#1 - Medida Protetiva e Suspensão de Visitas. Violência Doméstica e Infantil.

Data de publicação: 20/05/2024

Tribunal: TJ-MG

Relator: Des.(a) Teresa Cristina da Cunha Peixoto

Chamada

(...) “Embora a guarda compartilhada seja a regra geral prevista na legislação, a guarda unilateral pode ser fixada em situações em que o compartilhamento não se mostrar recomendável e colocar em risco o desenvolvimento sadio do menor, o que encontra amparo no princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, previsto no artigo 227 da Constituição Federal.” (...)

Ementa na Íntegra

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE MODIFICAÇÃO DE GUARDA C/C MEDIDA PROTETIVA C/C SUSPENSÃO AO DIREITO DE VISITAS - GUARDA UNILATERAL - EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA - CABIMENTO - PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA - RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Em que pese as críticas doutrinárias no sentido de que, na prática, a guarda compartilhada se mostraria inviável quando não há plena harmonia entre os genitores, o CC/02 determina que, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, deve ser estabelecida a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar que não deseja a guarda do filho. 2. No caso específico dos autos e em atenção princípio do melhor interesse da criança, ainda que se reconheça que há elevado grau de afetividade entre o genitor e seu filho, deve ser confirmada a sentença que estabeleceu a guarda uniliteral em favor da genitora, com visitas assistidas do genitor, tendo em vista o alto grau de litigiosidade entre os pais, o fato de haver medida protetiva em favor da genitora, os indícios de prática de alienação parental pelo genitor e a ação penal em curso por crime sexual imputado ao mesmo. 3. Negar provimento ao recurso. 

(TJ-MG - AC: 50363742020208130024, Relator: Des.(a) Teresa Cristina da Cunha Peixoto, Data de Julgamento: 14/09/2023, 8ª Câmara Cível Especializada, Data de Publicação: 15/09/2023) 

 

Jurisprudência na Íntegra

Inteiro Teor 

Número do 1.0000.23.157624-0/001 Numeração 5036374- 

Relator: Des.(a) Teresa Cristina da Cunha Peixoto 

Relator do Acordão: Des.(a) Teresa Cristina da Cunha Peixoto 

Data do Julgamento: 14/09/2023 

Data da Publicação: 15/09/2023 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE MODIFICAÇÃO DE GUARDA C/C MEDIDA PROTETIVA C/C SUSPENSÃO AO DIREITO DE VISITAS - GUARDA UNILATERAL - EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA - CABIMENTO - PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA - RECURSO NÃO PROVIDO. 

1. Em que pese as críticas doutrinárias no sentido de que, na prática, a guarda compartilhada se mostraria inviável quando não há plena harmonia entre os genitores, o CC/02 determina que, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, deve ser estabelecida a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar que não deseja a guarda do filho. 

2. No caso específico dos autos e em atenção princípio do melhor interesse da criança, ainda que se reconheça que há elevado grau de afetividade entre o genitor e seu filho, deve ser confirmada a sentença que estabeleceu a guarda uniliteral em favor da genitora, com visitas assistidas do genitor, tendo em vista o alto grau de litigiosidade entre os pais, o fato de haver medida protetiva em favor da genitora, os indícios de prática de alienação parental pelo genitor e a ação penal em curso por crime sexual imputado ao mesmo. 

3. Negar provimento ao recurso. 

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.23.157624-0/001 - COMARCA DE TIMÓTEO - APELANTE (S): A.G.A. - APELADO (A)(S): L.C.P.O. 

ACÓRDÃO 

(SEGREDO DE JUSTIÇA) 

Vistos etc., acorda, em Turma, a 8a Câmara Cível Especializada do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO. 

DESA. TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO 

RELATORA 

DESA. TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO (RELATORA) 

VOTO 

Conheço do recurso interposto, presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade. 

Trata-se de "Ação de Modificação de Guarda c/c Pedido de Tutela de Urgência c/c Pedido de Medida Protetiva c/c Suspensão ao Direito de Visitas" ajuizada por L. C. P. O. em face de A. G. A., alegando, em suma, que "a Genitora e o Genitor comungavam de guarda compartilhada do menor (R.) oriunda da ação judicial desde 13 (treze) de março de 2019 - 5065690- 49.2018.8.13.0024. A genitora possui uma irmã de 4 anos (mesma idade do menor R.), onde ambos embora sejam tia e sobrinho, convivem como irmãos em razão de possuir a mesma idade (4 anos). Acontece que na data de 06/01/2020 a genitora e seus familiares tomaram conhecimento por meio de sua irmã (L.- 4 anos) que relatou 'ter sido tocada em suas partes íntimas pelo pai do menor R. (ex-companheiro da Autora) afirmando que ele (A.-réu) teria passado a língua em sua 'pepeca'. Diante do relato, assustada e indignada com o relatado por irmã em relação a A., a genitora passou a investigar se os relatos de abusos sexuais teriam sido estendidos também a seu filho R., filho do réu. Ao chamar o menor para conversar, o menor R. também relatou que 'o papai coloca a boca no meu 'pipiu', eu não aguento e faço xixi'. Diante da confirmação do mesmo fato por ambos os menores a autora e sua mãe decidiram procurar a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente afim de denunciar os relatos de abuso sexuais infantil para que pudessem ser investigados. Com o objetivo de proteção dos menores e temendo por sua integridade física, a Autora mudou de endereço. Dê-lá-pra-cá, a autora vem sofrendo ameaças constantes de seu ex-marido-companheiro, onde ele afirma que 'irá matá-la', fato registrado por Boletim de Ocorrência em anexo. Tem-se informações de que o Sr. A. - ora requerido, tem feito uso de drogas ilícitas o que torna a situação ainda mais perigosa. Não restando dúvida, portanto, que a integridade física do menor esteja ameaçada caso seja permitido a continuidade da convivência com o pai sem a devida investigação. Cabe registrar que as irmãs do Genitor/A. (tias dos menores), em conversa com a autora, apoiou a mesma que procurasse a polícia para relatar o ocorrido, caso contrário, a mesma (tia) fariam a denúncia a fim de resguardar a integridade física do sobrinho. Inclusive, se propõe a prestar depoimento em AIJ." 

Contestação às fls. 123/131 e Impugnação às fls. 142/146. 

Relatório Social às fls. 217/223. 

Parecer do Ministério Público do Estado de Minas Gerais às fls. 268/275 pela "PROCEDÊNCIA dos pedidos iniciais, para fixar a guarda unilateral do menor R. O. A. com a requerente, devendo as visitas paternas serem regulamentadas de forma assistida, por pessoa de confiança de ambas as partes, nos termos sugeridos pela assistente social judicial (ID: 9579988892), com a consequente extinção do processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil." 

Na sentença de fls. 276/279, o MM. Juiz de Direito, Dr. MAYCON JÉSUS BARCELOS, da 2a Vara Cível da Comarca de Timóteo julgou 

"PROCEDENTES os pedidos autorais, pelo que extingo o feito com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para fixar a guarda unilateral em favor da requerente, devendo a convivência paterno-filial ser realizada de forma assistida, por pessoas indicadas pelas partes, a cada 15 (quinze) dias, durante aos sábados das 10h às 20h, e aos domingos das 9h às 18h, visando, a priori, a reconstrução da relação da criança com seu genitor, avós e demais familiares paternos. CONDENO o requerido ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios sucumbenciais, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, ficando, contudo, suspensa a exigibilidade, em razão dos benefícios da justiça gratuita outrora concedidos. (art. 98, § 3º, CPC)." 

Inconformado, apelou o réu às fls. 289/295, sustentando, em suma, que "a sentença fora lavrada tendo como base apenas as entrevistas da Recorrida e a do menor, quando da realização do estudo psicossocial. Apesar de constar no despacho id nº 119969181 - Pág. 05, que boletim de ocorrência não é suficiente para comprovar nada, mas, tão somente, corroborar alegações do declarante, não se verifica nos autos documentos aptos a demonstrar cabalmente que o Apelante tenha proferido ameaças à Apelada. Conforme já relatado noutras oportunidades, não se extrai qualquer tipo de diálogo neste sentido. Diga-se de passagem, Exa., os únicos e-mails carreados ao processo demonstram um diálogo acalorado entre os interlocutores, porém, nenhuma ameaça. Além disso, não é possível extrairmos dos autos exames toxicológicos ou quaisquer laudos psiquiátricos que demonstrem cabalmente o uso de drogas ou mesmo de eventuais tratamentos realizados por parte do Recorrente, conforme alegado. Ademais, não restou provada nenhuma das acusações da Apelada em face do Apelante, conforme se depreende dos depoimentos colhidos na instrução processual. Isto pois, nenhuma das testemunhas ouvidas estavam presentes no local em que os supostos abusos teriam sido cometidos, apenas testemunharam por ouvir dizer. Assim, verifica-se que as únicas provas que foram levadas em consideração para a lavratura da sentença foram os depoimentos da Apelada e do menor, quando da realização do estudo psicossocial." Afiançou, ainda, que "a decisão não levou em consideração o período em que o menor permaneceu sob custódia do Apelante por mais de 02 (dois) anos, período em que a Apelada estudou e residiu fora do País, frisa-se, sem qualquer conduta que o desabonasse. (...) Assim, extrai-se da afirmativa da Recorrida que, mesmo após a suposta ocorrência dos fatos de que acusa o Recorrente, qual seja, de abusar das crianças, consente que seu filho fique por 30 (trinta) dias com o genitor em sua residência. Como se não bastasse, em julho/2022, a Apelada enviou mensagem (documento id nº 9713046681 - Pág. 01) pedindo trégua e consentindo que as visitas paternas ocorressem. Definitivamente, este não é o comportamento esperado de uma mãe que acusa o pai de abuso ao filho e à sua irmã menor. Certo é, Exa., que nunca houve qualquer tipo de ameaça ou violação aos direitos dos menores, muito menos o cometimento de qualquer abuso sexual a nenhuma das partes." Pugnou, ao final, pelo provimento do recurso. 

Sem contrarrazões (fl. 298). 

Processo distribuído por sorteio (fl. 318). 

Parecer da d. Procuradoria-Geral de Justiça pelo "desprovimento do recurso aviado, nos termos deste parecer." 

Revelam os autos L. C. P. O. ajuizou "Ação de Modificação de Guarda c/c Pedido de Tutela de Urgência c/c Pedido de Medida Protetiva c/c Suspensão ao Direito de Visitas" em face de A. G. A., tendo o em. Juiz de primeira instância julgado "PROCEDENTES os pedidos autorais, pelo que extingo o feito com resolução de mérito, nos termos do artigo 487I, do CPC, para fixar a guarda unilateral em favor da requerente, devendo a convivência paterno-filial ser realizada de forma assistida, por pessoas indicadas pelas partes, a cada 15 (quinze) dias, durante aos sábados de 10h às 20h, e aos domingos das 9h às 18h, visando, a priori, a reconstrução da relação da criança com seu genitor, avós e demais familiares paternos...", o que gerou a presente irresignação. 

Feito o necessário resumo, esclarece-se, inicialmente, que, no tocante à guarda, a Lei nº. 13.058/2014 promoveu significativas alterações no Código Civil de 2002, deixando clara a preferência do legislador pela guarda compartilhada, em que ambos os pais permanecem responsáveis pelas obrigações inerentes ao poder familiar, sendo dividido de forma equilibrada o tempo de convívio dos filhos com os genitores, evitando- se, dessa forma, um distanciamento do genitor/genitora que não mais resida com o filho: 

Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada. (Redação dada pela Lei nº 11.698, de 2008). 

§ 1o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008). 

§ 2o Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos: (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014) 

Dessa forma, em que pese as críticas doutrinárias no sentido de que, na prática, a guarda compartilhada se mostraria inviável quando não há plena harmonia entre os genitores, o CC/02 determina que, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, deve ser estabelecida a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar que não deseja a guarda do filho: 

Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: 

I - Requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar; (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008). 

II - Decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do 

filho, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008). 

§ 1o Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008). 

§ 2 o Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor. (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014) 

Nesse mister e no caso dos autos, extrai-se do Relatório Social de fls. 217/223: 

4.1 - Entrevista com a Requerente 

L. C. e o requerido A. G. se relacionaram por três anos e coabitaram o mesmo teto por 1 (um) ano e 11 (onze) meses, na cidade de Belo Horizonte- MG. A dissolução da união estável, efetivou-se porque a demandante era vítima de violência doméstica. 

A requerente afirma que o relacionamento era salutar, mas após o nascimento do filho, os episódios de violência, iniciaram-se. O requerido a tratava de forma hostil e a insultava com palavras agressivas. Quando a criança completou quatro meses, se separaram, mas reataram após três meses e o relacionamento ficou cada vez mais desgastante e instável. Em dezembro de 2016, os genitores e o infante estavam no litoral com familiares do demandado e após nova discussão, optou pelo rompimento. 

Apesar das causas que culminaram na desvinculação do casal, compreendia a importância da convivência entre pai e filho, sendo assim, esforçou-se para que fosse organizada de forma livre e que mantivessem diálogo acerca das questões relativas ao infante. Com a dissolução da união estável, foi estabelecido alimentos e a regulamentação da convivência, com guarda compartilhada e residência fixa com a genitora. Além dos finais de semanas alternados, duas vezes por semana, A. buscava o filho na escola e em um desses dias, R. pernoitava em sua residência. 

Naquela época, a demandante cursava mestrado com aulas todos os sábados e o genitor cuidava do filho. Em outro período, prestou serviço por seis meses na Argentina e sua permanência naquele país era quinzenal, sendo assim, o genitor incumbia-se das responsabilidades com o filho, quando não estava no Brasil. A operacionalização da convivência funcionou de maneira harmônica por dois anos. 

Todavia, em meados de 2019, sua irmã A. A. P. O., 7 (sete) anos, verbalizou que o ex-cunhado "lambeu a pepeca dela" (sic). O fato teria ocorrido quando o demandado levou o filho e a infante para um aniversário e nesse encontro, teria ocorrido a violência, sendo R. a principal testemunha. A., aos dois anos de idade, relatou suposto abuso por parte de A., mas os familiares não deram a devida atenção, porque acreditavam na sua idoneidade. 

A requerente inicialmente não teve conhecimento deste fato, pois estava em Belo Horizonte, mas quando visitou os pais no período de férias (dezembro de 2019) foi informada sobre a violência e sua irmã relatou novamente a história, sendo também confirmada pelo filho. Além disso, o infante afirmou que o genitor "colocou o piupiu em sua boca e fez xixi" (sic), mas em seguida desmentiu. Recorda-se, que foi um período conturbado, porque além da notícia do abuso, tinha recebido ameaças de morte por parte de A., porque discordou da forma como a convivência ficou estabelecida no recesso escolar de R. 

Quanto ao suposto abuso de A., as irmãs do requerido tiveram conhecimento e apoiaram que ela e seus genitores o denunciassem. Diante da gravidade da situação, sentiu-se muito confusa e precisou refletir sobre tudo que estava vivenciado, por isso suspendeu os contatos entre pai e filho por um curto período. As ameaças se intensificaram e em janeiro de 2020, prestou queixa na delegacia da mulher pelas ameaças sofridas e da criança e do adolescente em relação ao suposto abuso ocorrido pela irmã A. 

O genitor após ter conhecimento da denúncia, durante os encontros com o filho, abordava sobre as questões relativas à denúncia da violência praticada contra a ex-cunhada e criava histórias objetivando gerar novas memórias no infante, deixando-o confuso sobre o que presenciou. 

Mediante as ameaças e por se sentir amedrontada, afastou-se do trabalho presencial, mudou de apartamento, trocou o filho de escola e parou de frequentar locais públicos. Os contatos entre pai e filho ocorriam por chamada de vídeo e nesses momentos, o requerido continuava ofendendo a genitora tentando denegrir sua imagem com a prole. 

Em março de 2020, com a pandemia do Covid19, a requerente passou a trabalhar de home office e decidiu retornar para Timóteo, pois seus genitores, residem nessa cidade e na capital mineira, não tinha parentes que pudessem apoiá-la. Diante disso, os contatos do requerido com o filho continuaram através de ligações, chamadas de vídeo e A. insistia em abordar o assunto do suposto abuso contra A., imprimindo outras versões e desqualificando a demandante. 

Em agosto de 2020, o infante pediu para visitar o genitor e a requerente o levou para Belo Horizonte-MG. Em novembro do referido ano, a criança visitou o pai novamente e permaneceu por trinta dias em sua companhia. A namorada de A., na época, contatou a demandante após romper o relacionamento, informando que naquele período usaram drogas e brigaram constantemente na presença do infante. 

Enfatiza, que após a mudança para Timóteo, o requerido não visitou o filho, apesar das solicitações do infante e as duas vezes que o menor se deslocou para Belo Horizonte, ela que ficou responsável por levá-lo. 

Em março de 2021, o Ministério Público ofereceu denúncia acerca do suposto abuso sexual. R. e A. também realizaram Depoimento Especial, desde então, a requerente não permitiu que a criança fosse para Belo Horizonte, porém, não impediu que os contatos entre o infante e o genitor, se efetivassem em Timóteo-MG, mas, o demandado ficou um ano sem ver R. 

Somente em março de 2022, A. visitou o filho, passaram o dia no shopping, junto a avó paterna. Após 40 (quarenta) dias ocorreu outro encontro, dessa vez sem a presença de qualquer familiar do requerido e ficou apreensiva. Em 23/07/2022, o demandado pegou o filho e após algumas horas, comunicou que estava com a criança em Belo Horizonte, ou seja, não a informou da decisão, transportou o menor sem qualquer documentação e objetos pessoais. 

Após ter enviado mensagem, A. desligou o telefone e a demandante tentou contatos com os familiares dele, mas os avós paternos não atenderam a ligação. Uma tia paterna foi quem a apoiou e somente no horário noturno, conseguiu falar com o filho, porém, a criança argumentou que estava proibida de informar seu paradeiro. 

Face a atitude do requerido, solicitou a busca e apreensão da criança e obteve deferimento. Informou o genitor sobre a determinação judicial, mas A. recusou-se entregar R. Almejando evitar uma situação traumática para o menor, a demandante foi até Belo Horizonte e enfatizou para o requerido, a importância de acatar as decisões e poupar o filho de vivenciar situações que acarretassem consequências emocionais negativas. 

R. foi entregue para a mãe em 26/07/2022 e o genitor, naquele momento, novamente a ofendeu e ameaçou na presença da criança. O infante estava nervoso, chorou copiosamente e afirmou que o demandado relatou que ela acionou a polícia e por isso seria encaminhado para um abrigo institucional para crianças. O menor 

alegou que era culpado pelas divergências entre os genitores e que desejava morrer. 

Garante que apesar do relacionamento conflituoso com o requerido, tenta poupar o filho, porque considera que as divergências devam ser solucionadas entre as partes. Também entende que o rompimento conjugal, não deve significar a desvinculação parental, porém, A. não poupa o filho e realiza um processo de alienação parental, denegrindo sua imagem e tomando atitudes que afetam o menor em todos os aspectos. 

Quanto as funções relativas à maternidade, está convicta que as exerce responsavelmente e que busca sempre acertar, pois a prole é sua prioridade. 

Preocupa-se com as condições emocionais do filho e não gostaria que R. vivenciasse todos esses problemas. Reconhece que ser mãe solo não é fácil, mas que faz todo o possível para garantir o melhor para o infante. Apesar de todos os conflitos, admite os vínculos existentes entre pai e filho "eles são apaixonados pelo outro", (sic) e a importância da convivência. 

Deseja a guarda unilateral e que as visitas sejam assistidas, visto que, o genitor em todos os contatos com o infante, o manipula, cita e cria novas versões acerca do abuso e a difama. Tal situação, faz com que a criança, sinta-se culpada pelos conflitos ou a culpabilize, haja vista que a responsabiliza pelo afastamento do pai, principalmente por viverem em cidades distintas. 

A requerente se coloca à disposição para colaborar quando necessário, no deslocamento de R. para a cidade do genitor, mas gostaria que quando as visitas forem realizadas na capital mineira, se efetivem na residência das tias paternas, por não compactuarem com a alienação parental feita pelo demandado. 

4.2 - Entrevista a criança 

R. O. A., 7 (sete) anos, cursa a 1ª série na Escola Estadual Getúlio Vargas. Informou que atualmente reside com a requerente na cidade de Timóteo-MG, porque os genitores se separaram. 

Afirma ser muito legal morar com a mãe e reconhece que não lhes faltam os recursos necessários para a sobrevivência. Descreveu sua rotina da seguinte forma: acorda e toma café da manhã preparado pela genitora (pão de queijo, pão de sal, leite com Tody); realiza as tarefas escolares com ajuda da requerente; assiste TV; almoça; vai para escola no período vespertino; a noite faz jiu-jitsu e brinca. 

Destacou que frequenta a casa dos avós maternos, que gosta muito de passear no local e que possui uma tia de sua idade, que estuda na mesma escola, mas que não pode ter contatos com o requerido "porque ele lambeu a pepeca dela" (sic). 

Quanto a separação considera ser "bem chata porque eu queria ver mais meu pai" (sic). Avalia que o genitor é divertido, porque "ele me deixa largar comida" (sic) e a mãe é mais exigente. Garante que os pais não possuem boa relação, "quando converso com ele pelo telefone, ele xinga minha mãe de canalha" (sic). Sente tristeza pela situação e recomendaria para os casais separados "serem amigos" (sic). 

Na última visita, o pai questionou se gostaria de ir para Belo Horizonte-MG e concordou "ele me levou escondido e disse que nunca mais ia voltar aqui, porque se for voltar é para matar minha mãe e eu fiquei caladinho para ele não brigar comigo" (sic). 

Deseja que a requerente se mude para Belo Horizonte, porque "é muito legal passar uns dias com ele" (sic). 

5 - Parecer Técnico 

A genitora possui capacidade para cumprir as prerrogativas decorrentes do poder familiar. A criança está inserida num contexto familiar que exerce o dever do cuidado e proteção. 

Quanto ao modelo de guardiania, não existem dúvidas, que a guarda compartilhada é a mais adequada na maioria dos casos, pois esse modelo exige a partilha de decisões e manutenção de diálogo ou, no mínimo, contatos. Afinal, trata-se de definir, desde questões corriqueiras da rotina dos filhos como a logística da ida à escola, até questões que impactam no destino deles, como por exemplo, onde estudar, se poderão fazer alguma atividade ou se será possível determinado investimento educacional. No caso em tela, a operacionalização desse modelo poderá sofrer dificuldades, em virtude do relacionamento conflituoso entre as partes, Medida Protetiva estabelecida e ameaças do requerido. 

No que ser refere a convivência, mesmo após a ruptura da relação conjugal, os filhos possuem o direito fundamental e necessário de continuarem vivendo a filiação e a convivência familiar e comunitária está garantida nos artigos 227 da Constituição Federal e 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. 

Entende-se que o primeiro passo na escalada de reconstrução da relação da criança com seu genitor, avós e demais familiares paternos é o estabelecimento da convivência, todavia, existem aspectos abordados nas entrevistas que exigem atenção, principalmente, no que se refere a possibilidade de um processo de alienação parental, por conseguinte, sugere- se que os contatos e visitas iniciais, sejam assistidas por pessoas a serem indicadas pelas partes. 

Por sua vez, opinou o Ministério Público do Estado de Minas Gerais em primeiro grau: 

(...) 

No caso dos autos, além da distância geográfica entre as residências dos genitores, o relacionamento conflituoso existente - que inclusive desaguou no deferimento de medida protetiva em favor da requerida, após ameaças por parte do requerido (ID 107010357) -, evidencia que a guarda unilateral é a mais ajustada ao melhor interesse do incapaz. 

A excepcionalidade da medida é corroborada pela existência da ação penal nº 0024.20.010013-9 em desfavor do requerido, pela pretensa prática de atos libidinosos contra menor A. A. P. O., irmã da requerente, e contra o próprio filho (ID: 3458256432). 

(...) 

Portanto, visando resguardar o direito fundamental da criança e do próprio genitor de conviverem, sem descuidar da cautela que a situação exige, na esteira do parecer social, entendo que as visitas devem ser regulamentadas conforme a praxe do juízo, mas de forma assistida por pessoas indicadas pelas partes. 

Com efeito, após a análise dos autos, em que pese haver forte vínculo afetivo entre o genitor e seu filho, a excepcionalidade do deferimento da guarda unilateral da criança à genitora se justifica, mormente em se considerando o alto grau de litigiosidade entre os pais e os fortes indícios de alienação parental e descompostura do genitor frente ao infante. 

De fato, restou demonstrado que há medida de proteção deferida em favor da genitora em razão de ameaças realizadas pelo apelante, tendo a própria criança declarado que o pai xinga e ameaça sua mãe na sua frente. 

Não bastasse, consta dos autos que há ação penal em curso em que o apelante foi denunciado pela prática de crime sexual, por ter segundo a acusação praticado atos libidinosos contra a irmã da genitora (criança) e o próprio filho. 

Nesse mister, ainda que se reconheça que há elevado grau de afetividade entre o genitor e seu filho, por ora, deve ser confirmada a sentença que estabeleceu a guarda uniliteral em favor da genitora, com visitas assistidas do genitor, tendo em vista, reafirmo, o alto grau de litigiosidade entre os pais, os indícios de prática de alienação parental pelo genitor e a ação penal em curso por crime sexual que lhe foi imputado. 

Por fim, esclarece-se que, com o tempo, evidenciadas novas circunstâncias favoráveis ao apelante, nada impede que as visitações sejam ampliadas ou mesmo retirada a necessidade de se realizarem de forma assistida, tendo em vista sempre o princípio do melhor interesse da criança e o fortalecimento das relações familiares. 

Nesse sentido, decidiu este eg. Tribunal: 

DIREITO DE FAMÍLIA - DIREITO PROCESSUAL CIVIL - APELAÇÃO - AÇÃO DE GUARDA, ALIMENTOS, FIXAÇÃO DE VISITA - GUARDA COMPARTILHADA - REGRA GERAL - CONFLITOS ENTRE O CASAL E ENTRE O PAI E A FILHA ADOLESCENTE - ALIMENTOS - FILHA MENOR - CAPACIDADE DO ALIMENTANTE - NECESSIDADE DA ALIMENTANDA - ALTERAÇÃO DO VALOR - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO DESPROVIDO 

- Embora a guarda compartilhada seja a regra geral prevista na legislação, a guarda unilateral pode ser fixada em situações em que o compartilhamento não se mostrar recomendável e colocar em risco o desenvolvimento sadio do menor, o que encontra amparo no princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, previsto no artigo 227 da Constituição Federal. 

- O valor da pensão deve ser fixado com base na necessidade de quem pede e na capacidade de quem deve pagar, sendo descabida a alteração do valor fixado na sentença quando os elementos contidos nos autos indicam a possibilidade financeira do alimentante, e a necessidade por parte de seu filho menor. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.23.067020-0/001, Relator (a): Des.(a) Moreira Diniz, 4a Câmara Cível Especializada, julgamento em 13/07/2023, publicação da súmula em 14/07/2023) 

Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso. 

De ofício, majoro os honorários sucumbenciais para 12% sobre o valor da causa (art. 85§ 11º, do CPC/15), suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade de justiça deferida (arts98 e segs. do CPC/15). 

Custas ex lege. 

DES. ALEXANDRE SANTIAGO - De acordo com o (a) Relator (a). 

DESA. ÂNGELA DE LOURDES RODRIGUES - De acordo com o (a) Relator (a). 

SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO"