Data de publicação: 02/04/2024
Tribunal: TJ-MG
Relator: Des.(a) Eveline Mendonça (JD Convocada)
(...) A coparentalidade, nova estrutura ou configuração familiar verificada em período recente, é formalizada por meio de negociações, em que os indivíduos, sem vínculo amoroso, se obrigam e se responsabilizam pelos cuidados e pela educação da criança, desde a concepção - O artigo 1.589 do Código Civil estabelece que o genitor, que não possuir a guarda dos filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE GUARDA C/C REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. COPARENTALIDADE. DISCIPLINA DO DIREITO DE CONVIVÊNCIA PATERNO-FILIAL. AUSÊNCIA DE FATOS QUE DESABONEM A CONDUTA DO AGRAVADO. INTENSA ANIMOSIDADE ENTRE OS GENITORES. REALIZAÇÃO DAS VISITAS EM LOCAL DISTINTO DA RESIDÊNCIA MATERNA. - A coparentalidade, nova estrutura ou configuração familiar verificada em período recente, é formalizada por meio de negociações, em que os indivíduos, sem vínculo amoroso, se obrigam e se responsabilizam pelos cuidados e pela educação da criança, desde a concepção - O artigo 1.589 do Código Civil estabelece que o genitor, que não possuir a guarda dos filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação - Na hipótese dos autos, as provas até então produzidas evidenciam que a realização das visitas do agravado à sua filha menor, em local distinto da residência materna, é a medida mais adequada e razoável, considerando a intensa animosidade entre os genitores da criança.
(TJ-MG - AI: 20540668720228130000, Relator: Des.(a) Eveline Mendonça (JD Convocada), Data de Julgamento: 17/11/2022, 4ª Câmara Cível Especializada, Data de Publicação: 18/11/2022)
Inteiro Teor
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE GUARDA C/C REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. COPARENTALIDADE. DISCIPLINA DO DIREITO DE CONVIVÊNCIA PATERNO-FILIAL. AUSÊNCIA DE FATOS QUE DESABONEM A CONDUTA DO AGRAVADO. INTENSA ANIMOSIDADE ENTRE OS GENITORES. REALIZAÇÃO DAS VISITAS EM LOCAL DISTINTO DA RESIDÊNCIA MATERNA.
- A coparentalidade, nova estrutura ou configuração familiar verificada em período recente, é formalizada por meio de negociações, em que os indivíduos, sem vínculo amoroso, se obrigam e se responsabilizam pelos cuidados e pela educação da criança, desde a concepção.
- O artigo 1.589 do Código Civil estabelece que o genitor, que não possuir a guarda dos filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.
- Na hipótese dos autos, as provas até então produzidas evidenciam que a realização das visitas do agravado à sua filha menor, em local distinto da residência materna, é a medida mais adequada e razoável, considerando a intensa animosidade entre os genitores da criança.
AGRAVO DE INSTRUMENTO-CV Nº 1.0000.21.247006-6/004 - COMARCA DE PIRANGA - AGRAVANTE (S): A.L.M.T., L.R.M. REPRESENTADO (A)(S) P/ MÃE A.L.M.T. - AGRAVADO (A)(S): E.R.S.
A C Ó R D Ã O
(SEGREDO DE JUSTIÇA)
Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª Câmara Cível Especializada do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
JD. CONVOCADA EVELINE FELIX
RELATORA
JD. CONVOCADA EVELINE FELIX (RELATORA)
V O T O
Cuida-se de agravo de instrumento interposto por A. L. M. T. e L. R. M., representada pela mãe A. L. M. T., nos autos da ação de regulamentação de guarda e convivência c/c alimentos ajuizada em face de E. R. S., contra decisão da i. Juíza da Vara Única da Comarca de Piranga, Dra. Maria Tereza Horbatiuk Hypolito, exarada, no pertinente, nos seguintes termos:
(...)
Primeiramente, deve-se considerar que a menor conta agora com quase 09 meses de idade, e conforme o relatório médico juntado pela própria autora (id. 9531640818) em maio de 2022 foi iniciada a introdução alimentar, sendo certo que, apesar de ainda se alimentar com leite materno, esta não é a forma de alimentação exclusiva da criança.
Assim, a forma do exercício do direito de convivência com a figura paterna deve ser reanalisada levando em
conta toda a peculiaridade que envolve o caso, e principalmente o melhor interesse da menor, que tem direito de conviver com o genitor.
Certo é que a relação entre os genitores não se mostra nem minimamente harmoniosa, inclusive havendo, de um lado, pedido de medida protetiva de urgência formulado pela genitora, e de outro, representação criminal do genitor contra a autora, apesar de sabedores da obrigação dos pais de deixarem de lado as questões pessoais para priorizar o bem-estar da menor, observo que o conflito tem dificultado, e até mesmo impedido, o contato de L. com seu genitor.
É importante considerar qual o melhor cenário para garantir à criança seus direitos fundamentais. Deve haver equilíbrio entre a evidente necessidade de, pela tenra idade, permanecer residindo e sendo alimentada no lar materno, e a convivência saudável com o pai.
Cabe decidir pela manutenção das visitas da forma atual (que, na prática, não está sendo exercida), ou por sua alteração, possibilitando que as visitas efetivamente ocorram, sem prejudicar o desenvolvimento da menor.
Sobre isso, em que pese o genitor não ter impedimento formal de comparecer à casa da genitora de sua filha (as medidas protetivas foram indeferidas em primeiro grau de jurisdição), o enorme conflito entre os genitores certamente criará ambiente tenso, desfavorável, e até mesmo de potencial risco, durante as visitas. É mais que evidente que a presença de ambas as partes no mesmo recinto não será boa para nenhum deles, muito menos para uma criança pequena.
Entendo ser inviável, portanto, determinar que as visitas sejam feitas nestas condições diante do cenário atual das relações entre as partes. A manutenção da forma acabará, ao fim e ao cabo, privando totalmente a criança do convívio com seu pai.
Analisando os requisitos da tutela de urgência, a probabilidade do direito se encontra no fato de que a relação de parentesco entre o requerido e a menor está devidamente comprovada nos autos, o que significa dizer que o direito de convivência pode, e deve, ser exercido, independente até mesmo de decisão judicial. Ademais, a urgência é inerente ao e deve pedido, visto que o direito de convivência significa criação de vínculo, amor e carinho entre pai e filha, participação na vida e desenvolvimento da criança, laços que com o passar do tempo não serão recuperados.
Ressalto que também não há nos autos nenhuma informação de conduta desabonadora do requerido a justificar que o direito de convivência seja exercido somente na residência da requerida. As críticas feitas pela autora, ainda que se tomem como verdadeiras, dizem respeito somente à turbulenta relação entre os adultos, nada denotando que o genitor represente qualquer perigo à menor.
É certo que em ações dessa natureza as decisões devem primar pelo melhor interesse da criança, e, no presente caso, e neste momento, entendo que o exercício do direito de visitas somente na residência da genitora não atende ao melhor interesse de L., pelo que defiro o pedido de tutela de urgência antecipada formulado pela parte requerida, para regulamentar a convivência da seguinte forma:
- Quinzenalmente, aos finais de semana (sábado e domingo), fora do lar materno, devendo o requerido buscar a menor às 10:00 horas e retornar com ela às 16:00 horas, do mesmo dia (sábado), repetindo o horário no dia seguinte (domingo), iniciando-se no dia 03/09/2022.
Acolhendo o parecer ministerial, determino que a visita seja acompanhada por um conselheiro tutelar do município, que deverá emitir relatório ao final de cada final de semana que haja visita. Esclareço que não se trata de visita monitorada, mas apenas uma forma de averiguar a efetividade da visita da forma aqui estipulada e a interação da menor com o genitor. O relatório deve ser juntado aos autos no prazo de 05 (cinco) dias, após cada visita.
Quanto à faculdade de comparecimento quinzenal, tem-se que o não exercício do direito/dever do genitor pode causar consequências que não estão sendo tratadas neste feito (v.g. abandono material), no entanto, considerando que o genitor reside em outro estado (fato que ambos tinham ciência no momento da concepção da criança), determino que em caso de impossibilidade do requerido comparecer nos dias pactuados, a autora/genitora deve ser informada com antecedência mínima de 03 (três) dias.
Ressalto que o fixado retro, especialmente a duração da visita, deve sempre respeitar o bem-estar da criança, devendo o genitor observar as necessidades fáticas da criança nos momentos de convivência.
Por fim, considerando que o pedido de tutela de urgência se refere apenas às visitas ordinárias, pelo que o restante já pareciado deve ser mantido da forma estipulada pelo e. TJMG. ("Sic", doc. de ordem 15, f. 2/3.)
No arrazoado de doc. de ordem 1, alegam as agravante que a convivência da menor com o pai, ora agravado, deve continuar na residência materna, haja vista sua tenra idade, bem como por se encontrar em fase de aleitamento, mesmo tendo ele, desde o início da gestação da filha, demonstrado "atitudes controladoras, agressivas e abusivas, além de sempre ter demonstrado indiferença quanto à amamentação" (f. 5).
Sustentam que a amamentação não está atrelada tão somente ao fator nutritivo, mas, também, à segurança, apego e vínculo afetivo entre mãe e filha, podendo o afastamento causar danos emocionais a menor; que, malgrado o direito de a menor conviver com os pais, sobrepõe-se o seu melhor interesse, qual seja, de ser amamentada no seio materno a cada 02 (duas) horas, situação que deve ser mantida, como indicado pelo médico pediatra que a atende desde o nascimento, "até que a criança manifeste vontade de interrompê-lo" (f. 6), sob pena de se constituir grave violação aos seus direitos fundamentais.
Aduzem, ainda, que cada criança possui seu próprio tempo de amamentação, não sendo recomendável a ruptura desse processo individual apenas para satisfação pessoal de seus genitores, mas sim ser respeitado seu próprio desenvolvimento alimentar.
Também alegam que:
Como já noticiado nos autos, a criança tem atualmente 10 (dez) meses de idade, e o agravado a visitou por apenas 3 (três) vezes na vida (nas datas de 30/10/21, 13/02/22 e 27/03/22), mesmo não tendo qualquer impedimento formal de comparecer à casa da agravante, eis que as medidas protetivas foram indeferidas em primeiro grau de jurisdição, conforme constou, inclusive, em r. decisão.
(...), o direito ao regime de convivência não é somente um direito dos pais, mas um direito dos filhos de conviver com os seus pais, razão pela qual a visita aos filhos é para os pais um misto de direito e de obrigação. Trata-se de um direito-dever.
Argumentam que, em virtude da negligência e ausência paterna, a menor não o reconhece como pai, tampouco entende qual a figura do agravado em sua vida, bem como o estranhou e chorou muito nas poucas vezes em que ele foi visitá-la, fatos que tornam indispensável um período de adaptação para ser a menor retirada do lar materno, bem como que sejam "implantados limites ao regime de convivência paterna até que a filha tenha idade suficiente para entender e se adequar a mudança de rotina e o afastamento da mãe".
Assim, requerem a suspensão da decisão agravada e a antecipação da tutela recursal, para os fins de se manter o regime de convivência do agravado com a filha como anteriormente fixado por este eg. Tribunal de Justiça, acrescido de acompanhamento de profissional competente do CRAS - Centro de Referencia de Assistência Social, em razão da "intensa animosidade entre os genitores". Ao final, pediram que os efeitos da decisão antecipatória de tutela fossem confirmados.
Pela decisão de ordem nº 227, foram indeferidos os pedidos de efeito suspensivo e de antecipação da tutela recursal.
As agravantes peticionaram à ordem nº 228, com os documentos de ordens nº 229 e 230.
Regularmente intimado, o agravado apresentou a contraminuta de ordem nº 231, acompanhada dos documentos de ordens nº 232 e 233.
Intervindo no feito, a ilustre Procuradora de Justiça, Dra. Luíza Carelos, emitiu o parecer de ordem nº 235, opinando pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
Conheço do recurso de agravo de instrumento, porquanto presentes os seus pressupostos de admissibilidade.
Insurgiram-se as agravantes contra a decisão interlocutória reproduzida pelo documento de ordem nº 15, que modificou o regime de convivência paterno-filial que havia sido regulamentado, provisoriamente, por esta Instância Revisora, nos autos do Agravo de Instrumento nº 1.0000.21.247006-6/003.
Ponderaram as agravantes, em suma, que a menor ainda estaria em fase de amamentação, o que recomendaria que a convivência paterno-filial ocorresse na residência da genitora; que a menor não reconheceria a figura paterna, justificando-se a ampliação do regime de convivência de forma gradual, à luz do melhor interesse da criança.
Pois bem. Conforme já registrado quando da apreciação do pedido liminar formulado no Agravo de Instrumento nº 1.0000.21.247006-6/003, o presente caso envolve nova estrutura familiar, baseada na coparentalidade, que é formalizada por meio de negociações, em que os indivíduos, sem vínculo amoroso, se obrigam e se responsabilizam pelos cuidados e pela educação da criança.
Sobre o tema, a lição do doutrinador Dimas Messias de Carvalho:
"A coparentalidade é um novo modelo de família que surgiu sem existência de conjugalidade entre os genitores, mas unindo o desejo de ambos de serem pais e assumirem em conjunto o dever de criar, cuidar
e educar um filho.
Os pais não buscam um relacionamento afetivo ou relações sexuais, mas o interesse em constituir a parceria para concretizar o desejo de ser pai e mãe.
(...)
A coparentalidade, portanto, não está atrelada ao envolvimento amoroso ou a relações sexuais dos pais, podendo até ocorrer um afeto fraternal entre os envolvidos, mas ao desejo de maternidade/paternidade biológica. Pode até ocorrer relações sexuais com o objetivo de gerar o filho, mas normalmente adota-se a reprodução assistida homóloga, existindo sites na internet que facilitam a aproximação de pessoas com esse objetivo". (in Direito das Famílias, 8ª edição, p. 82. Editora SaraivaJur - 2.020)
Dito isso, verifica-se, pelos documentos que instruíram este recurso, que as partes, em 08 de setembro de 2.020, firmaram dois contratos: o primeiro, que disciplinou a forma da geração da filha (reprodução assistida homóloga), divisão de gastos com os procedimentos médicos para a fertilização, durante a gestação e referentes ao parto; o segundo, que estabeleceu regras para a criação dos filhos advindos da coparentalidade.
Realizada a inseminação artificial intrauterina - e obtido o esperado sucesso, nasceu a filha das partes, L. R. M., em 20 de outubro de 2.021.
Nesse contexto, instituíram as partes, quando da celebração do segundo contrato, que a guarda da menor seria compartilhada, com domicílio na residência materna. Registrou-se, ainda, que "os genitores sempre buscarão a melhor forma de convívio para o bem estar da criança, seja físico, intelectual ou psicológico", o que, no entanto, não parece estar ocorrendo nos dias de hoje.
Pois bem. O artigo 227 da Constituição de 1.988 estabelece ser da família, da sociedade e do Estado o dever de assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à alimentação, à educação, à dignidade, ao respeito, à liberdade e, também, à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Em idêntico sentido, o Estatuto da Criança e do Adolescente disciplinou, em seus arts. 3º, caput e 4º, caput:
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
A partir da referida Carta Constitucional, adotou-se, no ordenamento jurídico pátrio, o Sistema da Integral Proteção à Criança e ao Adolescente, que, nos dizeres dos doutrinadores Luciano Alves Rossato, Paulo Eduardo Lépore e Rogério Sanches Cunha:
"O art. 1º do Estatuto adota expressamente a doutrina da proteção integral. Essa opção do legislador fundou-se na intepretação sistemática dos dispositivos constitucionais que elevaram ao nível máximo de validade e eficácia as normas referentes às crianças e aos adolescentes, e que, por sua vez, foram inspirados nas normas internacionais de direitos humanos, tais como a Declaração Universal de Direitos Humanos, a Declaração Universal dos Direitos da Criança e a Convenção sobre os Direitos da Criança. Assim, pode-se apontar que o reconhecimento jurídico dos direitos da criança e do adolescente se deu no Brasil já em um novo patamar, ligado aos processos emancipatórios e constituído por uma concepção de positivação dos direitos humanos, tornando-os fundamentais. (...).
(...) como se demonstrou, a proteção integral vai muito além de ser mera adaptação legislativa, para ser, em essência, 'um critério assecuratório entre o discurso protetivo presente dos valores humanos e as atitudes atuais dos construtores sociais'. Não implica a proteção integral mera proteção a todo custo, mas sim na consideração de serem a criança e o adolescente sujeitos de direito, devendo as políticas públicas contemplar essa situação, proporcionando o reequilíbrio existente pela condição de serem pessoas em desenvolvimento, o que deverá ser levado em consideração na interpretação do Estatuto.
Importante destacar que a proteção integral assegura um mínimo às crianças e aos adolescentes sem o qual eles não poderiam sobreviver, garantindo-lhes os mesmos direitos fundamentais dos adultos, e um plus, conforme, aliás, encontra-se previsto no art. 3º do Estatuto". (in Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado, 12ª edição, p. 63 e 66/67. Editora Saraiva - 2.021)
O Código Civil, por sua vez, ao disciplinar o direito à convivência familiar, especialmente em relação ao direito de visitação, estabeleceu, em seu artigo 1.589, que o (a) genitor (a), que não possuir a guarda do (s) filho (s), poderá visitá-lo (s) e tê-lo (s) em sua companhia, segundo o que acordar com o outro responsável, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.
Além disso, o direito de visitar e de conviver com os genitores é também titularizado pelos filhos menores, aos quais assiste a prerrogativa de exigirem a regulamentação do regime de visitas, quando existente o interesse recíproco de convivência.
Sob esse aspecto, verifica-se que, anteriormente à distribuição deste recurso, aportou nesta Instância Revisora o agravo de instrumento nº 1.0000.21.247006-6/003, também interposto pelas agravantes em desfavor do agravado, por meio do qual se pretendia a concessão da guarda unilateral da menor à genitora e a regulamentação do regime de convivência paterno-filial.
Em decisão inicial, o pedido de tutela de urgência foi parcialmente deferido pela eminente Desembargadora Ana Paula Caixeta, que estabeleceu a guarda compartilhada da menor, com residência materna e disciplinou, provisoriamente, o direito de visitas do agravado, da seguinte forma:
"I) O agravado visitará a sua filha em finais de semana alternados, na residência materna, no período de 13 horas às 17 horas (aos sábados e aos domingos), exceto se coincidir com o Dia das Mães ou o aniversário da agravante;
II) No Dia dos Pais e no aniversário do genitor, o agravado visitará a sua filha, na residência materna, no período de 13 horas às 17 horas;
III) No aniversário da menor, o pai visitará a sua filha, na residência materna, no período de 13 horas às 17 horas, estando autorizada a sua participação em eventual festividade realizada para a comemoração da data".
Posteriormente, o Juízo de Origem, instado a se manifestar, uma vez mais, sobre o direito de convivência paterno-filial, em razão de fato novo noticiado pelo agravado, proferiu a decisão contra a qual se voltaram as agravantes.
Nesse contexto, as provas até então produzidas evidenciam que o relacionamento da primeira agravante e do agravado é permeado por intensa animosidade, o que foi, inclusive, registrado pela decisão interlocutória ora combatida, tendo a primeira agravante requerido a concessão de medida protetiva contra o agravado e o agravado representado criminalmente contra a agravante.
Por esse motivo, afigura-se aparentemente inviável a realização das visitas pelo agravado à sua filha menor na residência materna, fato este que poderia agravar, ainda mais, a já fragilizada relação da primeira agravante com o agravado.
Não se desconhece que a menor esteja em fase de amamentação; contudo, de acordo com o relatório emitido pelo Dr. J. B. R., na data de 20 de maio de 2.022, foi iniciada a introdução de alimentação sólida (frutas e legumes) à criança.
Ainda que a amamentação ocorra a cada 02 (duas) horas, como também destacado no referido documento médico, existem instrumentos que permitem à agravante, se assim o quiser, a extração do leite materno e o seu adequado acondicionamento, disponibilizando-o ao agravado, para que possa alimentar a segunda agravante quando esta o desejar.
Do mesmo modo que é importante o fortalecimento dos laços afetivos entre as agravantes, também é essencial que o relacionamento do agravado com a sua filha menor seja construído em bases sólidas, sendo mais prudente e recomendável, para tanto, que se inicie desde já, a fim de que a segunda agravante possa ir reconhecendo, no agravado, a figura paterna e com ele crie vínculos de confiança.
Além do mais, o agravado realizou a primeira visita à sua filha menor em local distinto da residência materna, tendo sido relatado, pelos conselheiros tutelares que o acompanharam, que o dia transcorreu de forma tranquila. Ainda que, no dia seguinte, tivesse o agravado levado sua filha para localidade diversa daquela na qual se localiza a residência materna, não foi registrado, pelos conselheiros, conduta adotada pelo agravado que pudesse ter colocado em risco a segurança da criança (documento de ordem nº 228).
Acresça-se que, pelas fotos e pelos vídeos que acompanharam a contraminuta, não se percebeu anormalidade ou intercorrência que justificasse a restrição da convivência paterno-filial ou o retorno do regime anteriormente estabelecido.
Destaque-se, nesta passagem, que a douta juíza, em 29 de setembro de 2.022, proferiu nova decisão, que, embora não tenha alterado substancialmente a decisão ora combatida, analisou alguns pontos que foram salientados pelas partes, durante a realização da primeira visita (documento de ordem nº 233). Observe-se:
"No que se refere ao desenrolar da visita e à questão da amamentação, já tão discutida neste e no segundo grau de jurisdição, conforme já elencado na decisão de saneamento, e reforçado pela eminente Desembargadora que julgou o recurso interposto pela parte autora (decisão id. 9646026287), a menor não mais está em aleitamento materno exclusivo, fato confirmado no relatório médico juntado pela autora, assim, sendo impossível que a menor tenha sido prejudicada por ter passado seis horas sem aleitamento no dia das visitas.
Sobre este ponto, os vídeos apresentados pelo requerido reforçam esse entendimento, pois demonstram que a menor se alimentou e tomou água durante o passeio com o pai. Ora, as visitas já foram fixadas em frequência baixa, são esporádicas, e parece-me absolutamente razoável que, em uma ou duas tardes por mês, a criança que já está em fase de introdução alimentar, possa deixar de ser amamentada.
Todavia, e seguindo a orientação da decisão do e. TJMG no agravo de instrumento, caso a genitora insista na necessidade da filha, e considerando que apenas ela pode amamentar, fica facultado à autora (pois não pode, igualmente, ser obrigada a tal) que retire o leite materno possibilitando que a menor possa ser amamentada na próxima visita, caso seja necessário.
Caso a genitora se negue a retirar o leite materno, o que está dentro de sua liberalidade, por se tratar do seu corpo, não vislumbro prejuízo físico para que L. seja alimentada de forma diversa durante as horas de visitas.
Em relação às questões postas pelo Conselho Tutelar durante o trajeto até Piranga, entendo plausível a justificativa do requerido, de que não conhece as estradas e que se valeu do GPS. Ademais, o relatório não deu nenhuma informação de que a menor foi colocada em perigo durante o percurso.
Diante destas conclusões tenho que não é mais necessário o acompanhamento do Conselho Tutela durante as visitas, vez que já dito que não se tratava de visita assistida, mas apenas de acompanhamento para 'averiguar a efetividade da visita da forma aqui estipulada e a interação da menor com o genitor'. (id. 9580230336) o que já foi suprido.
Não obstante, o Conselho deve acompanhar a retirada e entrega da menor L., nos dias das visitas, para que se evitem conflitos desnecessários dos genitores na presença da menor, ficando dispensado de enviar novos relatórios, salvo nos caso de ocorrência de fatos cuja informação seja de competência dos conselheiros.
Advirto o requerido de que deverá respeitar o comando judicial, comunicando aos conselheiros os horários de retirada e entrega da criança.
Por fim, quanto à realização das visitas fora da cidade de Senhora de Oliveira, embora o genitor tenha direito de exercer a convivência no local que entender melhor, no presente caso, a pequena L. conta com apenas 11 meses, e grandes deslocamentos podem causar-lhe desgaste desnecessário. Sendo assim, por ora, fica autorizado que o genitor realize as visita respeitando os limites da comarca de Piranga.
Aproveito-me, ainda, da ocasião para advertir a autora quanto à verificação de eventual hipótese de alienação parental. Caracterizada a prática da interferência de um dos genitores de forma indevida em desfavor do outro, no âmbito da formação psíquica da criança, o genitor alienador poderá ser penalizado com a inversão da guarda do menor, nos termos do art. 6º, inc. V, da Lei nº 12.318/10".
Nota-se que a nova decisão apenas pontuou que não mais seria necessário o acompanhamento do Conselho Tutelar às visitas realizadas pelo agravado e, ainda, delimitou o âmbito territorial no qual a convivência paterno-filial deveria ser exercida.
Por fim, é imprescindível que os genitores da menor L. sejam razoáveis e maduros, como o foram em época anterior, em que resolveram unir os seus esforços para a geração de sua filha, através da coparentalidade, deixando de lado as rusgas, os aborrecimentos e os dissabores e voltando o seu olhar para o melhor interesse da criança.
Como já afirmado e reafirmado em tantas oportunidades, é preciso que as partes se conscientizem de seus deveres de pais e responsáveis pela criação e pelo desenvolvimento físico, mental e emocional de sua filha, resguardando-a de situações de embates e conflitos, principalmente quando tais situações se originam de mágoas pessoais.
É recomendável que as partes cheguem a um consenso, a um mínimo diálogo racional e razoável, para que os interesses e os direitos de sua filha menor sejam protegidos, propiciando uma convivência familiar tranquila e estável.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento.
Custas pelas agravantes, observado o disposto no art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil.
DES. PEDRO ALEIXO - De acordo com o (a) Relator (a).
DES. KILDARE CARVALHO - De acordo com o (a) Relator (a).
SÚMULA: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO"