#1 - Indenização por Abandono Afetivo. Reparação de Dano Moral.

Data de publicação: 09/07/2024

Tribunal: TJ-MG

Relator: Des.(a) Élito Batista de Almeida

Chamada

(...) “É juridicamente possível a reparação de danos pleiteada pelo filho em face dos pais fulcrado no abandono afetivo. O sucesso da pretensão indenizatória com fundamento no abandono afetivo exige a comprovação da conduta omissiva do pai em relação ao filho, dano abalo psicológico sofrido por este, nexo de causalidade entre o ato ilícito praticado por aquele e dano sofrido por este.” (...)

Ementa na Íntegra

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ABANDONO AFETIVO - POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO DECORRENTE DE DANO MORAL - CARÁTER EXCEPCIONALÍSSIMO COMPROVADO - PROCEDÊNCIA DO PEDIDO - SENTENÇA MANTIDA - REDUÇÃO DO VALOR - POSSIBILIDADE - CAPACIDADE FINANCEIRA REDUZIDA DO GENITOR - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. - Segundo entendimento do col. Superior Tribunal de Justiça, em caráter excepcionalíssimo, é juridicamente possível a reparação de danos pleiteada pelo filho em face dos pais fulcrado no abandono afetivo - O sucesso da pretensão indenizatória com fundamento no abandono afetivo exige a comprovação da conduta omissiva do pai em relação ao filho -, dano - abalo psicológico sofrido por este -, nexo de causalidade entre o ato ilícito praticado por aquele e dano sofrido por este - O fato de o autor ter comprovado os requisitos da responsabilidade civil ("ex vi" do art. 186 do Código Civil), impõe a manutenção da sentença que julgou procedente seu pedido de indenização por abandono afetivo - Restando demonstrado que o valor fixado a título de indenização está além das condições econômicas do apelante, impõe-se a redução do valor de forma a adequá-la à realidade das partes - Recurso parcialmente provido.

(TJ-MG - Apelação Cível: 0030381-48.2016.8.13.0242, Relator: Des.(a) Élito Batista de Almeida (JD Convocado), Data de Julgamento: 19/02/2024, Câmara Justiça 4.0 - Especiali, Data de Publicação: 20/02/2024)

Jurisprudência na Íntegra

Inteiro Teor 

 

Número do 1.0000.23.320929-5/001 Numeração 0030381- 

  

Relator: Des.(a) Élito Batista de Almeida (JD Convocado) 

  

Relator do Acordão: Des.(a) Élito Batista de Almeida (JD Convocado) 

  

Data do Julgamento: 19/02/2024 

  

Data da Publicação: 20/02/2024 

  

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ABANDONO AFETIVO - POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO DECORRENTE DE DANO MORAL - CARÁTER EXCEPCIONALÍSSIMO COMPROVADO - PROCEDÊNCIA DO PEDIDO - SENTENÇA MANTIDA - REDUÇÃO DO VALOR - POSSIBILIDADE - CAPACIDADE FINANCEIRA REDUZIDA DO GENITOR - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 

  

- Segundo entendimento do col. Superior Tribunal de Justiça, em caráter excepcionalíssimo, é juridicamente possível a reparação de danos pleiteada pelo filho em face dos pais fulcrado no abandono afetivo. 

  

- O sucesso da pretensão indenizatória com fundamento no abandono afetivo exige a comprovação da conduta omissiva do pai em relação ao filho -, dano - abalo psicológico sofrido por este -, nexo de causalidade entre o ato ilícito praticado por aquele e dano sofrido por este. 

  

- O fato de o autor ter comprovado os requisitos da responsabilidade civil ("ex vi" do art. 186 do Código Civil), impõe a manutenção da sentença que julgou procedente seu pedido de indenização por abandono afetivo. 

  

- Restando demonstrado que o valor fixado a título de indenização está além das condições econômicas do apelante, impõe-se a redução do valor de forma a adequá-la à realidade das partes. 

  

- Recurso parcialmente provido. 

  

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.23.320929-5/001 - COMARCA DE ESPERA FELIZ - APELANTE (S): M.B.S. - APELADO (A)(S): P.S.H.B. REPRESENTADO (A)(S) P/ MÃE M.S.H. 

  

ACÓRDÃO 

  

(SEGREDO DE JUSTIÇA) 

  

Vistos etc., acorda, em Turma, a Câmara Justiça 4.0 - Especializada Cível-8 do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em dar parcial provimento ao recurso. 

  

JD. CONVOCADO ÉLITO BATISTA DE ALMEIDA 

  

RELATOR 

  

JD. CONVOCADO ÉLITO BATISTA DE ALMEIDA (RELATOR) 

  

VOTO 

  

Trata-se de recurso de apelação interposto por M.B.S., contra sentença proferida pelo juízo da Vara Única da Comarca de Espera Feliz (doc. ordem 

  

33) que, nos autos da ação revisional de alimentos, c/c indenização por dano moral por abandono afetivo ajuizada por P.S.H.B., representado por sua genitora, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, fixando indenização no valor de R$20.000,00 (vinte mil reais). 

  

Em seu inconformismo (doc. ordem 35), aduz, em síntese, que o dano moral por abandono afetivo não resta configurado, haja vista que a circunstância de pai e filho não estreitarem laços deu-se em razão de comportamento da genitora, que inviabilizava os encontros, não permitindo convívio com sua outra filha e esposa, além de inexistir comprovação de danos causados ou efetivo prejuízo. Alternativamente, requer a redução da condenação, ao argumento de que aufere renda inferior a um salário-mínimo, possuindo outras duas filhas, ausentes condições de suportar a indenização. 

  

Contrarrazões pela manutenção da sentença no doc. de ordem 37. 

  

O parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça é pelo parcial provimento do recurso (doc. ordem 41). 

  

É, em síntese, o relatório. 

  

Conheço do recurso, presentes os pressupostos de admissibilidade. 

  

Cinge-se a controvérsia recursal ao acerto da sentença que fixou, a título de dano moral decorrente de abandono afetivo, indenização no valor de R$20.000,00, em favor do filho. 

  

Sobre a pretensão indenizatória formulada pelo autor, o col. Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que, em caráter excepcionalíssimo, é juridicamente possível a reparação de danos pleiteada pelo filho em face dos pais fulcrado no abandono afetivo. Neste sentido: 

  

"CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. ABANDONO AFETIVO. REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. PEDIDO JURIDICAMENTE POSSÍVEL. APLICAÇÃO DAS REGRAS DE RESPONSABILIDADE CIVIL NAS RELAÇÕES FAMILIARES. OBRIGAÇÃO DE PRESTAR ALIMENTOS E PERDA DO PODER FAMILIAR. DEVER DE ASSISTÊNCIA MATERIAL E PROTEÇÃO À INTEGRIDADE DA CRIANÇA QUE NÃO EXCLUEM A POSSIBILIDADE DA REPARAÇÃO DE DANOS. RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DOS PAIS. PRESSUPOSTOS. AÇÃO OU OMISSÃO RELEVANTE QUE REPRESENTE VIOLAÇÃO AO DEVER DE CUIDADO. EXISTÊNCIA DO DANO MATERIAL OU MORAL. NEXO DE CAUSALIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS NA HIPÓTESE. CONDENAÇÃO A REPARAR DANOS MORAIS. CUSTEIO DE SESSÕES DE PSICOTERAPIA. DANO MATERIAL OBJETO DE TRANSAÇÃO NA AÇÃO DE ALIMENTOS. INVIABILIDADE DA DISCUSSÃO NESTA AÇÃO. 

  

... 

  

2- O propósito recursal é definir se é admissível a condenação ao pagamento de indenização por abandono afetivo e se, na hipótese, estão presentes os pressupostos da responsabilidade civil. 

  

3- É juridicamente possível a reparação de danos pleiteada pelo filho em face dos pais que tenha como fundamento o abandono afetivo, tendo em vista que não há restrição legal para que se apliquem as regras da responsabilidade civil no âmbito das relações familiares e que os arts. 186 e 927, ambos do CC/2002, tratam da matéria de forma ampla e irrestrita. Precedentes específicos da 3a Turma. 

  

4- A possibilidade de os pais serem condenados a reparar os danos morais causados pelo abandono afetivo do filho, ainda que em caráter excepcional, decorre do fato de essa espécie de condenação não ser afastada pela obrigação de prestar alimentos e nem tampouco pela perda do poder familiar, na medida em que essa reparação possui fundamento jurídico próprio, bem como causa específica e autônoma, que é o descumprimento, pelos pais, do dever jurídico de exercer a parentalidade de maneira responsável. 

  

5- O dever jurídico de exercer a parentalidade de modo responsável compreende a obrigação de conferir ao filho uma firme referência parental, de modo a propiciar o seu adequado desenvolvimento mental, psíquico e de personalidade, sempre com vistas a não apenas observar, mas efetivamente concretizar os princípios do melhor interesse da criança e do adolescente e da dignidade da pessoa humana, de modo que, se de sua inobservância, resultarem traumas, lesões ou prejuízos perceptíveis na criança ou adolescente, não haverá óbice para que os pais sejam condenados a reparar os danos experimentados pelo filho. 

  

6- Para que seja admissível a condenação a reparar danos em virtude do abandono afetivo, é imprescindível a adequada demonstração dos pressupostos da responsabilização civil, a saber, a conduta dos pais (ações ou omissões relevantes e que representem violação ao dever de cuidado), a existência do dano (demonstrada por elementos de prova que bem demonstrem a presença de prejuízo material ou moral) e o nexo de causalidade (que das ações ou omissões decorra diretamente a existência do fato danoso). 

  

7- Na hipótese, o genitor, logo após a dissolução da união estável mantida com a mãe, promoveu uma abrupta ruptura da relação que mantinha com a filha, ainda em tenra idade, quando todos vínculos afetivos se encontravam estabelecidos, ignorando máxima de que existem as figuras do ex-marido e do ex-convivente, mas não existem as figuras do ex-pai e do ex-filho, mantendo, a partir de então, apenas relações protocolares com a criança, insuficientes para caracterizar o indispensável dever de cuidar. 

  

8- Fato danoso e nexo de causalidade que ficaram amplamente comprovados pela prova produzida pela filha, corroborada pelo laudo pericial, que atestaram que as ações e omissões do pai acarretaram quadro de ansiedade, traumas psíquicos e sequelas físicas eventuais à criança, que desde os 11 anos de idade e por longo período, teve de se submeter às sessões de psicoterapia, gerando dano psicológico concreto apto a modificar a sua personalidade e, por consequência, a sua própria história de vida. 

  

9- Sentença restabelecida quanto ao dever de indenizar, mas com majoração do valor da condenação fixado inicialmente com extrema modicidade (R$ 3.000,00), de modo que, em respeito à capacidade econômica do ofensor, à gravidade dos danos e à natureza pedagógica da reparação, arbitra-se a reparação em R$ 30.000,00. 

  

10- É incabível condenar o réu ao pagamento do custeio do tratamento psicológico da autora na hipótese, tendo em vista que a sentença homologatória de acordo firmado entre as partes no bojo de 

  

ação de alimentos contemplava o valor da mensalidade da psicoterapia da autora, devendo eventual inadimplemento ser objeto de discussão naquela seara. 

  

11- Recurso especial conhecido e parcialmente provido, a fim de julgar procedente o pedido de reparação de danos morais, que arbitro em R$ 30.000,00), com juros contados desde a citação e correção monetária desde a publicação deste acórdão, carreando ao recorrido o pagamento das despesas, custas e honorários advocatícios em razão do decaimento de parcela mínima do pedido, mantido o percentual de 10% sobre o valor da condenação fixado na sentença." (STJ, REsp n. 1.887.697/RJ, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 21/9/2021, DJe de 23/9/2021.) 

  

No caso dos autos, entendo por caracterizados os requisitos da responsabilidade civil ("ex vi" do art. 186 do CC) para os fins da indenização por dano moral decorrente de abandono afetivo, quais sejam, ato ilícito - conduta omissiva do apelante em relação ao apelado -, dano - abalo psicológico sofrido pelo filho -, nexo de causalidade entre o ato ilícito praticado pelo genitor e o alegado dano sofrido por ele. 

  

De fato, restringiu-se o ora apelante em alegar que o convívio era dificultado pela genitora, além de invocar a ausência de dano psicológico. 

  

Sem razão, contudo. 

  

Muito embora não se possa obrigar o pai a dar afeto e carinho ao filho, tratando-se de sentimento subjetivo, tem-se que o genitor tem o dever de assistir àquele de forma satisfatória, de forma a prestar-lhe cuidados e participar de sua educação. 

  

Restou inconteste nos autos, pela própria fala do réu, que este se fez negligente em tais aspectos no tocante ao filho, sendo irrelevante tenha havido dificuldades no relacionamento com a genitora, data vênia, pois poderia buscar meios outros de assegurar a convivência com o infante. 

  

Outrossim, a prova dos autos aponta o abalo psicológico sofrido pela criança decorrente destes fatos, em patente nexo de causalidade. 

  

O laudo psicológico realizado com o menor aponta, de forma inconteste, que este possui desenvolvimento inferior aos pares, dificuldade de controlar impulsos, e atitude agressiva, envolvendo demonstrações de baixa autoestima e descontrole de humor. Por sua vez, o relatório multidisciplinar denota que o tema relacionado ao pai sempre vem à tona durante as sessões. Neste tópico, oportuna transcrição de trecho que exemplifica o nexo de causalidade da ausência de relacionamento paterno com o dano evidenciado: 

  

(...) relata querer muito ter um, mas, acha que nunca vai conseguir. E tenta eleger pessoas do sexo masculino que vivem em seu meio social, como pai. Mas sempre fica magoado pois eles não preenchem suas expectativas, e cada vez que isso ocorre seu comportamento impulsivo e opositor fica mais evidente. 

  

Como bem pontuou a douta Procuradoria Geral de Justiça, "Do acompanhamento psicológico constata-se que a conduta do apelante ultrapassa o mero aborrecimento e acarretou sofrimento psicológico à criança, que necessita de acompanhamento profissional", além do que "não se pode olvidar que o apelado tem diagnóstico de TDAH (peça de ID n. 391943433), situação que agrava as condições do recorrido, exigindo maiores cuidados por parte dos genitores." 

  

Assim, tenho que a sentença não merece reparo no tocante ao reconhecimento do dano moral decorrente de abandono efetivo. 

  

Contudo, tenho que a indenização no montante de R$20.000,00 está além das condições do apelante, em vista de sua parca condição financeira, demonstrada renda mensal entorno de um salário-mínimo, somada à circunstância de que possui outros filhos, além da pensão alimentícia já paga ao recorrido. 

  

Assim, hei por bem reduzir o valor da indenização para R$12.000,00 (doze mil reais), mantidas as demais condições fixadas na sentença. 

  

Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, na forma supra delineada. 

  

Custas e honorários pelo apelante, suspensa a exigibilidade por litigar sob o pálio da justiça gratuita. 

  

DESA. MARIA LUÍZA SANTANA ASSUNÇÃO - De acordo com o (a) Relator (a). 

  

DES. ENÉIAS XAVIER GOMES - De acordo com o (a) Relator (a). 

  

SÚMULA: "Deram parcial provimento ao recurso."