Data de publicação: 03/01/2025
Tribunal: TJ-MS
Relator: Des. Lúcio R. da Silveira
(...) “Como consequência, prevalece o entendimento segundo o qual o encargo foi estabelecido com natureza intuitu personae, ou seja, direta e pessoalmente a cada um dos filhos, ainda que fixado num valor único a ser desfrutado pelos três filhos.” (...)
AGRAVO DE INSTRUMENTO – CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DE OBRIGAÇÃO ALIMENTAR – PENSÃO INICIALMENTE ESTIPULADA DE FORMA SINGULAR PARA TRÊS FILHOS – EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO QUANTO A DOIS DELES – REDUÇÃO PROPORCIONAL DO VALOR DEVIDO – OBRIGAÇÃO DE CARÁTER INTUITU FAMILIAE NÃO CARACTERIZADA – ACORDO QUE NÃO ESTIPULOU DESSA FORMA - ARBITRAMENTO INTUITO FAMILIAE QUE NÃO SE PRESUME – PRECEDENTES – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
(TJ-MS - Agravo de Instrumento: 1400717-80.2024.8.12.0000 Campo Grande, Relator: Des. Lúcio R. da Silveira, Data de Julgamento: 13/03/2024, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: 15/03/2024)
Inteiro Teor
2a Câmara Cível
Agravo de Instrumento - Nº 1400717-80.2024.8.12.0000 - Campo Grande
Relator - Exmo. Sr. Des. Lúcio R. da Silveira
Agravante: M. A. S.
Advogado: Jefferson Carlos Ponqueroli (OAB: **/SC).
Advogado: Fred Madson Riffel (OAB: **/SC).
Agravado: J. L. R. S.
Advogado: Jacob Malko Raphi Dolabani de Castro (OAB: **/MS).
EMENTA - AGRAVO DE INSTRUMENTO - CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DE OBRIGAÇÃO ALIMENTAR - PENSÃO INICIALMENTE ESTIPULADA DE FORMA SINGULAR PARA TRÊS FILHOS - EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO QUANTO A DOIS DELES - REDUÇÃO PROPORCIONAL DO VALOR DEVIDO - OBRIGAÇÃO DE CARÁTER INTUITU FAMILIAE NÃO CARACTERIZADA - ACORDO QUE NÃO ESTIPULOU DESSA FORMA - ARBITRAMENTO INTUITO FAMILIAE QUE NÃO SE PRESUME - PRECEDENTES - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
1. Fixação do encargo originário em que não houve estipulação expressa de que a obrigação seria intuitu familiae. Como consequência, prevalece o entendimento segundo o qual o encargo foi estabelecido com natureza intuitu personae, ou seja, direta e pessoalmente a cada um dos filhos, ainda que fixado num valor único a ser desfrutado pelos três filhos.
2. O cálculo do débito deve observar a porção devida ao Credor/Agravado.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM, em sessão permanente e virtual, os magistrados da 2a Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, na conformidade da ata de julgamentos, a seguinte decisão: Por unanimidade, deram provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.
Campo Grande, 13 de março de 2024
Des. Lúcio R. da Silveira
Relator
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
RELATÓRIO
Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por M. A. S. contra Decisão proferida pelo Juízo da 4a Vara de Família e Sucessões de Campo Grande que rejeitou a impugnação ao cumprimento de sentença promovido pelo Exequente J. L. R. S.
Aduz, inicialmente, a conexão dos autos de Cumprimento de Sentença com a Ação de Exoneração de Alimentos nº 0821716-08.2021.8.12.0001, que tramita perante a 6a Vara de Família de Campo Grande, por meio da qual o Agravante pleiteia a exoneração da obrigação de pagar pensão alimentícia em favor do Agravado.
Ademais, aponta a ocorrência de excesso de execução, pois restou ajustado entre o Agravante e seus filhos o pagamento de pensão no valor que atualmente corresponde a R$ 4.528,39. Ocorre que no decorrer do tempo, foi decretada a exoneração da obrigação do executado quanto a dois de seus três filhos (A. e J. M.), perdurando a obrigação somente em relação ao Agravado J. L. Sendo assim, o valor devido pelo Recorrente corresponde a somente 1/3 do total da pensão, que consiste na proporção à que faz jus o Agravado.
Alega que os valores cobrados por meio do cumprimento de sentença são excessivos e incoerentes, posto que o Agravado almeja receber os valores em sua integralidade e não a quota-parte que lhe é cabível, qual seja, 1/3 (um terço) do valor, tendo em vista que encargo deve ser desmembrado proporcionalmente para cada filho.
Pugna pela concessão de efeito suspensivo ao recurso, bem como pela reunião dos autos com a ação de exoneração de pensão e, por fim, pela reforma da decisão a fim de se reconhecer o excesso na execução, devendo os valores serem calculados apenas sobre 1/3 (um terço) do valor integral.
O recurso foi recebido no efeito suspensivo (f. 24/26).
Contraminuta às f. 31/43.
É o relatório.
VOTO
Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por M. A. S. contra Decisão proferida pelo Juízo da 4a Vara de Família e Sucessões de Campo Grande que rejeitou a impugnação ao cumprimento de sentença promovido pelo Exequente J. L. R. S.
Da violação ao princípio da dialeticidade.
Em contrarrazões ao Agravo, a parte Recorrida suscita preliminar de ofensa ao princípio da dialeticidade, alegando que o Agravante não combate os fundamentos da decisão.
Sem razão o Recorrido. Isto porque, em suas razões recursais, o Apelante combateu suficientemente a Decisão invectivada, lançando argumentos no sentido de que a obrigação é intuitu personae e foi exonerado quanto à pensão dos dois outros filhos, cabendo ao Agravado a porção de 1/3 do valor ao que se obrigou a contribuir.
Assim, tendo combatido a decisão em sua parte central, é de ser afastada a preliminar de violação ao princípio da dialeticidade.
Nesse sentido:
E M E N T A - APELAÇÃO CÍVEL - IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO POR OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE SUSCITADA NAS CONTRARRAZÕES - REJEITADA - CÁLCULO DOS VALORES PAGOS COM BASE EM CLÁUSULAS DECLARADAS ABUSIVAS EM AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO E A SEREM COMPE5NSADOS COM O SALDO DEVEDOR - INCIDÊNCIA DE CORREÇÃO MONETÁRIO A PARTIR DAS DATAS DOS DESEMBOLSOS E JUROS DE MORA DESDE A CITAÇÃO - RECURSO PROVIDO.
Se é possível extrair do recurso as razões de fato e de direito com amparo nas quais o recorrente pretende obter a modificação do julgado, observados os termos do art. 1010, II e III, do Novo Código de Processo Civil, não ocorre ofensa ao princípio da dialeticidade. Preliminar rejeitada (...)
(TJMS. Apelação Cível n. 0803923-08.2011.8.12.0001, Campo Grande, 3a Câmara Cível, Relator (a): Des. Dorival Renato Pavan, j: 03/07/2019, p: 05/07/2019).
E M E N T A - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO - PRELIMINAR DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE - AFASTADA - MÉRITO - REVISÃO DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS - ADMISSIBILIDADE - JUROS REMUNERATÓRIOS - LIMITAÇÃO DOS JUROS DE ACORDO COM A TAXA MÉDIA DE MERCADO, POR SER MENOR QUE A TAXA CONTRATADA - RESTITUIÇÃO VALORES - FORMA SIMPLES - DANO MORAL - NÃO CONFIGURADO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
Constatado nas razões recursais que o recorrente apresentou impugnação aos fundamentos da sentença, pleiteando sua reforma, rejeita-se a preliminar de não conhecimento do recurso por ofensa ao princípio da dialeticidade.
(TJMS. Apelação Cível n. 0802788-11.2018.8.12.0002, Dourados, 2a Câmara Cível, Relator (a): Des. Eduardo Machado Rocha, j: 09/07/2019, p: 10/07/2019).
Assim, rejeita-se a preliminar.
Da conexão.
O Agravante aduz, inicialmente, a conexão dos autos de Cumprimento de Sentença com a Ação de Exoneração de Alimentos nº 0821716-08.2021.8.12.0001, que tramita perante a 6a Vara de Família de Campo Grande, por meio da qual o Agravante pleiteia a exoneração da obrigação de pagar pensão alimentícia em favor do Agravado.
Ocorre que a referida demanda já foi sentenciada, conforme noticiou a parte contrária, sendo que já houve inclusive o julgamento de Apelação interposta em face da Sentença proferida (f. 44/49).
Conforme preleciona a Lei Processual Civil as ações conexas serão reunidas, salvo se uma delas já houver sido sentenciada, senão vejamos:
Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir.
§ 1º Os processos de ações conexas serão reunidos para decisão conjunta, salvo se um deles já houver sido sentenciado.
Assim, havendo sentença nos autos indicados, não há falar em conexão e reunião dos processos.
Mérito
O Agravante aponta, em sede de impugnação ao cumprimento de Sentença, a ocorrência de excesso de execução na hipótese.
Contou que comprometeu-se a prestar pensão alimentícia em favor de seus três filhos, dentre eles o Agravado, no valor de R$ 1.100,00 (à época), corrigidos semestralmente pelo IGPM/FGV a partir de 01/03/2004.
Com o passar dos anos, foi decretada a exoneração da obrigação do executado quanto a dois de seus três filhos (A. e J. M.), perdurando a obrigação somente em relação ao Agravado J. L.
Quanto ao filho J. M., o Agravante foi exonerado do pagamento de pensão por meio dos autos nº 0827288-81.2017.8.12.0001, através de acordo entabulado entre as partes, homologado em 06/03/2018 (f. 32/34 dos autos principais).
Igualmente, o Agravante foi exonerado da obrigação quanto à sua filha A. R. S. nos autos 0833983-17.2018.8.24.0001 a partir de 30/10/2020 (f. 118/119 dos autos de origem).
Em razão disso, sustenta que o valor efetivamente devido em favor do Agravado não é aquele apontado na inicial do cumprimento de sentença, uma vez que deve ser considerado na cobrança a porção de 1/3 da pensão inicialmente estabelecida, em favor do único filho que remanesce com o benefício.
Por outro lado, a parte contrária defende e pleiteia o pagamento integral do valor inicialmente fixado a título de pensão, argumentando que, em regra, os alimentos são Intuito Personae; contudo, há exceção: nos casos de convenção (ou seja, acordo), a obrigação é Intuito Familiae .
Pois bem. A pensão fora inicialmente fixada por meio do acordo cuja cópia se acostou à f. 42 dos autos de origem, nos seguintes termos:
Com efeito, como se depreende da leitura do excerto acima colacionado, na ocasião da fixação do encargo originário, não houve estipulação expressa de que a obrigação seria intuitu familiae, como afirma a parte Agravada.
Como consequência, prevalece o entendimento segundo o qual o encargo foi estabelecido com natureza intuitu personae , ou seja, direta e pessoalmente a cada um dos filhos, ainda que fixado num valor único a ser desfrutado pelos três filhos.
Vale dizer, se os alimentos foram originariamente fixados em R$ 1.100,00 para os três filhos, a cada qual caberia 1/3 desse montante.
Nessa perspectiva, os alimentos, embora disciplinados em um montante singular, referem-se a três relações jurídicas materiais distintas, referentes a cada um dos filhos do alimentante. Assim, tendo ocorrido a exoneração do encargo em relação a dois filhos, como já mencionado, cabe ao Agravado, o valor equivalente a 1/3 da obrigação originária.
A esse respeito, confira-se a jurisprudência pátria:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIMENTOS (CUMPRIMENTO DE SENTENÇA). DECISÃO AGRAVADA QUE DETERMINA O RECÁLCULO DO CRÉDITO EXEQUENDO, LIMITANDO A COBRANÇA EM PECÚNIA AO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO. INCONFORMISMO. DESACOLHIMENTO. SUPERVENIÊNCIA DA MAIORIDADE DE UM DOS ALIMENTANDOS. ORDEM DE RECÁLCULO QUE DECORRE DA NECESSÁRIA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DA EXECUÇÃO. OBRIGAÇÃO DE NATUREZA INTUITO PERSONAE E NÃO INTUITO FAMILIAE, VEZ QUE AUSENTE ESTIPULAÇÃO EXPRESSA NO TÍTULO JUDICIAL . INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL E PACTUAL DO DIREITO DE ACRESCER. ARBITRAMENTO INTUITO FAMILIAE QUE NÃO SE PRESUME. PRECEDENTES. IMPOSSIBILIDADE DE PROSSEGUIMENTO DA ALIMENTANDOS. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO DESPROVIDO.
(TJ-SP - AI: 20400281520198260000 SP 2040028-15.2019.8.26.0000, Relator: Rômolo Russo, Data de Julgamento: 12/12/2019, 7a Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/12/2019)
VOTO DO RELATOR EMENTA - AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS - TUTELA DE URGÊNCIA - Parcial deferimento (exoneração com relação à filha maior, prevalecendo o encargo destinado ao menor em 1/3 dos rendimentos líquidos do agravante) - Inconformismo - Acolhimento - Fixação intuitu familiae que não se presume, tampouco o direito de acrescer - DIVISIBILIDADE DO MONTANTE ANTERIORMENTE FIXADO -Cabimento, já que se cuidam de alimentos intuitu peronae - Precedentes - Decisão reformada - Recurso provido
(TJ-SP - AI: 22063139020228260000 SP 2206313-90.2022.8.26.0000, Relator: Salles Rossi, Data de Julgamento: 29/11/2022, 8a Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/11/2022)
(...) APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS - OBRIGAÇÃO FIXADA 'INTUITU FAMILIAE' - PEDIDO DE EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO COM RELAÇÃO A UMA PARTE DOS ALIMENTANDOS - INSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO - PROCEDÊNCIA - DIVISIBILIDADE DA VERBA - DIREITO DE ACRESCER - AUSÊNCIA DE PREVISÃO NO ACORDO JUDICIAL - VEDAÇÃO.
1 - A obrigação alimentar fixada 'intuitu familiae' não perde seu caráter de divisibilidade.
2 - Julgada procedente a ação de exoneração de alimentos com relação a uma parte dos alimentandos, o pensionamento prestado de forma 'intuitu familiae' deverá sofrer proporcional redução, porquanto o direito de acrescer, que não se presume, não foi objeto do acordo homologado judicialmente.
(TJ-MG - AC: 10433093022773002 Montes Claros, Relator: Maurício Barros, Data de Julgamento: 11/10/2011, Câmaras Cíveis Isoladas / 6a CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 11/11/2011)
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXONERAÇÃO/REVISÃO - ALIMENTOS - OBRIGAÇÃO INTUITU PERSONAE - CÔNJUGE E DOIS FILHOS - EXONERAÇÃO - EX-CÔNJUGE - REVISIONAL - FILHO - REDUÇÃO PROPORCIONAL. - Os alimentos são "intuitu personae" tratando-se de vantagem individual e personalíssima em favor de cada alimentado, sem considerar a obrigação como destinado ao grupo familiar "intuitu familiae" - Salvo decisão específica em sentido contrário, os alimentos são devidos proporcionalmente para cada dependente, não se transferindo o percentual para outro beneficiário no desaparecimento da obrigação em relação a qualquer deles - Com a exoneração alimentar em relação a um dos alimentandos, é cabível a redução proporcional dos alimentos em relação no valor da prestação alimentar.
(TJ-MG - AI: 10000211399746001 MG, Relator: Renato Dresch, Data de Julgamento: 16/12/2021, Câmaras Cíveis / 4a CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 17/12/2021)
A corroborar o exposto, colaciona-se o entendimento da Ministra Nancy Andrighi no (REsp) nº. 1.505.079 MG, mencionado pelo Agravado em suas contrarrazões. Importante esclarecer que a interpretação do Recorrido quanto ao voto da ministra encontra-se equivocado, pois, conforme se lê abaixo, a eminente jurista assevera que a prática de se fixar um valor único de pensão em benefício de um grupo de filhos é usual e não indica, por si só, caráter intuitu familiae da obrigação e que a medida pode ser convencionada entre as partes - o que não ocorreu no caso, tendo em vista a inexistência de apontamento nesse sentido no acordo. Além disso, a ministra reforça que há tese consolidada no sentido de que os alimentos devidos em razão do parentesco são personalíssimos. Veja-se (com destaques):
"I - Da nulidade do processo por ausência de formação de litisconsórcio passivo necessário
01. Como bem declinado no acórdão recorrido, os alimentos devidos em razão do parentesco, são fixados com base no art. 1.694, § 1º, do Código Civil que determina a observância, pelo juiz que fixa os alimentos, do binômio necessidade/possibilidade em relação ao reclamante ou reclamantes dos alimentos.
02. Salvo em situações especiais , na qual um dos filhos, por alguma razão singular - ex vi, um possível problema de saúde crônico - exija um pensionamento diferenciado, há reiterada prática de que o julgador fixe um valor global a título de pensão alimentícia para os filhos, por entender que na mesma ambiência, as necessidades são símeis entre os irmãos.
03. Dar a essa prática, contudo, o caráter de alimentos" intuitu familiae "ou alimentos globais é firmar proposição que vai de encontro à consolidada tese de que os alimentos devidos em razão do parentesco são personalíssimos, ou defender a tese de que o fim do pensionamento em relação a um dos alimentados, faria com que a sua" fração "da pensão global fosse automaticamente redistribuída entre os demais alimentados, sem que houvesse nenhuma comprovada alteração na necessidade dos demais alimentados.
04. A ideia de alimentos intuitu familiae pressupõe a existência de credores solidários, o que traria para a sensível seara do direito aos alimentos em razão do vínculo familiar, institutos jurídicos diversos, como a possibilidade de quitação com caução de ratificação (art. 260 do C.Civil), ou a capacidade de um dos alimentados acrescer, sem nenhuma alteração no binômio possibilidade/necessidade, a fração correspondente à exoneração de um outro alimentado.
05. Faz-se uma ressalva argumentativa, aqui, para se absorver a possibilidade de existirem alimentos"intuitu familiae", por convenção entre alimentante e alimentados , que ainda assim, poderá ser questionado por qualquer um dos contratantes, havendo alteração no binômio necessidade/possibilidade.
06. No entanto, a possibilidade dessa ressalva deixa de existir quando se trata de fixação dos alimentos de forma impositiva pelo Estado- Juiz, que deverá ser intuitu personae, para atender os ditames do art. 1.694 do Código Civil.
07. Nessa linha de pensamento, pensões fixadas em razão do parentesco, de maneira global, in casu , 07 (sete) salários mínimos, devem ainda assim, serem consideradas obrigações divisíveis, com a presunção - salvo estipulação da sentença em sentido contrário - que as dívidas são iguais, na hipótese: 3,5 (três e meio) salários-mínimos para cada alimentado.
08. Como o pedido de exoneração atinge apenas a recorrente, despicienda a citação do outro alimentado para compor a lide, pois não há direito dele em discussão.
09. Assim, escorreito o acórdão recorrido, no particular." (STJ - REsp: 1505079 MG 2015/0001500-1, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 13/12/2016, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/02/2017)
Ainda a somar, tem-se que os alimentos intuitu familiae "normalmente são estipulados em benefício da entidade familiar - ex-mulher e filhos" (DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 10. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. Pág. 602). Contudo, na hipótese, houve dispensa de alimentos pela ex-esposa do Agravante (confome trecho em destaque abaixo - f. 116), tendo a obrigação sido estabelecida exclusivamente em benefício de seus filhos, o que corrobora ainda mais com o aspecto personae da obrigação.
Portanto, não se vislumbra caracterizada, na hipótese, o caráter intuitu familiae na prestação alimentar devida pelo Agravante, sobretudo porque não restou convencionado pelos interessados quando da fixação da obrigação.
Outrossim, cabe pontuar que entender de modo diverso seria o mesmo que afirmar que as duas exonerações de pensão conferidas judicialmente ao Agravante anteriormente (f. 32/34 e 118/119 da origem) não teriam qualquer validade, aplicação ou efeito, o que não se pode admitir.
Sendo assim, de rigor reconhecer a procedência do Agravo, a fim de que o cálculo do valor devido pelo Recorrente seja feito na proporção à que faz jus o Agravado.
Por fim, cumpre registrar que, neste momento processual e nesta fase de cumprimento de obrigação anteriormente contraída, discute-se somente os valores pretéritos devidos efetivamente pelo Agravante ao Agravado. Portanto, a continuidade da obrigação (já objeto da ação de exoneração nº 0821716-08.2021.8.12.0001) e eventuais discussões a respeito da majoração ou minoração do valor atribuído à pensão, havendo alteração do binômio necessidade/possibilidade, devem ser discutidos por meio das vias processuais pertinentes, e não por meio destes autos.
Conclusão
Ante o exposto, conhece-se e dá-se provimento ao Agravo de Instrumento interposto, a fim de acolher a impugnação dos cálculos apresentados no cumprimento de sentença de origem e determinar a retificação do cálculo apresentado, de modo a considerar devida a porção de 1/3 (um terço) do valor integral da pensão originalmente fixada.
É como vota-se.
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul
DECISÃO
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:
POR UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR .
Presidência do Exmo . Sr . Des. Ary Raghiant Neto
Relator, o Exmo . Sr . Des. Lúcio R. da Silveira
Tomaram parte no julgamento os (as) Exmos (as). Srs (as). Des. Lúcio R. da Silveira, Des. Eduardo Machado Rocha e Des. Nélio Stábile.
Campo Grande, 13 de março de 2024.