datado e assinado digitalmente.
DES. WILTON MÜLLER SALOMÃO
Relator