#1 - Ação de guarda c/c perda do poder familiar. Rejeição. Ausência de situação de risco. Decisão que suspendeu o poder familiar materno. Mãe acusada de mandante de homicídio cometido contra o próprio marido, pai das crianças.

Data de publicação: 05/12/2023

Tribunal: TJ-MG

Relator: Francisco Ricardo Sales Costa

Chamada

(...)"Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por L.S.P.M. em face da r. decisão de doc. 01 proferida pelo d. Juízo de Direito da 01ª Vara Cível da Comarca de Timóteo, que nos autos da "Ação de Guarda c/c Perda do Poder Familiar" movida por A.A.C.D. e R.M.D. em face da agravante, suspendeu o poder familiar da agravante em relação ao filhos F.P.D. e M.E.P.D., bem como fixou a guarda dos menores em favor dos avós paternos (agravados). Inconformada, a agravante alegou preliminar de incompetência do juízo da 01ª Vara Cível da Comarca de Timóteo/MG para julgar o presente pedido, devendo o julgamento ser deslocado para a Vara da Infância e Juventude da Comarca de Timóteo/MG.
No mérito, asseverou que a concessão da liminar foi precipitada, uma vez que não houve a oitiva dos menores, tampouco a sua."(...)

Ementa na Íntegra

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE GUARDA C/C PERDA DO PODER FAMILIAR - PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO - REJEIÇÃO - AUSÊNCIA DE SITUAÇÃO DE RISCO - MÉRITO - DECISÃO QUE SUSPENDEU O PODER FAMILIAR MATERNO - MÃE ACUSADA DE MANDANTE DE HOMOCÍDIO COMETIDO CONTRA O PRÓPRIO MARIDO, PAI DAS CRIANÇAS - DIREITO DE VISITAS - FILHOS MENORES - MÃE ATUALMENTE RECOLHIDA EM INSTITUIÇÃO PRISIONAL - GENITORA QUE PARTICIPOU ATIVAMENTE DA CRIAÇÃO DOS FILHOS - RUPTURA ABRUPTA DA CONVIVÊNCIA - MELHOR INTERESSE DAS CRIANÇAS - PREVALÊNCIA - VISITAS SUPERVISIONADAS ATRAVÉS DE CHAMADAS DE VÍDEO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. O Juízo da Vara da Infância e da Juventude não tem competência para apreciar pedido de guarda de menor que não se encontra em situação de risco. Inteligência do artigo 98, da Lei nª 8.069/1990.
2. É prudente e confortada pela norma do art. 1.638, Parágrafo único, I, a, do Código Civil, a suspensão do poder familiar da genitora, que, presa, figura como principal suspeita de mandante do homicídio praticado contra o marido e pai das crianças, não se afigurando razoável deixar os filhos aos cuidados da principal suspeita de encomendar por paga em dinheiro o homicídio de seu ex-cônjuge.
3. Ainda que a suspensão do poder familiar da genitora acuda o melhor interesse das crianças, o mesmo raciocínio não deve ser aplicado em relação à suspensão das visitas da agravante aos filhos, enquanto se aguarda o trânsito em julgado da ação penal a que responde.
4. Genitora atualmente reclusa, figura como principal referência familiar dos menores, que mesmo cientes dos fatos ocorridos manifestam expressa vontade em retomar o convívio com a mãe, atestada por parecer técnico psicossocial. Observância do melhor interesse das crianças em momento muito delicado de suas vidas.  (TJMG -  Agravo de Instrumento-Cv  1.0000.23.107408-9/001, Relator(a): Des.(a) Francisco Ricardo Sales Costa (JD Convocado) , Câmara Justiça 4.0 - Especiali, julgamento em 24/11/2023, publicação da súmula em 28/11/2023)

 

Jurisprudência na Íntegra

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE GUARDA C/C PERDA DO PODER FAMILIAR - PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO - REJEIÇÃO - AUSÊNCIA DE SITUAÇÃO DE RISCO - MÉRITO - DECISÃO QUE SUSPENDEU O PODER FAMILIAR MATERNO - MÃE ACUSADA DE MANDANTE DE HOMOCÍDIO COMETIDO CONTRA O PRÓPRIO MARIDO, PAI DAS CRIANÇAS - DIREITO DE VISITAS - FILHOS MENORES - MÃE ATUALMENTE RECOLHIDA EM INSTITUIÇÃO PRISIONAL - GENITORA QUE PARTICIPOU ATIVAMENTE DA CRIAÇÃO DOS FILHOS - RUPTURA ABRUPTA DA CONVIVÊNCIA - MELHOR INTERESSE DAS CRIANÇAS - PREVALÊNCIA - VISITAS SUPERVISIONADAS ATRAVÉS DE CHAMADAS DE VÍDEO - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. O Juízo da Vara da Infância e da Juventude não tem competência para apreciar pedido de guarda de menor que não se encontra em situação de risco. Inteligência do artigo 98, da Lei nª 8.069/1990.

2. É prudente e confortada pela norma do art. 1.638, Parágrafo único, I, a, do Código Civil, a suspensão do poder familiar da genitora, que, presa, figura como principal suspeita de mandante do homicídio praticado contra o marido e pai das crianças, não se afigurando razoável deixar os filhos aos cuidados da principal suspeita de encomendar por paga em dinheiro o homicídio de seu ex-cônjuge.

3. Ainda que a suspensão do poder familiar da genitora acuda o melhor interesse das crianças, o mesmo raciocínio não deve ser aplicado em relação à suspensão das visitas da agravante aos filhos, enquanto se aguarda o trânsito em julgado da ação penal a que responde.

4. Genitora atualmente reclusa, figura como principal referência familiar dos menores, que mesmo cientes dos fatos ocorridos manifestam expressa vontade em retomar o convívio com a mãe, atestada por parecer técnico psicossocial. Observância do melhor interesse das crianças em momento muito delicado de suas vidas.

AGRAVO DE INSTRUMENTO-CV Nº 1.0000.23.107408-9/001 - COMARCA DE TIMÓTEO - AGRAVANTE(S): L.S.P.M. - AGRAVADO(A)(S): A.A.C.D., R.M.D.

A C Ó R D Ã O

(SEGREDO DE JUSTIÇA)

Vistos etc. Acorda, em Turma, a Câmara Justiça 4.0 - Especializada Cível-4 do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.

JD. CONVOCADO FRANCISCO RICARDO SALES COSTA

RELATOR





JD. CONVOCADO FRANCISCO RICARDO SALES COSTA (RELATOR)



V O T O

Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por L.S.P.M. em face da r. decisão de doc. 01 proferida pelo d. Juízo de Direito da 01ª Vara Cível da Comarca de Timóteo, que nos autos da "Ação de Guarda c/c Perda do Poder Familiar" movida por A.A.C.D. e R.M.D. em face da agravante, suspendeu o poder familiar da agravante em relação ao filhos F.P.D. e M.E.P.D., bem como fixou a guarda dos menores em favor dos avós paternos (agravados).

Inconformada, a agravante alegou preliminar de incompetência do juízo da 01ª Vara Cível da Comarca de Timóteo/MG para julgar o presente pedido, devendo o julgamento ser deslocado para a Vara da Infância e Juventude da Comarca de Timóteo/MG.

No mérito, asseverou que a concessão da liminar foi precipitada, uma vez que não houve a oitiva dos menores, tampouco a sua.

Pontuou que o estudo social realizado posteriormente ao deferimento da liminar foi superficial, de sorte que não é possível atestar que não possui capacidade de exercer o poder familiar ou a guarda.

Ressaltou que os menores sempre estivem sob os cuidados maternos, e que embora seja suspeita de um crime, não houve qualquer condenação a respeito, de forma que deve ser presumida sua inocência, nos termos do artigo 5º, inciso LVII, da Constituição da República.

Salientou que seus cuidados com os menores não foram abordados em qualquer momento e que não fora constatada qualquer negligência ou violação à integridade física ou psicológica das crianças, sendo que demonstraram atos de afeto para com a mãe.

Discorreu sobre o fato de que os menores têm sido privados do convívio com os avós maternos, e que o objetivo da família paterna com a guarda é unicamente angariar os bens da família.

Aduziu que os menores não foram ouvidos acerca da possibilidade de ficarem sob a guarda de seus avós, e não foram ouvidos também sobre a relação com a genitora, sendo a decisão recorrida completamente arbitrária.

Asseverou que não há qualquer situação de risco a qual os menores estejam submetidas sob os cuidados maternos, tendo os menores direito de convivência com seus genitores.

Ressaltou que as crianças não estariam sob a guarda dos avós paternos, mas sim de A.F. e P.J., e que não possui qualquer vício em entorpecentes ou bebidas, possuindo residência fixa, tendo plenas condições de prover um lar para os filhos.

Pontuou que os menores têm sido alvo de intimidação, tendo em vista que a toda tempo a família paterna tem praticado atos de alienação com os menores, e que eles possuem o desejo de voltar a conviver com a mãe.

Acentuou que a os atos de alienação têm sido constantes por parte da família paterna, e que a todo momento submetem as crianças aos detalhes do crime ocorrido, bem como a inúmeras ofensas e xingamento à agravante, em claros atos de alienação parental.

Ante o exposto, requereu a antecipação da tutela recursal para que seja restabelecido seu poder familiar sobre os menores, com o consequente restabelecimento da guarda dos infantes e do convívio com os filhos ou que, alternativamente, seja regulado regime de convivência mediante visitação aos finais de semana até o julgamento do mérito do processo. Quando do julgamento do mérito, pugnou pelo reconhecimento da preliminar de incompetência do juízo, bem como que a decisão recorrida seja anulada, com o retorno ao status quo ante.

Por meio de decisão lançada em doc. 61 foi parcialmente deferida a antecipação de tutela requerida, determinando a realização de estudo multidisciplinar.

Ausente o preparo ante o deferimento da justiça gratuita.

O d. juízo de origem prestou informações ao doc. 62.

A parte agravada apresentou contraminuta em doc. 63, pugnando pelo desprovimento do recurso.

A d. Procuradoria-Geral de Justiça emitiu parecer em doc. 64 opinando pelo desprovimento do recurso.

O despacho de doc. 65 determinou novamente a realização de estudo multidisciplinar, tendo em vista o não cumprimento do prazo estipulado em decisão de doc. 61.

Estudo multidisciplinar realizado ao doc. 66.

Por meio de manifestação de doc. 67 a parte agravada, ante a juntada do r. estudo reforçou o pleito de desprovimento do recurso.

Em doc. 68 a parte agravante reiterou o pedido de regulamentação do regime de convivência materno-filial.

A d. Procuradoria-Geral de Justiça emitiu novo parecer em doc. 69 opinando pela regulamentação de visitas, para que ocorram de forma gradual e assistida por profissional da psicologia.

É o relatório.

I - Da incompetência do juízo

A agravante levantou preliminar de incompetência do juízo de origem ante ao argumento de que "Da leitura detida do ECA e do dispositivo legal acima elencado, vislumbra-se a notória competência da Vara da Infância e da Juventude para processar e julgar as ações que versem sobre a destituição do poder familiar e perda/ modificação da guarda.".

Contudo o argumento da agravante não merece prosperar.

Com efeito, o parágrafo único, alíneas "a" e "b" do artigo 148 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que:

Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é competente para:

(..)

Parágrafo único. Quando se tratar de criança ou adolescente nas hipóteses do art. 98, é também competente a Justiça da Infância e da Juventude para o fim de:

a) conhecer de pedidos de guarda e tutela;

b) conhecer de ações de destituição do pátrio poder poder familiar, perda ou modificação da tutela ou guarda; (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência



Por sua vez, o artigo 98 do referido texto legal dispõe que:

Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:

I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado;

II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;

III - em razão de sua conduta.

No caso dos autos, verifica-se que quando do ajuizamento do presente feito F.P.D. e M.E.P.D. já estavam residindo com os avós paternos, conforme consta em doc. 07.

Nesse sentido, os menores não se encontravam em situação de risco, tendo em vista estarem afastados do convívio materno que potencialmente os poria em situação de violação de seus direitos, tendo em vista ser a principal suspeita de mandante do homicídio praticado contra o marido e pai das crianças.

Dessa forma, não há que se falar em atração da competência do Juízo da Infância e Juventude para o enfrentamento da questão posta sub judice.

Sobre o tema já se manifestou o E. Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. MENOR. SITUAÇÃO REGULAR. PEDIDO FEITO PELA DETENTORA DA GUARDA DO INFANTE. COMPETÊNCIA. VARA DE FAMÍLIA. As ações que visam solucionar questões sobre destituição do poder familiar, sobre menor que não se encontra em estado de abandono ou situação de risco, ou qualquer das hipóteses previstas no art. 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente, são da competência da Vara de Família. Declara-se competente o Juízo suscitante (TJMG - Conflito de Competência 1.0000.23.004546-0/000, Relator(a): Des.(a) Élito Batista de Almeida (JD Convocado), Câmara Justiça 4.0 - Especiali, julgamento em 02/06/2023, publicação da súmula em 12/06/2023) (sem grifos no original).

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR E GUARDA DE MENOR - SITUAÇÃO DE RISCO - INEXISTÊNCIA - JUIZ DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE - DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA - DECISÃO MANTIDA.

1. O Juiz da Vara da Infância e da Juventude não detém competência funcional para apreciar pedido de guarda de menor que não se encontra em situação de risco, ex vi do disposto no artigo 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente, devendo ser mantida a decisão que declinou da competência para uma das Varas de Família da Comarca de Belo Horizonte. (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.21.118963-4/001, Relator(a): Des.(a) Afrânio Vilela, 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 16/11/2021, publicação da súmula em 17/11/2021) (sem grifos no original).



À conta de tais fundamentos, rejeito a preliminar.

Dito isso, conheço do recurso interposto em que presentes os requisitos de admissibilidade.

II - Do mérito

No caso em voga, os agravados, avós paternos dos menores F.P.D. (10 anos, doc. 16) e M.E.P.D. (13 anos, doc. 15) ajuizaram a presente "Ação de Guarda c/c Perda do Poder Familiar" em face da agravante, sob o principal argumento de que a agravante seria a mandante do homicídio do pai dos menores, tendo requerido em sede de tutela de urgência a suspensão do poder familiar da agravante, bem como o deferimento da guarda dos menores.

O juízo de origem ao analisar o pedido tais pedidos os deferiu na decisão de doc. 33.

Dessa decisão que se recorre.

A perda da do poder familiar é tratada no artigo 1.638 do Código Civil, que dispõe que:

Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:

I - castigar imoderadamente o filho;

II - deixar o filho em abandono;

III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;

IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

V - entregar de forma irregular o filho a terceiros para fins de adoção. (Incluído pela Lei nº 13.509, de 2017)

Parágrafo único. Perderá também por ato judicial o poder familiar aquele que: (Incluído pela Lei nº 13.715, de 2018)

I - praticar contra outrem igualmente titular do mesmo poder familiar: (Incluído pela Lei nº 13.715, de 2018)

a) homicídio, feminicídio ou lesão corporal de natureza grave ou seguida de morte, quando se tratar de crime doloso envolvendo violência doméstica e familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher; (Incluído pela Lei nº 13.715, de 2018)

b) estupro ou outro crime contra a dignidade sexual sujeito à pena de reclusão; (Incluído pela Lei nº 13.715, de 2018)

(...). (sem grifos no original).

Além disso, a perda e a suspensão do poder familiar é também objeto do artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. Confira-se:

Art. 24. A perda e a suspensão do pátrio poder poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência. (sem grifos no original).



O procedimento da perda e suspensão do poder familiar é regulamentado pelos artigos 153 a 163 do mesmo codex. Especificamente sobre a possibilidade de concessão de tutela de urgência em processos desse jaez, o artigo 157 estabelece que, no caso de motivo grave, poderá o magistrado decretar a suspensão do poder familiar:

Art. 157. Havendo motivo grave, poderá a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar a suspensão do pátrio poder poder familiar , liminar ou incidentalmente, até o julgamento definitivo da causa, ficando a criança ou adolescente confiado a pessoa idônea, mediante termo de responsabilidade. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência

§ 1 o Recebida a petição inicial, a autoridade judiciária determinará, concomitantemente ao despacho de citação e independentemente de requerimento do interessado, a realização de estudo social ou perícia por equipe interprofissional ou multidisciplinar para comprovar a presença de uma das causas de suspensão ou destituição do poder familiar, ressalvado o disposto no § 10 do art. 101 desta Lei, e observada a Lei n o 13.431, de 4 de abril de 2017. (Incluído pela Lei nº 13.509, de 2017)

(...)

§ 3º A concessão da liminar será, preferencialmente, precedida de entrevista da criança ou do adolescente perante equipe multidisciplinar e de oitiva da outra parte, nos termos da Lei nº 13.431, de 4 de abril de 2017. (Incluído pela Lei nº 14.340, de 2022)

Em quaisquer dos casos, essas medidas, em razão da gravidade, devem ser dirigidas pelo melhor interesse da criança e do adolescente, com base na doutrina da proteção integral, assentada pela Constituição da República, especialmente em seu artigo 227.

No caso dos autos, a agravante teve suspenso o poder familiar sobre os filhos F.P.D. (10 anos, doc. 16) e M.E.P.D. (13 anos, doc. 15), em razão do suposto envolvimento no homicídio do genitor dos seus dois filhos.

Com efeito, o Ministério Público, ao doc. 52, promoveu a denúncia da agravante imputando-lhe o crime de homicídio tendo como vítima o genitor dos menores. Nesse espeque, a agravante aponta que a decisão deve ser reformada em razão da violação do princípio da presunção de inocência, insculpido no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal.

No entanto, o argumento da agravante não merece agasalho.

Com efeito, como se vê da r. decisão recorrida a suspensão do poder familiar se deu de forma cautelar e foi estribada no artigo 157, do Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê a possibilidade de adoção dessa media diante de motivo grave, que encontra conforto no art. 1.638, Parágrafo único, I, a, retratado linhas acima.

Nessa esteira, afigura-se temerário o deferimento da manutenção do poder familiar e da guarda dos menores à mãe diante da grave imputação que lhe foi lançada pelo órgão ministerial, especialmente porque presa provisoriamente, não se afigurando razoável deixá-los aos cuidados da principal suspeita de encomendar por paga em dinheiro o homicídio do genitor, à vista da evidente situação conflituosa que os fatos delituosos lançaram sobre a família seriamente abalada.

O caso sob análise é de natureza gravíssima e independente do resultado do julgamento, a manutenção do poder familiar da agravante tem o potencial de colocar os menores em situação de risco.

Essa questão foi acentuada pela r. decisão recorrida, que consignou que a prisão em flagrante da agravante colocou os menores em situação de risco, tendo sido acolhidos pelos avós paternos, necessitando, nesse momento, de todos os cuidados e proteção em razão da fragilidade emocional em que se encontram.

Noutro giro, em relação a alegação de que A.F. e P.J. e não os avós paternos passaram a cuidar dos menores após a morte do pai e a prisão da mãe, não há qualquer prova nesse sentido nos autos. Inclusive, o relatório social de doc. 46 indica o contrário do alegado pela agravante.

Nesse viés, ao que tudo indica, os menores se encontram bem assistidos pelos avós paternos, como indica o relatório psicológico particular de doc. 17, o que é reforçado pelo relatório (doc. 46) do estudo multidisciplinar de doc. 66.

Merece retrato a sua conclusão: "Constatou-se durante as intervenções realizadas para elaboração do referente instrumento técnico, que os requerentes possuem condições de promover o desenvolvimento dos netos, que por sua vez expressaram desejo de continuar vivendo com os progenitores paternos. Os menores estão adaptados e bem assistidos, assim como demonstram carinho e respeito pelos guardiões.".

Nessa senda, os próprios menores, entrevistados no relatório social se manifestarem no sentido de estarem em um ambiente seguro, sendo cuidados com zelo e responsabilidade pelos avós paternos.

Ressalte-se, por oportuno, que a suspensão do poder familiar não é medida definitiva e sim temporária, que deverá perdurar até que os motivos que lhe deram ensejo cessem, ou se tornem definitivos, podendo ser revista a qualquer tempo.

Dessa forma, fundado na situação de conflito e risco do menores, e havendo motivo grave (artigo 157 do Estatuto da Criança e do Adolescente), demonstra-se prudente a manutenção da suspensão do poder familiar e da fixação da guarda dos menores em favor dos avós paternos, por preservar o melhor interesse da criança e do adolescente.

Cumpre salientar que embora a agravante tenha arguido a prática de alienação parental por parte dos agravados, não há nos autos qualquer elemento que evidencie tal prática, de forma que suas alegações restaram insuladas pelo arcabouço probatório presente nos autos até o momento.

Impende ressaltar, que diante do cenário fático em que as partes estão envolvidas o receio dos avós paternos, ora agravados, do convívio entre a agravada e os filhos se mostra compreensível, outrossim tal ressalva não é capaz de configurar alienação parental, mormente pelo fato dos menores, em ambos estudos realizados (doc. 46 e 66), manifestarem afeto e vontade de restabelecer o convívio com a genitora.

Noutro norte, embora a suspensão do poder familiar da agravante pareça acudir o melhor interesse da criança e do adolescente, o mesmo raciocínio não deve ser aplicado em relação à suspensão das visitas da agravante aos filhos.

Nesse caso, é importante frisar que não se demonstra proporcional privar os menores, de forma repentina, de ver a mãe, sobretudo diante do fato de que foram criados por ela. Ou seja, após 10 (dez) (no caso de F.P.D.) e 13 (treze) (no caso de M.E.P.D.) anos de convivência diária, os menores foram impedidos de vê-la, sem que fossem avaliados os eventuais impactos dessa determinação.

Ao que se colhe dos autos, a genitora figurava como a principal referência familiar dos filhos, participando ativamente de suas atividades e criação, conforme consignado em estudo multidisciplinar "Em conversa com a Diretora e com a Psicóloga da escola, pode-se obter a informação de que a genitora era a principal referência das crianças no que se refere às atividades e participação escolar. A mãe era participativa na vida das crianças, responsável e atuante." (doc. 66).

Sobre o tema, o artigo 19, § 4° do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que:

Art. 19. É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral. (Redação dada pela Lei nº 13.257, de 2016)

(...)

§ 4 o Será garantida a convivência da criança e do adolescente com a mãe ou o pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável ou, nas hipóteses de acolhimento institucional, pela entidade responsável, independentemente de autorização judicial. (Incluído pela Lei nº 12.962, de 2014)



O direito à convivência familiar é garantido às crianças e adolescentes, ainda, pelo art. 227, da Constituição da República, in verbis:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.



A esse respeito, confira-se o que este eg. Tribunal de Justiça já decidiu:

EMENTA: AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. FALTA DE ASSISTÊNCIA MORAL, MATERIAL E EDUCACIONAL. DECISÃO DECRETANDO A SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR. SUSPENSÃO DO DIREITO DE VISITAS. PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. VISITAS ACOMPANHADAS. POSSIBILIDADE. MELHOR INTERESSE DO MENOR. DIREITO DE CONVÍVIO.

- Resta prejudicada parte da pretensão recursal, perdendo o agravo parte de seu objeto, já que a cassação da decisão agravada se torna totalmente inócua diante do acolhimento de preliminar de incompetência absoluta do juízo de origem, com a extinção do feito, em relação a um dos recorridos.

- Consagrou-se a "doutrina da proteção integral", colocando-se o bem estar das crianças e adolescentes como uma absoluta prioridade do Estado, da família e da sociedade, sendo dirigida aos menores uma especial atenção e cuidado, devido à sua peculiar condição de pessoas em desenvolvimento.

- O direito de visitas visa manter as relações afetivas entre pais e filhos, pelo que se deve observar o melhor interesse do menor, que é direito seu no manter seu convívio saudável com os genitores. (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0024.13.383491-1/001, Relator(a): Des.(a) Duarte de Paula, 4ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 25/09/2014, publicação da súmula em 02/10/2014). (sem grifos no original).

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AUTORIZAÇÃO JUDICIAL - MENOR - VISITA AO PAI PRESO, NA COMPANHIA DA AVÓ - GARANTIA À CONVIVÊNCIA COM O GENITOR PRIVADO DE LIBERDADE - ECA, ART. 19, § 4º - INEXISTÊNCIA DE MOTIVO ESPECÍFICO QUE CONTRAINDIQUE A CONCESSÃO DA AUTORIZAÇÃO - MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA - OBSERVÂNCIA.

1. O art. 19, § 4º, do ECA, garante a convivência da criança e do adolescente com a mãe ou o pai privado de liberdade, por meio de visitas periódicas promovidas pelo responsável, independentemente de autorização judicial - do que se infere que, não estando a menor acompanhada do responsável, a chancela judicial far-se-á indispensável.

2. Inexistência de motivo específico que contraindique a concessão da autorização à vó da criança para acompanhá-la em visita ao pai que se encontra recluso em estabelecimento prisional, mormente porque requerida pela própria genitora da menor. Observância ao melhor interesse da criança.

3. Recurso não provido. (TJMG - Apelação Cível 1.0024.16.131418-2/001, Relator(a): Des.(a) Áurea Brasil, 5ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 10/08/2017, publicação da súmula em 22/08/2017)



Conforme cediço, as "visitas têm a concreta finalidade de favorecer as relações humanas e de estimular a corrente de afeto entre o titular e o menor, porém, o mais valioso é o interesse da criança e do adolescente no caso de conflito", de modo que o "direito de visita reúne um conjunto de relações que podem representar contatos esporádicos de algumas horas, ou estadias mais prolongadas e todas as formas de comunicação e seu exercício funciona como 'um meio de este manifestar a sua afetividade pela criança, de ambos se conhecerem reciprocamente e partilharem os seus sentimentos de amizade, as suas emoções, ideias, esperança e valores mais íntimos'. O direito e dever das visitas, ou de conversação, guarda um conteúdo voltado ao interesse primeiro do menor (...)''. (Rolf Madaleno. Manual de Direito de Família. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2017, p. 130).

Logo, em consonância com o disposto no art. 1.589, do Código Civil, o direito de visita é assegurado pela lei ao genitor que não estiver com a guarda dos filhos, sendo que a "definição das visitas deve conciliar dois aspectos básicos: a) o direito do pai ou da mãe de visitar os filhos e de os ter consigo, durante o tempo fixado; b) a preservação dos menores, nisso incluída a proteção a proteção de seus predicados físicos e morais. Em situações excepcionais, o direito de visita pode ser restringido ou mesmo sobrestado, quando isso for absolutamente necessária à proteção do filho". (Fabrício Zamprogna Matiello. Código Civil Comentado. 7ª ed. São Paulo: Editora Ltr, 2017, p. 859).

No caso em voga, a situação delicada dos autos, reclama, uma vez mais, boa dose de prudência, tendo em vista a sensível realidade fática que envolve os filhos da agravante.

Conforme se extrai do estudo multidisciplinar realizado (doc. 66), o menor F. manifestou vontade em visitar a genitora, independente dos termos em que tal visitação ocorrerá, já M. manifestou vontade em encontrar com a mãe, mas receio em ir ao local em que se encontra recolhida, in verbis:

"No que se refere à questão da visita à genitora, os posicionamentos das crianças foram: na primeira visita, F. disse que quer ver a mãe, F. manteve a mesma fala na segunda visita.

M.E. no primeiro encontro respondeu à Perita que não sabia se queria ir, disse que se sentia confusa e que sente muita falta do pai. No segundo encontro M. E. disse que queria fazer como o irmão e ir à visita, mas tem medo de como vai se sentir naquele lugar, demonstrando insegurança em ter que ver a mãe, principalmente pelo ambiente em que ela se encontra, contou à Perita que fez pesquisas na internet para saber como é dentro de um presídio

(...)

Avalia que necessita de mais tempo para refletir sobre a convivência e não se sente preparada para tomar essa decisão no momento. Também acredita que os encontros, trará à tona sentimentos que envolvem o falecimento do genitor, o que por ora tem evitado. Requer que não haja nenhuma imposição por essa justiça."

Outrossim, ainda que ambos expressassem vontade em restabelecer o contato com a genitora, o regime de convivência deve ser sopesado com cautela. Isso porque, conforme pontuado pela psicóloga judicial, dada a natureza dos fatos ocorridos, os menores encontram-se em situação de extrema fragilidade emocional, em que "vivenciam o luto da morte do pai, ausência e prisão da mãe; mudança do contexto familiar e moradia; alterações na forma de convivência social e comunitária enfrentam as notícias da mídia com relação à morte do pai (...)" (doc. 66).

Ainda, consta no r. estudo a necessidade da preservação da saúde mental, de F. e M., que "muitas vezes não estão sendo preservados e vivenciam os conflitos advindos da situação dos genitores, seja através de familiares, de redes sociais e que não tiveram tempo para assimilar e elaborar todas as mudanças.".

Dessa forma, dada a gravidade do contexto fático que envolve os menores, a idade em que se encontram e o período de fragilidade que todo o núcleo familiar vivencia, entendo que a retomada do convívio entre F. e M. à genitora deve se dar de forma gradual, inicialmente por meio de vídeo conferência, no mesmo sentido do r. parecer do d. membro do parquet.

Assim, entendo que a realização de visitas da agravante a seus filhos deverá ocorrer 01 (uma) vez por semana, aos sábados ou domingos preferencialmente, por meio de vídeo chamadas - a serem realizadas de acordo com as possibilidades da instituição prisional na qual a genitora se encontra recolhida - com duração máxima de 30 (trinta) minutos, supervisionadas por profissional da psicologia.

Importante salientar que o presente caso reúne peculiaridades que reclamam aperfeiçoamento com o passar do tempo. De todo modo, acaso configurado algum elemento concreto revelador de riscos para os menores, ou que sugira aperfeiçoamento, a sistemática da disciplina das visitas deverá ser reconsiderada.

É que a "forma de regulamentação da convivência pode ser modificada a qualquer tempo, fazendo coisa julgada apenas formal. Qualquer fato novo que repercuta no melhor interesse do filho faz com que a convivência possa ser reduzida ou ampliada". (Gustavo Tepedino e Ana Carolina Brochado. Fundamentos de Direito Civil: direito de família. 3ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2022, p. 350)

À conta de tais fundamentos, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO, para regulamentar visitas dos menores F.P.D. e M.E.P.D. à genitora para que ocorram 01 (uma) vez por semana por meio de vídeo conferência, preferencialmente aos sábados ou domingos, a depender da conveniência da instituição prisional, com duração máxima de 30 (trinta) minutos, supervisionadas por profissional da psicologia.

Custas em partes iguais, suspensa a exigibilidade ante ao deferimento da justiça gratuita.

É como voto.



DES. ARMANDO FREIRE - De acordo com o(a) Relator(a).

DESEMBARGADORA LÍLIAN MACIEL - De acordo com o(a) Relator(a).



SÚMULA: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO"