#1 - Ação de alimentos avoengos. Neta menor. Necessidades presumidas. Parcas condições financeiras do genitor. Demonstração. Ausência

Data de publicação: 13/02/2024

Tribunal: TJ-MG

Relator: Ivone Campos Guilarducci Cerqueira

Chamada

(...)"Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por E.P. em face da r. decisão proferida pela MM. Juíza da 2ª Unidade Jurisdicional Civil da Comarca de Vespasiano/MG (ordem 63) que, nos autos da Ação de Alimentos Avoengos c/c Tutela Antecipada que lhe move G.D.S.P., representada pela genitora V.M.D.S., fixou alimentos provisórios no percentual de 40% (quarenta por cento) do salário mínimo para o avô paterno em favor da menor, nos seguintes termos:"Sendo assim, concedo parcialmente a tutela provisória de urgência antecipada, em caráter incidental,(CPC, art. 294 e 300) e, ao fazê-lo, arbitro os alimentos provisórios devidos pela parte requerida em favor da filha menor no valor correspondente a 40% do salário mínimo, o fazendo com base apenas nas informações constantes na peça de ingresso e nos documentos que a instruem, ressalvando a possibilidade de revisão nestes próprios autos para majoração ou redução, caso não haja acordo e apresentem as partes dados mais concretos quanto a possibilidade da alimentante e a necessidades dos alimentados, de modo a adequar a tutela provisória aos requisitos da razoabilidade e da proporcionalidade."(...)

Ementa na Íntegra

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - DIREITO DE FAMÍLIA - AÇÃO DE ALIMENTOS AVOENGOS - NETA MENOR - NECESSIDADES PRESUMIDAS - PARCAS CONDIÇÕES FINANCEIRAS DO GENITOR - DEMONSTRAÇÃO - AUSÊNCIA - DECISÃO REFORMADA - RECURSO PROVIDO.
- O direito aos alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, sendo exigível àqueles de grau mais próximo de parentesco, uns na falta de outros, ex vi do art. 1.696 do Código Civil.

- Os alimentos avoengos possuem caráter suplementar e complementar, devendo ser fixados tão somente nos casos em que restar devidamente comprovada a impossibilidade de ambos os genitores em prover os alimentos.

- Inexistindo elementos a evidenciar a insuficiência de recursos econômicos do genitor da infante, a pretensão do avô paterno deve ser acolhida para exonerá-lo dos alimentos provisórios fixados pelo juízo de origem.  (TJMG -  Agravo de Instrumento-Cv  1.0000.23.205977-4/001, Relator(a): Des.(a) Ivone Campos Guilarducci Cerqueira (JD Convocado) , Câmara Justiça 4.0 - Especiali, julgamento em 07/02/2024, publicação da súmula em 08/02/2024)

Jurisprudência na Íntegra

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - DIREITO DE FAMÍLIA - AÇÃO DE ALIMENTOS AVOENGOS - NETA MENOR - NECESSIDADES PRESUMIDAS - PARCAS CONDIÇÕES FINANCEIRAS DO GENITOR - DEMONSTRAÇÃO - AUSÊNCIA - DECISÃO REFORMADA - RECURSO PROVIDO.

- O direito aos alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, sendo exigível àqueles de grau mais próximo de parentesco, uns na falta de outros, ex vi do art. 1.696 do Código Civil.

- Os alimentos avoengos possuem caráter suplementar e complementar, devendo ser fixados tão somente nos casos em que restar devidamente comprovada a impossibilidade de ambos os genitores em prover os alimentos.

- Inexistindo elementos a evidenciar a insuficiência de recursos econômicos do genitor da infante, a pretensão do avô paterno deve ser acolhida para exonerá-lo dos alimentos provisórios fixados pelo juízo de origem.

AGRAVO DE INSTRUMENTO-CV Nº 1.0000.23.205977-4/001 - COMARCA DE VESPASIANO - AGRAVANTE(S): E.P. - AGRAVADO(A)(S): G.S.P. ASSISTIDO(A) P/ MÃE V.M.S., V.M.S.

A C Ó R D Ã O

(SEGREDO DE JUSTIÇA)

Vistos etc., acorda, em Turma, a Câmara Justiça 4.0 - Especializada Cível-8 do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

JD. CONVOCADA IVONE CAMPOS GUILARDUCCI CERQUEIRA

RELATORA





JD. CONVOCADA IVONE CAMPOS GUILARDUCCI CERQUEIRA (RELATORA)



V O T O

Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por E.P. em face da r. decisão proferida pela MM. Juíza da 2ª Unidade Jurisdicional Civil da Comarca de Vespasiano/MG (ordem 63) que, nos autos da Ação de Alimentos Avoengos c/c Tutela Antecipada que lhe move G.D.S.P., representada pela genitora V.M.D.S., fixou alimentos provisórios no percentual de 40% (quarenta por cento) do salário mínimo para o avô paterno em favor da menor, nos seguintes termos:

"Sendo assim, concedo parcialmente a tutela provisória de urgência antecipada, em caráter incidental,(CPC, art. 294 e 300) e, ao fazê-lo, arbitro os alimentos provisórios devidos pela parte requerida em favor da filha menor no valor correspondente a 40% do salário mínimo, o fazendo com base apenas nas informações constantes na peça de ingresso e nos documentos que a instruem, ressalvando a possibilidade de revisão nestes próprios autos para majoração ou redução, caso não haja acordo e apresentem as partes dados mais concretos quanto a possibilidade da alimentante e a necessidades dos alimentados, de modo a adequar a tutela provisória aos requisitos da razoabilidade e da proporcionalidade."

Irresignado, o agravante informa que, apesar de ser advogado autônomo, se encontra em situação financeira precária, acumulando dívida de mais de R$5.000,00 (cinco mil reais) por falta de pagamento das anuidades da OAB/MG.

Salienta possuir despesas relacionadas à sua saúde, por ser portador de cardiopatia com diagnóstico de hipertensão, além de ter responsabilidades financeiras com outras duas filhas: uma de 10 anos e outra de 25 anos, que está atualmente cursando faculdade.

Destaca que a mãe da agravada, V.M.D.S., é bacharel em Direito e possui especialização em Direito Penal, o que denota sua capacidade financeira para arcar com as despesas da criança.

Ressalta, ainda, a ausência de gastos habitacionais por parte da genitora, uma vez que ela reside na residência própria de seus pais.

Alega a possibilidade do genitor da menor em arcar com as necessidades da filha, por ser terapeuta em clínica de recuperação de dependentes químicos e atuar como motorista de aplicativo para complementar a renda.

Requer, por tais motivos, a concessão do efeito suspensivo à r. decisão que fixou alimentos avoengos provisórios no valor de 40% (quarenta por cento) do salário mínimo em seu desfavor. Ao final, pugna pelo provimento do recurso, bem como pela gratuidade judiciária.

Em decisão inicial, à ordem 113, foi deferido o pedido de efeito suspensivo.

Contraminuta colacionada aos autos, à ordem 116, pugnando a agravada pela manutenção da decisão proferida, tendo em vista o inadimplemento do genitor em arcar com as obrigações alimentícias e a incapacidade da genitora de prover sozinha todas as necessidades da filha menor.

Nesta instância, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, de lavra do ilustre Procurador de Justiça, Dr. Márcio Heli de Andrade, opinou pelo desprovimento do recurso (ordem 117), nos seguintes termos:



"(...) Portanto, é inequívoco nos autos que Sr. E.P.J., mesmo ante as execuções manejadas em seu desfavor, inclusive, sob rito prisional, não tem cumprido com o ônus que lhe impõe a paternidade responsável, situação essa acompanhada pelo agravante.

Nesse contexto, considerando o nítido descaso do genitor da agravada, bem como a idade da alimentada, que possui necessidades presumidas, levando em conta o fato de que, com o passar dos anos as despesas tendem a majorar em razão do normal desenvolvimento do indivíduo, vislumbra-se a necessidade de, com fulcro na solidariedade familiar, recorrer ao auxílio do agravante, vez que se vislumbra a possibilidade de o avô contribuir com o sustento da neta. Ainda, não se pode olvidar que cabível alimentos avoengos tanto em caráter subsidiário quanto complementar, vislumbrando-se pelas provas acostadas aos autos, até o momento processual, que a genitora da menor não possuí capacidade de sozinha atender às necessidades da filha.

Salienta-se que, conforme apontado pela autora, os avós maternos já contribuem, conforme suas possibilidades, com o sustento da neta, tendo sido apontado que, inclusive, reside na casa da avó materna.

Por derradeiro, ressalta-se que o valor provisoriamente fixado não se demonstra exacerbado e desproporcional. Destarte, tendo em vista o princípio constitucional da prioridade absoluta dos interesses da criança e do adolescente, impõe-se a manutenção da decisão proferida pelo juízo primevo.

Ante o exposto e considerando ainda tudo o que mais dos autos consta, manifesta-se essa Procuradoria de Justiça pelo CONHECIMENTO e DESPROVIMENTO do agravo, mantendo-se incólume a decisão vergastada".



Após, vieram-me conclusos os autos.



É o relatório, no essencial.



Conheço do recurso, pois presentes, na espécie, os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade previstos no Código de Processo Civil, dispensado o preparo recursal, ante a gratuidade judiciária deferida à ordem 113.

Sem preliminares, passo, desde logo, à questão meritória.







MÉRITO



Cinge-se a controvérsia recursal em aferir o acerto da decisão que fixou alimentos provisórios em face do agravante, avô paterno de G.D.S.P., no percentual de 40% (quarenta por cento) do salário mínimo.

Pois bem.

Cediço que a fixação da verba alimentar revela um encargo essencialmente vinculado ao Princípio da Dignidade Humana, devendo atender ao trinômio necessidade /possibilidade /proporcionalidade, na busca do necessário equilíbrio entre as necessidades do alimentando e as possibilidades do alimentante, a teor do disposto no art. 1.694, §1º, do Código Civil.

Vejamos:

"Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.

§ 1º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada."



Diante do contexto normativo, os alimentos devem ser arbitrados em valor que observe a proporcionalidade entre as necessidades de quem vai recebê-los e a capacidade financeira de quem vai prestá-los.

Portanto, referido instituto resulta de obrigação legalmente imposta, tendo como pressuposto o dever de sustento, de modo que a parte alimentanda possa ter um mínimo existência, visando manter sua dignidade. Compreendem, basicamente, as despesas com vestimenta, habitação, educação, lazer, alimentação e assistência à saúde.

Assim, para a fixação da pensão alimentícia urge confrontar as necessidades de quem reclama o sustento e as possibilidades de quem irá arcar com a obrigação, circunstâncias a serem sopesadas no confronto fático dos autos.

Quanto à possibilidade dos alimentos avoengos, ressalta-se que referido dever aos netos encontra fundamento legal no art. 1.696 e 1.698 do Código Civil de 2002.

Observa-se:

Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.

"Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide."

Com efeito, a obrigação alimentar, primeiramente, é dos pais e, na ausência de condições de um ou ambos os genitores, transmite-se o encargo aos ascendentes, isto é, aos avós, parentes em grau imediato mais próximo.

Inclusive, este também é o entendimento do Supremo Tribunal de Justiça na Súmula 576:

"Súmula 596: A obrigação alimentar dos avós tem natureza complementar e subsidiária, somente se configurando no caso de impossibilidade total ou parcial de seu cumprimento pelos pais."

No mesmo sentido, colaciono o seguinte entendimento jurisprudencial do Eg. Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE ALIMENTOS - FIXAÇÃO - ALIMENTOS AVOENGOS - OBRIGAÇÃO EXCEPCIONAL E SUBSIDIÁRIA - POSSIBILIDADE - INADIMPLÊNCIA RENITENTE DO GENITOR

Os alimentos serão devidos pelos avós quando demonstrada a falta dos pais ou sua impossibilidade financeira de custear as despesas com a subsistência dos filhos, pois a responsabilidade avoenga é excepcional e subsidiária. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.18.073956-7/002, Relator(a): Des.(a) Alice Birchal , 4ª Câmara Cível Especializada, julgamento em 31/08/2023, publicação da súmula em 01/09/2023)

Sendo assim, a obrigação alimentar avoenga é complementar e subsidiária à dos genitores, devendo-se constatar a comprovação da incapacidade financeira dos genitores em suprir o mínimo existencial do menor.

Feitos tais registros e voltando aos autos, mostra-se patente a necessidade e o direito da menor G.D.S.P. em receber alimentos, notadamente por possuir 16 (dezesseis) anos de idade, sendo incapaz de prover o próprio sustento, consoante Certidão de Nascimento (ordem 41).

In casu, observo que a pretensão do encargo avoengo se deu em virtude do descumprimento das obrigações alimentícias por parte do genitor da infante, E.P.J., filho do agravante.

Todavia, tal obrigação ocorre de forma subsidiária e complementar, ou seja, deve estar devidamente comprovado aos autos a falta ou impossibilidade dos genitores de pagar a quantia indispensável à subsistência da alimentada, o que não se verificou no caso dos autos.

A inadimplência do alimentante, por si só, não caracteriza a possibilidade de pugnar os alimentos aos avós, pois o requisito impossibilidade do genitor não pode ser confundido com a displicência de cuidar de sua prole.

A propósito, veja-se o precedente:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE ALIMENTOS AVOENGOS - ART. 1.698 DO CÓDIGO CIVIL - LITISCONSÓRCIO PASSIVO FACULTATIVO - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA E COMPLEMENTAR DOS AVÓS - AUSÊNCIA OU IMPOSSIBILIDADE DO GENITOR NÃO DEMONSTRADA - DECISÃO REFORMADA - RECURSO PROVIDO. - O litisconsórcio passivo entre avós paternos e maternos em ação de alimentos movida por neto não é necessário, mas facultativo, ex vi da parte final do art. 1.698 do CC, que estabelece mera possibilidade de ulterior integração à lide dos coobrigados a prestar alimentos. - A mera inadimplência da obrigação alimentar, por parte do genitor, ora alimentante, sem que se demonstre sua impossibilidade de prestar os alimentos, não faculta aos alimentados pleitear alimentos diretamente aos avós. - Decisão reformada. - Recurso conhecido e provido. (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.21.143036-8/001, Relator(a): Des.(a) Maurício Soares, 3ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 09/12/2021, publicação da súmula em 09/12/2021) (grifos acrescidos)

Agravo de instrumento - Ação de alimentos avoengos - Genitor possivelmente inadimplente - Ausência de provas - Meios legais para cobrança da dívida - Obrigação dos avós - Caráter complementar e subsidiário - Ausência de fundamento para a pretendida alteração subjetiva - Recurso ao qual se nega provimento. 1. Os avós, em tese, possuem legitimidade passiva para arcar com o sustento dos netos, diante da obrigação subsidiária e complementar. 2. Uma simples inadimplência dos alimentos não demonstra a impossibilidade do devedor principal de arcar com o montante devido, bem como não autoriza, de plano, a fixação de alimentos provisórios em desfavor dos avós. AGRAVO DE INSTRUMENTO 1.0000.21.077849-4/001 - COMARCA DE BETIM - 1ª VARA DE FAMÍLIA, SUCESSÕES E AUSÊNCIAS - AGRAVANTE: A.C.S.S. - AGRAVADOS: M.A.P.S. E V.P.S. (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.21.077849-4/001, Relator(a): Des.(a) Marcelo Rodrigues, 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 14/09/2021, publicação da súmula em 20/09/2021) (grifos acrescidos)

Portanto, pautada no entendimento de que a obrigação alimentar avoenga é complementar e subsidiária à dos genitores, nesse momento de cognição sumária, mostram-se indevidos os alimentos avoengos, necessitando de melhor instrução probatória para averiguar a real capacidade financeira do genitor.

Conquanto a douta Procuradoria-Geral de Justiça tenha opinado pelo desprovimento do recurso, não vislumbro, neste momento processual, referida apreciação, visto que não há, nos autos, documentos hábeis comprobatórios das parcas condições financeiras do genitor em arcar com a obrigação alimentícia.

Diante desse contexto fático, reputo prudente exonerar a obrigação do avô paterno, ora agravante, de arcar com alimentos avoengos.

Pelo exposto, DOU PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO, tornando insubsistente a decisão agravada.

Custas recursais pela agravada, contudo, suspenso sua exigibilidade.

É como voto.



DES. CARLOS HENRIQUE PERPÉTUO BRAGA - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. VERSIANI PENNA - De acordo com o(a) Relator(a).



SÚMULA: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO."