Data de publicação: 22/11/2024
Tribunal: TJ-MG
Relator: Des.(a) Carlos Roberto de Faria
(...) “Além da mera supressão da autorização paterna, a presente demanda envolve questões próprias do Direito de Família, como a possibilidade de fixação de residência da menor no exterior com a genitora e eventual regulamentação da guarda e visitas.” (...)
CONFLITO DE COMPETÊNCIA - AÇÃO DE SUPRIMENTO JUDICIAL DE AUTORIZAÇÃO PATERNA DE VIAGEM AO EXTERIOR - ART. 148, IV, DO ECA - JUÍZO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE - QUESTÕES DE FIXAÇÃO DE RESIDÊNCIA E EVENTUALMENTE GUARDA E VISITAS - PRÓPRIAS DE DIREITO DE FAMÍLIA - JUÍZO DA FAMÍLIA, SUCESSÕES E AUSÊNCIAS - CONFITO ACOLHIDO. 1. A princípio, é possível concluir que o Juízo da Infância e da Juventude é o competente para o processamento e julgamento da demanda, uma vez que o pedido de autorização para viajar se encontra em ação civil fundada em interesse individual do menor (art. 148, IV, ECA). 2. Contudo, além da mera supressão da autorização paterna, a presente demanda envolve questões próprias do Direito de Família, como a possibilidade de fixação de residência da menor no exterior com a genitora e eventual regulamentação da guarda e visitas, que, por sua vez, são de competência das Varas de Família. 3. Conflito de competência acolhido.
(TJ-MG - Conflito de Competência: 33883968320238130000 1.0000.23.338839-6/000, Relator: Des.(a) Carlos Roberto de Faria, Data de Julgamento: 05/07/2024, 8ª Câmara Cível Especializada, Data de Publicação: 08/07/2024)
Inteiro Teor
Número do 1.0000.23.338839-6/000 Numeração 3388396-
Relator do Acordão: Des.(a) Nome
Data do Julgamento: 05/07/2024
Data da Publicação: 08/07/2024
EMENTA: CONFLITO DE COMPETÊNCIA - AÇÃO DE SUPRIMENTO JUDICIAL DE AUTORIZAÇÃO PATERNA DE VIAGEM AO EXTERIOR - ART. 148, IV, DO ECA - JUÍZO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE - QUESTÕES DE FIXAÇÃO DE RESIDÊNCIA E EVENTUALMENTE GUARDA E VISITAS - PRÓPRIAS DE DIREITO DE FAMÍLIA - JUÍZO DA FAMÍLIA, SUCESSÕES E AUSÊNCIAS - CONFITO ACOLHIDO.
1. A princípio, é possível concluir que o Juízo da Infância e da Juventude é o competente para o processamento e julgamento da demanda, uma vez que o pedido de autorização para viajar se encontra em ação civil fundada em interesse individual do menor (art. 148, IV, ECA).
2. Contudo, além da mera supressão da autorização paterna, a presente demanda envolve questões próprias do Direito de Família, como a possibilidade de fixação de residência da menor no exterior com a genitora e eventual regulamentação da guarda e visitas, que, por sua vez, são de competência das Varas de Família.
3. Conflito de competência acolhido.
CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 1.0000.23.338839-6/000 - COMARCA DE TEÓFILO OTÔNI - SUSCITANTE: J.D.J.I.J.T.O. - SUSCITADO (A): J.D.F.S.T.O.
ACÓRDÃO
(SEGREDO DE JUSTIÇA)
Vistos etc., acorda, em Turma, a 8a Câmara Cível Especializada do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em ACOLHER O CONFLITO DE COMPETÊNCIA.
DES. Nome
RELATOR
DES. Nome (RELATOR)
VOTO
Trata-se de Conflito Negativo de Competência envolvendo o MM Juiz de Direito da Vara da Infância e da Juventude e de Cartas Precatórias Cíveis da Comarca de Teófilo Otôni, como suscitante, e o MM. Juiz de Direito da Vara da Família e de Sucessões e Ausências da Comarca de Teófilo Otôni, como suscitado.
O MM Juiz de Direito da Vara de Família e de Sucessões e Ausências da Comarca de Teófilo Otôni determinou a remessa dos autos à ao Juízo Suscitante sob o fundamento que a demanda é competência do Juízo da Vara da Infância e Juventude.
Por sua vez, o Juízo da Vara da Infância e Juventude suscitou o presente conflito ao argumento que o objeto da demanda se refere a pretensão de alterar a residência do menor envolvido, razão pela qual a competência para processar e julgar o feito é da Vara da Família e Sucessões da comarca de Teófilo Otôni.
Diante do exposto, requer que seja conhecido o Conflito de Competência ora apresentado, nos termos do art. 953, I, do NCPC e, por fim, declarando o Juízo Competente para processar e julgar a presente lide, como sendo o Juízo Suscitado.
Em evento de ordem nº 32, determinei ao Juízo Suscitante que decidisse sobre as medidas urgentes.
Apesar de devidamente intimado, o juízo suscitado não prestou informações.
Manifestação da d. Procuradoria-Geral de Justiça em evento de ordem nº 33 opinando pelo acolhimento do presente conflito para que seja declarado competente para dirimir o feito o Juízo da Vara de Família e de Sucessões e Ausências da Comarca de Teófilo Otôni, ora suscitado.
É o relatório. Decido.
Presentes os pressupostos, defiro a formação do Conflito de Competência.
Cinge-se a controvérsia em averiguar qual o juízo competente para dirimir a Ação de Suprimento Judicial de Autorização Paterna de Viagem ao Exterior.
Previamente a análise do conflito, imperiosa é a descrição dos principais atos processuais.
A Ação de Suprimento Judicial de Autorização Paterna de Viagem ao Exterior nº 5007740-60.2023.8.13.0686, que originou o presente conflito, foi ajuizada perante a Vara de Família e de Sucessões e Ausências da Comarca de Teófilo Otôni. Seu intuito é o suprimento de autorização paterna para que a menor A.S.F. possa dar entrada na documentação necessária para tirar seu passaporte e, consequentemente, realizar sua vagem ao exterior.
Recebidos os autos, o MM. Juiz declinou da competência, ao argumento de que a referida ação trata de matéria correlata ao Estatuto da Criança e do Adolescente, de competência da Vara da Infância e Juventude nos termos do art. 62 da Lei Complementar nº 59/01.
Feitas essas considerações, passo a análise do caso concreto.
Pois bem. A Lei nº 8.096/90, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, dispõe em seus art. 148 a respeito da competência material do Juízo da Infância e Juventude:
Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é competente para:
I - Conhecer de representações promovidas pelo Ministério Público, para apuração de ato infracional atribuído a adolescente, aplicando as medidas cabíveis;
II - Conceder a remissão, como forma de suspensão ou extinção do processo;
III - conhecer de pedidos de adoção e seus incidentes;
IV - Conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209;
V - Conhecer de ações decorrentes de irregularidades em entidades de atendimento, aplicando as medidas cabíveis;
VI - Aplicar penalidades administrativas nos casos de infrações contra norma de proteção à criança ou adolescente;
VII - conhecer de casos encaminhados pelo Conselho Tutelar, aplicando as medidas cabíveis.
Parágrafo único. Quando se tratar de criança ou adolescente nas hipóteses do art. 98, é também competente a Justiça da Infância e da Juventude para o fim de:
a) conhecer de pedidos de guarda e tutela;
b) conhecer de ações de destituição do pátrio poder familiar, perda ou modificação da tutela ou guarda; (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
c) suprir a capacidade ou o consentimento para o casamento;
d) conhecer de pedidos baseados em discordância paterna ou materna, em relação ao exercício do pátrio poder familiar; (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
e) conceder a emancipação, nos termos da lei civil, quando faltarem os pais;
f) designar curador especial em casos de apresentação de queixa ou representação, ou de outros procedimentos judiciais ou extrajudiciais em que haja interesses de criança ou adolescente;
g) conhecer de ações de alimentos;
h) determinar o cancelamento, a retificação e o suprimento dos registros de nascimento e óbito.
Por sua vez, cabe destacar que o mesmo diploma legal possui previsão específica sobre a autorização para viajar e como se dá o procedimento:
Art. 83. Nenhuma criança ou adolescente menor de 16 (dezesseis) anos poderá viajar para fora da comarca onde reside desacompanhado dos pais ou dos responsáveis sem expressa autorização judicial. (Redação dada pela Lei nº 13.812, de 2019)
§ 1º A autorização não será exigida quando:
a) tratar-se de comarca contígua à da residência da criança ou do adolescente menor de 16 (dezesseis) anos, se na mesma unidade da Federação, ou incluída na mesma região metropolitana; (Redação dada pela Lei nº 13.812, de 2019)
b) a criança ou o adolescente menor de 16 (dezesseis) anos estiver acompanhado: (Redação dada pela Lei nº 13.812, de 2019)
1) de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau, comprovado documentalmente o parentesco;
2) de pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai, mãe ou responsável.
§ 2º A autoridade judiciária poderá, a pedido dos pais ou responsável, conceder autorização válida por dois anos.
Art. 84. Quando se tratar de viagem ao exterior, a autorização é dispensável, se a criança ou adolescente:
I - Estiver acompanhado de ambos os pais ou responsável;
II - Viajar na companhia de um dos pais, autorizado expressamente pelo outro através de documento com firma reconhecida.
Art. 85. Sem prévia e expressa autorização judicial, nenhuma criança ou adolescente nascido em território nacional poderá sair do País em companhia de estrangeiro residente ou domiciliado no exterior.
Atento ao teor dos dispositivos supratranscritos e considerando que o pedido de autorização para viajar se encontra em ação civil fundada em interesse individual do menor (art. 148, IV, ECA), à princípio é possível concluir que o Juízo da Infância e da Juventude é o competente para o processamento e julgamento da demanda.
Contudo, percebe-se que o intuito da supressão da autorização paterna na presente demanda é a confecção do passaporte da menor para que ela possa viajar para os Estados Unidos e morar com a sua genitora que já reside no exterior. Confira-se trecho da petição inicial:
"2.2 Insta salientar que, desde o nascimento a menor tem como referência o lar da sua avó, S. G. S., que exerce sua guarda de fato, conforme comprova através do seu Cadastro único, em que tem a menor em seu grupo familiar na qualidade de dependente.
2.3 Cabe apontar que a genitora da menor a Sra. Nome, permaneceu na companhia de sua filha, até o seu matrimônio em 2017 com o Sr. Nome, deixando a menor residente na casa da avó, por ser a época o que atenderia melhor aos interesses da filha, devido a referência de lar adquirida.
2.4 Atualmente, a genitora da menor possui residência fixa nos Estados Unidos da América, onde convive com seu esposo, e irmão mais novo da menor, K.
2.5 A Sra. S., que atualmente está mais velha, não possui nenhum filho menor, apenas a responsabilidade de cuidar da neta, chegou a conclusão com a Sra. Nome que, a mudança para o lar da genitora atenderá melhor ao desenvolvimento da menor, posto que, além de poder conviver com seu irmão, atualmente o lar da mãe, oferece melhores recursos e qualidade de vida para a infante."
Logo, entendo que, além da mera supressão da autorização, a ação em análise envolve questões próprias do Direito de Família, como a fixação de residência da menor e eventual regulamentação da guarda, que, por sua vez, são de competência das Varas de Família.
Em casos semelhantes, este E. Tribunal já se manifestou:
EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - AÇÃO DE SUPRESSÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA VIAGEM AO EXTERIOR - FIXAÇÃO DE RESIDÊNCIA DO MENOR NO EXTERIOR - QUESTÃO ATINENTE À GUARDA E VISITAS - MATÉRIA AFETA A VARA DE FAMÍLIA - COMPETÊNCIA DO SUSCITADO.
1. A competência para julgar ações de supressão de autorização para viagem ao exterior é das Varas da Infância e Juventude, a teor dos arts. 84 c/c 148, IV, do ECA (Lei nº. 8.069/90).
2. Todavia, na presente demanda, não se pretende somente a autorização para viagem ao exterior, mas sim a fixação de residência do menor com a genitora no exterior, fato que envolveria, portanto, questões relativas a guarda e visitas, matéria de competência dos juízos de Família.
3. Conhecer do conflito e declarar a competência do suscitado. (TJMG - Conflito de Competência 1.0000.23.159307-0/000, Relator (a): Des.(a) Nome, 8a Câmara Cível Especializada, julgamento em 31/08/2023, publicação da súmula em 04/09/2023)
EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - PEDIDO DE SUPRESSÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA VIAJAR - PEDIDO IMEDIATO - ALTERÇÃO DE RESIDÊNCIA DO MENOR - FIXAÇÃO DE RESIDÊNCIA NO EXTERIOR - GUARDA, VISITAÇÃO E PENSÃO ALIMETÍCIA - PEDIDO MEDIATO - DIREITO DE FAMÍLIA - COMPETÊNCIA DA VARA DE FAMÍLIA - JUSTIÇA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE - COMETÊNCIA ESPECÍFICA - MATÉRIA LEGAL OU SITUAÇÃO DE RISCO PARA O MENOR - CONFLITO DE COMPETÊNCIA ACOLHIDO - COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO
- A competência ordinária para a análise do Direito de Família é da Vara de Família. A Vara da Infância e Juventude tem competência específica, especializada, com determinação legal em rol taxativo. (TJMG - Conflito de Competência 1.0000.23.011281-5/000, Relator (a): Des.(a) Nome, 8a Câmara Cível Especializada, julgamento em 30/03/2023, publicação da súmula em 03/04/2023)
EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - AUTORIZAÇÃO DE VIAGEM AO EXTERIOR - PROCEDIMENTO PREVISTO NO ECA - COMPETÊNCIA ESPECÍFICA DO JUÍZO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE.
- A Vara da Infância e Juventude tem competência específica, especializada, com determinação legal em rol taxativo.
- Não comprovada a alegação de pretensão de fixação de residência no exterior, a competência para a análise do pedido de simples autorização judicial para viagem internacional é do Juízo da Infância e da Juventude, vez que tal pleito está escorado em interesse individual do menor e, portanto, enquadrado no art. 148, inciso IV, bem como art. 84, ambos do ECA. (TJMG - Conflito de Competência 1.0000.23.075745-2/000, Relator (a): Des.(a) Nome, 8a Câmara Cível Especializada, julgamento em 29/06/2023, publicação da súmula em 03/07/2023)
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - DIREITO DE FAMÍLIA - CONFLITO N E G A T I V O D E C O M P E T Ê N C I A - A Ç Ã O D E G U A R D A E REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS CUMULADA COM ALIMENTOS E PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO DE VIAGEM PARA O EXTERIOR - MATÉRIAS AFETAS AO DIREITO DE FAMÍLIA - SITUAÇÃO IRREGULAR DO MENOR INEXISTINTE - COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO.
- Em se tratando de ação de guarda e regulamentação de visitas, tem-se que as matérias discutidas na ação são afetas ao Juízo de família, não havendo que se falar em competência do Juízo da Infância e da Juventude.
- Não se tratando de situação que envolve menor em situação irregular, também não há que se falar em processamento obrigatório da ação em Vara da Infância e da Juventude. (TJMG - Conflito de Competência 1.0000.23.264421-1/000, Relator (a): Des.(a) Nome, 4a Câmara Cível Especializada, julgamento em 23/11/2023, publicação da súmula em 28/11/2023)
Ressalte-se, por fim, que a menor não se encontra em situação de risco capaz de atrair a competência das Varas da Infância e Juventude.
Ante o exposto, ACOLHO O CONFLITO DE COMPETÊNCIA, para declarar a competência do MM. Juízo Suscitado para processamento e julgamento da demanda.
DES. Nome - De acordo com o (a) Relator (a).
SÚMULA: "ACOLHERAM O CONFLITO DE COMPETÊNCIA"