#1 - Igualdade entre os filhos. Capacidade Financeira do Alimentante. Nova Família.

Data de publicação: 17/04/2024

Tribunal: TJ-MG

Relator: Des.(a) Delvan Barcelos Júnior

Chamada

(...) “A constituição de nova família e o nascimento de outros filhos, não justifica, por si só, a alteração dos alimentos já prestados, devendo ser demonstrada, no caso concreto, a diminuição substancial da capacidade financeira do alimentante, conforme os critérios da necessidade, possibilidade e razoabilidade.” (...) “É vedado o tratamento discriminatório entre os filhos, assim nos termos do artigo 227, § 6º, da Constituição da Republica, não sendo possível, em princípio, a fixação de alimentos em determinado percentual a favor de um dos filhos, que possa comprometer a subsistência dos demais, pois todos os filhos - indistintamente e independentemente de sua origem - necessitam de alimentos em igual medida.” (...)

Ementa na Íntegra

EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS - FILHO MAIOR COM NECESSIDADES ESPECIAIS - REDUÇÃO DA CAPACIDADE FINANCEIRA DO ALIMENTANTE - CONSTITUIÇÃO DE NOVA FAMÍLIA - IRRELEVÂNCIA - PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE OS FILHOS - PERCENTUAL SOBRE RENDIMENTOS - AJUSTE DO VALOR DA PENSÃO - INCIDÊNCIA SOBRE DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO E TERÇO DE FÉRIAS - JUSTIÇA GRATUITA - REVOGAÇÃO. -Os alimentos devem ser fixados em atenção ao binômio possibilidade/necessidade, ex vi, artigo 1.694, CC/02; -A constituição de nova família e o nascimento de outros filhos, não justifica, por si só, a alteração dos alimentos já prestados, devendo ser demonstrada, no caso concreto, a diminuição substancial da capacidade financeira do alimentante, conforme os critérios da necessidade, possibilidade e razoabilidade; -A aquisição de imóvel financiado é atinente à forma como o alimentante gerencia seus recursos financeiros, não podendo as consequências de seus atos recaírem integralmente sobre o alimentando, como justificativa para redução do encargo alimentar; -É vedado o tratamento discriminatório entre os filhos, assim nos termos do artigo 227, § 6º, da Constituição da Republica, não sendo possível, em princípio, a fixação de alimentos em determinado percentual a favor de um dos filhos, que possa comprometer a subsistência dos demais, pois todos os filhos - indistintamente e independentemente de sua origem - necessitam de alimentos em igual medida. Todavia, a igualdade como princípio, não é limitativa, pois pressupõe que as pessoas colocadas em situações diferentes sejam tratadas de forma desigual; -Embora os filhos do alimentante, sem predileções, devam ser atendidos em suas necessidades vitais, com igual acesso à alimentação, saúde, educação, cultura, lazer, etc., é certo que o filho portador de necessidades especiais pode e deve receber um valor ou percentual diferenciado em relação às demais irmãs nascidas saudáveis, não havendo de se cogitar ofensa ao princípio constitucional da igualdade; -A pensão alimentícia incide sobre o décimo terceiro salário e o terço constitucional de férias, tendo em vista que tais verbas estão compreendidas nas expressões "vencimento", "salários" ou "proventos" que consubstanciam a totalidade dos rendimentos auferidos pelo alimentante; -A dispensa do pagamento das custas e despesas (Lei 14.939/2003) ou dos honorários de sucumbência (artigo 98, CPC), pressupõe a demonstração da insuficiência de recursos pela parte que pleiteia o benefício; -Tendo em vista que a renda familiar do alimentante é superior a 4 (quatro) salários mínimos, conforme Deliberação n. 025/2015, DPMG, art. 1º, I, revoga-se o benefício da justiça gratuita a ele concedida.

 

(TJ-MG - AC: 50060159320218130625, Relator: Des.(a) Delvan Barcelos Júnior, Data de Julgamento: 06/07/2023, 8ª Câmara Cível Especializada, Data de Publicação: 06/07/2023)

Jurisprudência na Íntegra

Inteiro Teor EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS - FILHO MAIOR COM NECESSIDADES ESPECIAIS - REDUÇÃO DA CAPACIDADE FINANCEIRA DO ALIMENTANTE - CONSTITUIÇÃO DE NOVA FAMÍLIA - IRRELEVÂNCIA - PRINCÍPIO DA IGUALDADE ENTRE OS FILHOS - PERCENTUAL SOBRE RENDIMENTOS - AJUSTE DO VALOR DA PENSÃO - INCIDÊNCIA SOBRE DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO E TERÇO DE FÉRIAS - JUSTIÇA GRATUITA - REVOGAÇÃO. -Os alimentos devem ser fixados em atenção ao binômio possibilidade/necessidade, ex vi, artigo 1.694, CC/02; -A constituição de nova família e o nascimento de outros filhos, não justifica, por si só, a alteração dos alimentos já prestados, devendo ser demonstrada, no caso concreto, a diminuição substancial da capacidade financeira do alimentante, conforme os critérios da necessidade, possibilidade e razoabilidade; -A aquisição de imóvel financiado é atinente à forma como o alimentante gerencia seus recursos financeiros, não podendo as consequências de seus atos recaírem integralmente sobre o alimentando, como justificativa para redução do encargo alimentar; -É vedado o tratamento discriminatório entre os filhos, assim nos termos do artigo 227, § 6º, da Constituição da Republica, não sendo possível, em princípio, a fixação de alimentos em determinado percentual a favor de um dos filhos, que possa comprometer a subsistência dos demais, pois todos os filhos - indistintamente e independentemente de sua origem - necessitam de alimentos em igual medida. Todavia, a igualdade como princípio, não é limitativa, pois pressupõe que as pessoas colocadas em situações diferentes sejam tratadas de forma desigual; -Embora os filhos do alimentante, sem predileções, devam ser atendidos em suas necessidades vitais, com igual acesso à alimentação, saúde, educação, cultura, lazer, etc., é certo que o filho portador de necessidades especiais pode e deve receber um valor ou percentual diferenciado em relação às demais irmãs nascidas saudáveis, não havendo de se cogitar ofensa ao princípio constitucional da igualdade; -A pensão alimentícia incide sobre o décimo terceiro salário e o terço constitucional de férias, tendo em vista que tais verbas estão compreendidas nas expressões "vencimento", "salários" ou "proventos" que consubstanciam a totalidade dos rendimentos auferidos pelo alimentante; -A dispensa do pagamento das custas e despesas (Lei 14.939/2003) ou dos honorários de sucumbência (artigo 98, CPC), pressupõe a demonstração da insuficiência de recursos pela parte que pleiteia o benefício; -Tendo em vista que a renda familiar do alimentante é superior a 4 (quatro) salários mínimos, conforme Deliberação n. 025/2015, DPMG, art. 1º, I, revoga-se o benefício da justiça gratuita a ele concedida. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.22.062172-6/002 - COMARCA DE SÃO JOÃO DEL-REI - APELANTE (S): L.F.P.F. REPDO (A) P/CURADOR (A) ESPECIAL C.M.P., P.F.F. - APELADO (A)(S): L.F.P.F. REPDO (A) P/CURADOR (A) ESPECIAL C.M.P., P.F.F. A C Ó R D Ã O (SEGREDO DE JUSTIÇA) Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª Câmara Cível Especializada do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO E NEGAR PROVIMENTO AO SEGUNDO APELO. DES. DELVAN BARCELOS JUNIOR RELATOR DES. DELVAN BARCELOS JUNIOR (RELATOR) V O T O Cuida-se apelações cíveis da sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da Vara de Família e Sucessões da Comarca de São João Del-Rei que, nos autos da Ação Revisional de Alimentos ajuizada por P.F.F. contra o filho menor L.F.P.F. julgou parcialmente procedente o pedido inicial, reduzindo a pensão alimentícia para 12% (doze por cento) de seus rendimentos líquidos, incidindo, inclusive, sobre o 13º salário e férias. O requerido foi condenado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em R$ 2.000,00 (dois mil reais), suspensa a exigibilidade, pois deferida a justiça gratuita (ordem 91). Em suas razões recursais (ordem 96), L.F.P.F. alega, basicamente, a ausência de prova da redução da capacidade econômica do recorrido, em decorrência da constituição de nova família, com o nascimento de duas novas filhas, e da realização de financiamento imobiliário pelo recorrido. Por outro lado, reforça que é portador de doença grave (microcefalia) e possui baixa imunidade, adoecendo constantemente, necessitando de medicamentos e tratamentos médicos. Afirma que suas despesas envolvem tratamento dentário, neurologista fisioterapia, fralda, medicamentos, alimentação e combustível. Destaca que o valor que recebe a título de BPC - Benefício de Prestação Continuada é insuficiente para cobrir os gastos que demanda mensalmente, além de ser anterior ao acordo em que o apelado aceitou pagar a quantia de 20% (vinte por cento) de seus rendimentos líquidos. Sustenta que sua genitora não trabalha, porque é ela quem lhe presta os cuidados da vida diária. Pugna, ainda, pela reforma da sentença quanto ao deferimento da justiça gratuita ao apelado. Afirma que o apelando não é hipossuficiente, pois é engenheiro na Gerdau e aufere renda bruta em torno de R$ 12.875,00 (doze mil, oitocentos e setenta e cinco reais), além de ser proprietário de uma chácara avaliada em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e de um imóvel na cidade de Ouro Branco, avaliado em R$ 420.000,00 (quatrocentos e vinte mil reais). Bate-se pelo provimento do recurso para que os pedidos iniciais sejam julgados improcedentes, bem como revogados os benefícios da justiça gratuita então concedidos ao apelado. Sem preparo recursal. Por sua vez, P.F.F. em suas razões recursais (ordem 97), alega, em síntese, que o valor definido na sentença a título de alimentos devidos ao filho, ainda se revela demasiado. Sustenta que se casou novamente, sendo pai de duas filhas e responsável pelo sustento da nova família. Assegura que sua renda é comprometida com outras despesas e dívidas. Alega que a obrigação deve ser reduzida a 8% (oito por cento) de seus rendimentos, sem incidência sobre o 13º salário e férias, pois constituem verbas de natureza indenizatória. Afirma que o apelado aufere auxílio BPC (Benefício de Prestação Continuada) no valor de 1 (um) salário mínimo, não justificando a prestação de alimentos no valor fixado na sentença. Destaca que o apelado é beneficiário do seu plano de saúde, que é co- participativo, sendo que todas as despesas são custeadas fora da pensão que ainda é paga. Afirma que os gastos com transporte do apelado para Belo Horizonte tornam sua obrigação demasiada em prejuízo do sustento próprio e de sua família. Ao final, pugna pelo provimento do recurso para que seja a sentença reformada reduzindo os alimentos para 8% (oito por cento) do salário líquido, sem incidência sobre férias e 13º, bem como para afastar o dever de quitação de despesas de remédios e transporte para Belo Horizonte. Dispensado o preparo, pois litigante sob o amparo da justiça gratuita. Apenas L.F.P.F. apresentou contrarrazões (ordem 100), pelo desprovimento do recurso de apelação de P.F.F. Aberta vista, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer à ordem 102, opinou pelo provimento do primeiro recurso e prejudicado o segundo apelo. É o relatório. Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço das apelações. Sem preliminares ou nulidades cognoscíveis de ofício, passo ao exame do mérito de ambos os recursos, conjuntamente. Posteriormente, passo à análise dos temas não coincidentes de cada apelo. A controvérsia recursal cinge-se na definição do valor dos alimentos devidos por P.F.F. ao filho L.F.P.F., com necessidades especiais. O instituto jurídico dos alimentos, segundo a lição de RODRIGO DA CUNHA PEREIRA "decorre de valores humanitários e dos princípios da solidariedade e dignidade humana, e destina-se àqueles que não podem arcar com a própria subsistência". (in Direito das Famílias / Rodrigo da Cunha Pereira; prefácio Edson Fachin. - 2. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2021. E-book. p. 468). A fonte da obrigação alimentar são os laços de parentesco, sob a perspectiva da solidariedade, assim conforme se extrai da norma do art. 1.694 do Código Civil que assim estabelece: "Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação. Sobre o quantum, o Código Civil, notadamente no § 1º, do artigo 1.694, determina que os alimentos devem ser fixados em atenção ao binômio possibilidade/necessidade. No entanto, conforme lição de Maria Berenice Dias a verba alimentar está atrelada ao trinômio" proporcionalidade, necessidade e possibilidade ": Inexiste distinção de critérios para a fixação do valor da pensão em decorrência da natureza do vínculo obrigacional. Estão regulados de forma conjunta os alimentos decorrentes dos vínculos de consangüinidade e solidariedade, do poder familiar, do casamento e da união estável. Os alimentos devem sempre permitir que o alimentando viva de modo compatível com a sua condição social. De qualquer forma, ainda que seja esse o direito do credor de alimentos, é mister que se atente na quantificação de valores, às possibilidades do devedor de atender ao encargo. Assim, de um lado há alguém com direito a alimentos e, de outro, alguém obrigado a alcançá-los. A regra para a fixação ( CC 1.694 § 1º e 1.695) é vaga e representa apenas um standard jurídico. Dessa forma, abre-se ao juiz um extenso campo de ação, capaz de possibilitar o enquadramento dos mais variados casos individuais. Para definir valores, há que se atentar ao dogma que norteia a obrigação alimentar: o princípio da proporcionalidade. Esse é o vetor para a fixação dos alimentos. (...). Tradicionalmente, invoca-se o binômio necessidade-possibilidade, ou seja, perquirem-se as necessidades do alimentando e as possibilidades do alimentante para estabelecer o valor da pensão. No entanto, essa mensuração é feita para que se respeite a diretriz da proporcionalidade. Por isso se começa a falar com mais propriedade, em trinômio: proporcionalidade-possibilidade-necessidade. O critério mais seguro e equilibrado para a definição do encargo é o da vinculação aos rendimentos do alimentante. (in Manual de direito das famílias. 8. ed.rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 552-553) - (destaque) Nessa perspectiva, a concessão de alimentos deve guardar relação com a capacidade econômica do alimentante e, ao mesmo tempo, atender às necessidades do alimentando, respeitando-se a diretriz da proporcionalidade. Volvendo ao caso dos autos, colhe-se que os alimentos devidos por P.F.F. a L.F.P.F. foram originalmente fixados nos autos da ação n. 062507071153-0 (Ação de Alimentos c/c Regulamentação de Visita Pensão Alimentícia), que tramitou na 3ª Vara Cível da Comarca de São João Del Rei, em 10/10/2007, tendo o autor se comprometido a pagar, à título de pensão alimentícia ao réu, a importância correspondente a 20% (vinte por cento) do seu salário mensal (nominal), incidindo sobre férias e 13º salário, sendo descontado mensalmente em sua folha de pagamento. Além do valor da pensão, o autor assegurou, mediante acordo firmado, manter o réu como beneficiário do plano de saúde, bem como arcar com as despesas com parte dos custos com medicamentos controlados e com o transporte para Belo Horizonte, todas as vezes que o filho necessitar se deslocar para tratamento médico. O alimentante P.F.F. se casou em 15/08/2011 com D.A.S.F. (ordem 07). Em 29/12/2015 nasceu a filha M.S.F. (ordem 09) e em 21/08/2017, nasceu sua outra filha A.L.S.F. (ordem 08). Em 21/06/2017, P.F.F. e sua esposa D.A.S.F. adquiriram um imóvel financiado, aquiescendo com o pagamento de 361 (trezentos e sessenta e uma) parcelas, com a primeira prestação em 15/08/2017 e a última em 15/07/2047, no valor inicial de R$ 3.147,81 (três mil, cento e quarenta e sete reais e oitenta e um centavos). P.F.F. ingressou em juízo contra o filho L.F.P.F. em 21/12/2021 clamando pela redução dos alimentos devidos de 20% (vinte por cento) do seu salário mensal (nominal/bruto), incluindo as férias e 13º salário, para 8% (oito por cento) do salário líquido, sem incidência sobre férias e 13º salário. Também postulou pela exoneração do dever de pagar medicamentos e transporte para Belo Horizonte. O alimentante é engenheiro e empregado na Gerdau e aufere salário mensal bruto de R$ 12.875,00 (doze mil, oitocentos e setenta e cinco reais), em 2021. A pensão alimentícia devida a L.F.P.F. e que é descontada da folha de pagamento é de R$ 2.575,00 (dois mil, quinhentos e setenta e cinco reais). L.F.P.F., nascido em 23/12/2002, apesar de sua maioridade, é portador de"encefalopatia crônica não progressiva do tipo espástica quadriparética grave associada a epilepsia de difícil controle", oriunda de má-formação congênita cerebral (microcefalia), conforme relatório médico (ordem 31). O relatório médico à ordem 75 revela que L.F.P.F. possui deficiência mental grave, sendo completamente dependente para suas funções básicas da vida. Além disso, ele tem epilepsia grave, sempre fez uso de medicações neurológicas para o seu controle, uso de ansiolíticos e necessidade de tratamento constante com ortopedista. A prova dos autos desponta, ainda, que a genitora de L.F.P.F. (C.M.P.) não trabalha, pois dedica-se, exclusivamente, aos cuidados do filho. O conjunto probatório indica que, mesmo com a formação de nova família e o nascimento das filhas, bem como a compra de um imóvel financiado em 2017, P.F.F. continuou pagando os alimentos ao filho L.F.P.F. no patamar fixado em 2007, vindo a pleitear a revisão quatro anos mais tarde, em 2021. Nesse interstício de 2017 a 2021, observa-se, sim, uma certa alteração das possibilidades econômicas do alimentante, mas não tão significativa para pior, ao ponto de autorizar a redução de sua obrigação alimentar no percentual por ele perseguido ou mesmo aquele definido na sentença. Vejamos. Sabe-se que a constituição de nova família e o nascimento de outros filhos não justifica, por si só, a alteração dos alimentos já prestados, devendo ser demonstrada, no caso concreto, a diminuição substancial da capacidade financeira do alimentante, conforme os critérios da necessidade, possibilidade e razoabilidade. Neste sentido: DIREITO CIVIL E FAMÍLIA. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. PENSÃO ALIMENTÍCIA. CONSTITUIÇÃO DE NOVO NÚCLEO FAMILIAR, INCLUSIVE COM O NASCIMENTO DE NOVO FILHO. REDUÇÃO AUTOMÁTICA DO VALOR DOS ALIMENTOS DA PROLE DO RELACIONAMENTO ANTERIOR. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. POSSIBILIDADE DO ALIMENTANTE. PRETENSÃO DE REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO CONHECIDO PARA NÃO SE CONHECER DO RECURSO ESPECIAL. 1. A constituição de nova família ou o nascimento de novos filhos não afasta a necessidade de demonstração da alteração do binômio necessidade do alimentando em face da possibilidade do alimentante para revisão do valor dos alimentos fixado para a prole de relacionamentos anteriores. Precedentes. 2. No caso, o TJDFT concluiu que a condição econômico-financeira do genitor é suficiente para manutenção da pensão alimentícia de seu primeiro filho nos moldes fixados e o custeio das despesas de seu novo filho e núcleo familiar, ambos em padrão similar, de modo que improcedente o pedido de redução do valor dos alimentos. A revisão dessa conclusão implicaria o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que é defeso na via eleita, ante o enunciado da Súmula 7 do STJ. 3. Agravo interno provido para reconsiderar a decisão agravada e, em novo exame, conhecer do agravo para não conhecer do recurso especial. ( AgInt no AREsp n. 1.814.860/DF, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 11/10/2021, DJe de 17/11/2021.) - destaquei. No caso concreto, da análise das declarações do IRPF do alimentante relativamente aos exercícios de 2020 a 2022 (ordem 82), observa-se que ele, apesar de suas alegações de que decaiu seu padrão de vida nos últimos anos, ainda mantém contas investimentos (com reduções gradativas, evidentemente), tendo adquirido patrimônio. Essa questão é atinente à forma como o alimentante gerencia seus recursos financeiros, não podendo as consequências de seus atos recaírem integralmente sobre o alimentando. Por outro lado, observa-se que as outras filhas do alimentante são crianças de 6 (seis) e 8 (oito) anos de idade e suas necessidades são presumidas. À medida que crescem, passam a demandar gastos maiores com educação, alimentação, transporte e vestuário, o que explica o comprometimento da capacidade financeira do alimentante. Nessa perspectiva, importante anotar que é vedado o tratamento discriminatório entre os filhos, assim nos termos do artigo 227, § 6º, da Constituição da Republica, não sendo possível, em princípio, a fixação de alimentos em determinado percentual a favor de um dos filhos, que possa comprometer a subsistência dos demais, pois todos os filhos - indistintamente e independentemente de sua origem - necessitam de alimentos em igual medida. Todavia, a igualdade como princípio, não é limitativa, pois pressupõe que as pessoas colocadas em situações diferentes sejam tratadas de forma desigual. Tendo em mente essa premissa e, voltando ao caso dos autos, embora todos os filhos de P.F.F., sem predileções, devam ser atendidos em suas necessidades vitais, com igual acesso à alimentação, saúde, educação, cultura, lazer, etc., é certo que o filho mais velho, portador de necessidades especiais, pode e deve receber um valor ou percentual diferenciado em relação às demais irmãs nascidas saudáveis, não havendo de se cogitar ofensa ao princípio constitucional da igualdade. Na espécie, o alimentante aufere renda bruta de R$ 12.875,00 (referente ao ano de 2021). Descontando os valores a título de INSS e IRRF, a disponibilidade financeira desaba para R$ 10.702,12. Os descontos da pensão alimentícia a L.F.P.F. recaem sobre o seu rendimento bruto, no percentual de 20% (vinte por cento). Sobre o salário líquido, o mesmo valor equivale a 24% (vinte e quatro por cento). Além disso, o alimentante paga parte das despesas com tratamento médico (plano de saúde), medicamentos e transporte. Sendo assim, como visto alhures, embora a constituição de nova família não abone, por si só, a alteração dos alimentos já oferecidos, é certa a redução da capacidade financeira do alimentante, pois, à luz dos critérios da necessidade, possibilidade e razoabilidade, o encargo atual não está compatível com o seu orçamento, devido às suas atuais despesas e o fato de ter duas filhas que, igualmente demandam despesas inerentes às suas idades. Relevante anotar que a obrigação alimentar é de ambos os pais, restando demonstrado nos autos que a genitora de L.F.P.F. não exerce atividade remunerada e o alimentando aufere Benefício de Prestação Continuada - BPC, no valor de 1 (um) salário mínimo. Somada a prestação alimentar atual e o Benefício de Prestação Continuada - BPC, L.F.P.F. sobrevive com a quantia total de, em média, R$ 4.000,00 (quatro mil reais) mensais. Esse valor é muito superior ao que, em tese, percebem as demais filhas de P.F.F., considerando o contexto familiar atual e a renda per capita do núcleo familiar. Não obstante, não é possível a redução no percentual definido na sentença (de 12%), quiçá aquele pretendido pelo apelante (de 8%) sobre os rendimentos líquidos. Isso porque, 12% (doze por cento) dos rendimentos líquidos do alimentante equivalem a algo em torno de R$ 1.300,00 (mil e trezentos reais) mensais, ou seja, R$ 43,00 (quarenta e três reais) por dia, insuficiente para garantir as necessidades mais básicas de um filho que, embora adulto, é portador de doença grave e que demanda cuidados e despesas extraordinárias. É dizer, dita quantia não supre sequer as refeições diárias (café da manhã, almoço e jantar), nem mesmo os medicamentos e insumos diários (fraldas). Dessa forma, entendo que a pensão alimentícia deva ser reduzida, em atenção ao trinômio" necessidade / capacidade / razoabilidade ", de 20% (vinte por cento) dos rendimentos brutos para 20% (vinte por cento) sobre os rendimentos líquidos do autor / apelante, incluídas as férias e décimo terceiro salário. Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, firmada em sede de recurso repetitivo (Tema Repetitivo 192), restou consolidada no sentido da incidência da pensão alimentícia sobre o décimo terceiro salário e o terço constitucional de férias, porque tais verbas estão compreendidas nas expressões" vencimento "," salários "ou" proventos "que consubstanciam a totalidade dos rendimentos auferidos pelo alimentante ( REsp n.º 1.106.654/RJ, Rel. Ministro PAULO FURTADO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/BA), SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 25/11/2009, DJe 16/12/2009). Registre-se que essa quantia de 20% (vinte por cento) sobre os rendimentos líquidos do autor / apelante atende ao princípio da igualdade entre os filhos, sendo evidente a maior necessidade de L.F.P.F. em razão de sua condição de saúde e, ao mesmo tempo, é compatível com o orçamento do alimentante. Mantenho, ainda, a obrigação do alimentante em arcar com as despesas extraordinárias do filho, tais como medicamentos e transporte, devendo ele se esforçar para atender as necessidades do alimentando quanto a essas despesas, não havendo justificativa nos autos para isentá-lo dessas responsabilidades. Quanto à impugnação à justiça gratuita concedida ao segundo apelante, razão assiste ao primeiro recorrente. O art. 5º, inciso LXXIV da Constituição da Republica de 1988 estabelece que"o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos". Justiça gratuita é a gratuidade de todas as custas e despesas, judiciais ou não, a serem suportadas pelo cidadão para o correto desenvolvimento do processo e que, em Minas Gerais, são reguladas pela Lei 14.939/2003. Também compreende a isenção do pagamento de honorários advocatícios, na forma do artigo 98 e seguintes do CPC. De toda forma, seja para a dispensa do pagamento das custas e despesas (Lei 14.939/2003), seja dos honorários de sucumbência (artigo 98, CPC), há de se demonstrar a insuficiência de recursos pela parte que pleiteia o benefício. A propósito, Daniel Amorim Assumpção Neves, em comentário ao Código e Processo Civil elucida que: "A concessão dos benefícios da gratuidade da justiça depende da insuficiência de recursos da parte para o pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios no caso concreto. Como não há no Novo Código de Processo Civil o conceito de insuficiência de recursos e com a expressa revogação do art. 2º da Lei 1.060/50 pelo art. 1.072, III, do Novo CPC, entendo que a insuficiência de recursos prevista pelo dispositivo ora analisado se associa ao sacrifício para manutenção da própria parte ou de sua família na hipótese de serem exigidos tais adiantamentos"(in Novo código de processo civil comentado - Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 155) - destaquei. Embora o alimentante encontre-se com sua renda comprometida com financiamento imobiliário, sua renda líquida é superior a 4 (quatro) salários mínimos, critério que é utilizado pela Defensoria Pública para prestar assistência judiciária aos que a ela recorrem, considerando a renda mensal familiar, conforme Deliberação n. 025/2015, DPMG, art. 1º, I, verbis: "Art. 1º. Presume-se necessitada, sob o aspecto econômico, toda pessoa natural, nacional ou estrangeira, residente ou não no Brasil, que atenda, cumulativamente, às seguintes condições: I - renda mensal individual não superior ao valor de 3 (três) salários mínimos, ou renda mensal familiar não superior a 4 (quatro) salários mínimos; " Ademais, se o autor possui dívidas, essa questão diz respeito à forma como ele administra seus recursos financeiros, não podendo, em razão de suas escolhas, atribuir as consequências de seus atos ao Estado, deixando de ressarcir as despesas do processo. Dessa forma, revogo os benefícios da justiça gratuita concedidos ao segundo recorrente, devendo ele arcar com as custas do processo. Por fim, indeclinável ressalvar que a prestação de alimentos é essencialmente mutável, como variáveis são as condições daqueles que auferem e daqueles que prestam alimentos. A propósito, é a lição de Rolf Madaleno: "(...) Estes alimentos podem ser revistos a qualquer tempo, se houver modificação na situação financeira das partes, ou seja, sempre quando for verificada mudança de fortuna de quem os recebe ou de parte do alimentante, por se tratar de uma relação jurídica continuativa, conforme inciso I, do artigo 505, do CPC, e nos quais está ínsita a cláusula rebus sic stantibus, no tocante à quantificação originária dos alimentos. Essa regra está estatuída no artigo 1.699 do Código Civil, ao admitir a revisão dos alimentos se sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, repousando a alteração da pensão alimentícia em uma questão de fato, representada pelas oscilações da vida econômica e financeira dos envolvidos, a permitir a majoração dos alimentos se ocorrer um enriquecimento do devedor ou na redução se ele empobrecer por haver arrostado uma diminuição dos seus ganhos."(in Madaleno, Rolf. Direito de Família. - 10. ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2020. E-book. p. 1.758-1.759) Logo, os alimentos são suscetíveis de revisão a qualquer tempo, sempre que calhar a alteração no trinômio necessidade/possibilidade/proporcionalidade. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO para fixar os alimentos em 20% (vinte por cento) sobre os rendimentos líquidos do alimentante, deduzidos os descontos referentes à contribuição do INSS e IRRF, incidindo, ainda, sobre o 13º salário e terço constitucional de férias. NEGO PROVIMENTO AO SEGUNDO RECURSO. Condeno o apelante ao pagamento das custas recursais, bem como dos honorários advocatícios, os quais majoro a R$ 2.800,00 (dois mil e oitocentos), na forma do artigo 85, § 11, CPC. É como voto. DESA. TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO - De acordo com o (a) Relator (a). DES. ALEXANDRE SANTIAGO - De acordo com o (a) Relator (a). SÚMULA:"DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO PRIMEIRO RECURSO E NEGARAM PROVIMENTO AO SEGUNDO APELO"