#1 - Paternidade. Registro Civil. Multiparentalidade.

Data de publicação: 08/10/2024

Tribunal: TJ-SP

Relator: Emerson Sumariva Júnior

Chamada

(...) “De acordo com as provas nos autos do reconhecimento da paternidade biológica pelo co-apelante, é de rigor o reconhecimento da multiparentalidade com conseguinte inclusão nos registros de casamento e nascimento da apelante o nome do co-requerente como pai.” (...)

Ementa na Íntegra

Apelação. Homologação de acordo para reconhecimento de paternidade biológica e multiparentalidade cc. alteração de registro civil. Sentença de improcedência. Recurso da parte autora. Possibilidade de coexistência entre a paternidade socioafetiva e a paternidade biológica. Multiparentalidade. Tema 622 do STF. Inclusão de patronímico paterno. Possibilidade. Sentença reformada. Recurso provido.

(TJ-SP - Apelação Cível: 10229745320228260451 Piracicaba, Relator: Emerson Sumariva Júnior, Data de Julgamento: 22/07/2024, 5ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/07/2024)

Jurisprudência na Íntegra

Inteiro Teor 

 

Registro: 2024.0000654916 

  

ACÓRDÃO 

  

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1022974-53.2022.8.26.0451, da Comarca de Piracicaba, em que são apelantes G. D. V. J. e S. T. A., é apelado JUÍZO DA COMARCA. 

  

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 5a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. 

  

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOÃO BATISTA VILHENA (Presidente sem voto), ERICKSON GAVAZZA MARQUES E J.L. MÔNACO DA SILVA. 

  

São Paulo, 22 de julho de 2024. 

  

EMERSON SUMARIVA JÚNIOR 

Relator 

  

Assinatura Eletrônica 

  

Voto nº 6343 

  

Apelação nº 1022974-53.2022.8.26.0451 

  

Comarca: Piracicaba 

  

Apelantes: G. D. V. J. e Outro 

  

Apelado: O Juízo 

  

Juiz (a): Dr. Pedro Paulo Ferronato 

  

Apelação. Homologação de acordo para reconhecimento de paternidade biológica e multiparentalidade cc. alteração de registro civil. Sentença de improcedência. Recurso da parte autora. Possibilidade de coexistência entre a paternidade socioafetiva e a paternidade biológica. Multiparentalidade. Tema 622 do STF. Inclusão de patronímico paterno. Possibilidade. Sentença reformada. 

  

Recurso provido. 

  

Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte autora contra a r. sentença de fls. 51/52, cujo relatório se adota, que julgou improcedente o pedido de homologação de acordo para reconhecimento de paternidade biológica e multiparentalidade cc. alteração de registro civil, nos seguintes termos: 

  

"Conforme observado pelo Ministério Público a fls. 39/40, o pretendido reconhecimento voluntário da paternidade biológica da requerente G.D.V.J. pelo co-requerente S.T.A. é inviável, em face do registro - vigente - da filiação biológica daquela primeira em relação ao falecido G.J.F. (fls. 29/30). 

  

Confira-se, nesse sentido, a lição de MILTON PAULO DE CARVALHO FILHO: 

  

"Segundo observação de Paulo Luiz Netto Lôbo, o reconhecimento voluntário não é possível se o filho já tiver registro de nascimento no qual figurem outras pessoas como seus pais, pois, nesse caso, será indispensável ação judicial para comprovar a falsidade ou o erro do registro precedente (Código Civil comentado. São Paulo, Atlas, 2003, v. XVI, p. 100)."(" Código Civil Comentado", Ed. Manole, 14a ed., pág. 1.786). 

  

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido.". 

  

Inconformada, apela a parte requerente (fls. 55/64), pugnando a reforma da r. sentença. Alegam que, em que pese o fundamento da r. sentença, o Ministério Público vislumbrou ser possível a dupla paternidade, como também opinou, em seu parecer, para que os requerentes utilizassem do Provimento do CNJ nº 63 nos seus intentos, ou, prosseguissem o feito com a conseguinte perícia hematológica.  

 

Apontam, ademais, que foi pontuado a desnecessidade de formação do contraditório para o deslinde do feito, eis que o pai registral é falecido e não deixou herdeiros. Assim, sustentam que, de acordo com as provas nos autos do reconhecimento da paternidade biológica pelo co-apelante, é de rigor o reconhecimento da multiparentalidade com conseguinte inclusão nos registros de casamento e nascimento da apelante o nome do co-requerente como pai, bem como dos avós paternos, sem a exclusão da paternidade já existente, determinando-se ainda, a inclusão do patronímico do co-requerente ao da co-apelante. 

Recurso regularmente processado. 

  

Parecer D. PGJ, fls. 91/92, declinando a apreciação do mérito recursal. 

  

Distribuído o recurso ao Des. J.L. Monaco da Silva, integrante desta 5a Câmara de Direito Privado desta Corte, o processo foi redistribuído a este Relator, nos termos da Portaria de Designação nº 78/2024 (SJ 2.1.11), com conclusão dos autos em 06.06.2024. 

  

É o relatório. 

  

A parte autora ajuizou presente demanda afirmando ser o co-requerente pai biológico da co-requerente, e, em que pese exista no registro de nascimento outra pessoa como seu pai, pugnam pelo reconhecimento da multiparentalidade, com conseguinte inclusão nos registros civis da requerente do nome do co-requerente como seu pai, e seus avós paternos, além da permanência do pai socioafetivo, bem como a inclusão do patronímico do pai ao nome da co-requerente. 

  

Encerrada a instrução processual, sobreveio a sentença de improcedência do pedido. 

  

Pois bem. 

  

A controvérsia acerca da possibilidade de coexistência entre a paternidade socioafetiva e a paternidade biológica, já foi alvo de enfrentamento pelo STF, que através do julgamento do RE-898060 fixou a seguinte tese: 

  

"A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com todas as suas consequências patrimoniais e extrapatrimoniais". (Tema 622). 

  

Clara a redação da tese adotada em afirmar a possibilidade de cumulação de uma paternidade socioafetiva concomitantemente com a biológica, mantendo-se ambas no registro, o que, como consequência, permite a existência jurídica de dois pais, como a hipótese versada. 

  

Em assim entendendo, o C. STF consagra o reconhecimento da multiparentalidade. E, como reflexo, tem-se o reconhecimento jurídico da afetividade ou filiação afetiva; a existência de vínculo socioafetivo e biológico em grau de igualdade no aspecto jurídico e, por fim, a possibilidade jurídica da multiparentalidade e, bem assim, a possibilidade de concomitância ou coexistência de dois pais no assento de nascimento. 

  

Extraem-se do voto do Eminente Relator, Ministro LUIZ FUX, os seguintes dizeres: "Da mesma forma, nos tempos atuais, descabe pretender decidir entre a filiação afetiva e a biológica quando o melhor interesse do descendente é o reconhecimento jurídico de ambos os vínculos. (...) Por isso, é de rigor o reconhecimento da dupla parentalidade". 

  

Conforme verifica-se nos autos, o co-requerente declarou e reconheceu a Sra. G. D. V. J. como sua filha biológica, pugnando a averbação do presente reconhecimento de paternidade no registro de nascimento da filha (fls. 20). 

  

Ademais, conforme bem pontuado pelo i. representante do Ministério Público, em seu parecer de fls. 49/50, "Diante de tal realidade, e considerando que o pai registral da requerente é falecido, não vislumbro a necessidade de formação do contraditório para o deslinde deste feito.  

Isso porque, se os requerentes -supostamente pai e filha biológicos- estão de acordo com a inclusão daquele no assento de nascimento desta, inexiste a necessidade de produção de provas para se demonstrar a existência de vínculo biológico entre eles, pois, juridicamente, se mostra irrelevante o estabelecimento do tipo de vínculo (biológico ou afetivo) no assento de nascimento. Todas as paternidades que constarem do registro terão o mesmo tratamento e consequências jurídicas.". 

  

Em vista disso, no caso concreto, é admissível a coexistência de ambos os pais nos indigitados assentos de nascimento e casamento da co-apelante. 

  

Outrossim, respeitado o entendimento do juízo de primeiro grau, é possível concluir pela existência de motivação válida a autorizar inclusão do patronímico do co-apelante ao nome da co-apelante. 

  

A possibilidade de alteração para inclusão do sobrenome está contida no art. 57, I, da Lei de Registros Públicos: "A alteração posterior de sobrenomes poderá ser requerida pessoalmente perante o oficial de registro civil, com a apresentação de certidões e de documentos necessários, e será averbada nos assentos de nascimento e casamento, independentemente de autorização judicial, a fim de:  

I - Inclusão de sobrenomes familiares". 

  

Portanto, impõe-se a reforma da r. sentença, a fim de que seja reconhecida a multiparentalidade, com conseguinte inclusão nos registros de casamento e nascimento da apelante o nome do Sr. S. T. A. como pai, bem como dos avós paternos, sem a exclusão do pai registral, bem como a retificação nos referidos assentos da apelante, para constar como "G. D. V. J. A.". 

  

Assim, o caso é de provimento do recurso, para acolher-se integralmente a pretensão recursal. 

  

Diante do exposto, DÁ-SE PROVIMENTO ao recurso. 

  

EMERSON SUMARIVA JÚNIOR 

  

Relator